O Estado de São Paulo (2020-06-05)

(Antfer) #1

%HermesFileInfo:A-2:20200605:
A2 Espaçoaberto SEXTA-FEIRA, 5 DE JUNHO DE 2020 O ESTADO DE S. PAULO






Diante de uma pandemia que
deixou as aéreas praticamen-
te sem operação, as buscas
por passagem aérea no Brasil
atingiram o menor nível his-
tórico na plataforma Google.
Os números mostram que a re-
tomada do setor pela perspec-
tiva do interesse dos passagei-
ros ainda não começou no


País, mas pelo menos parou
de cair. A demanda global de
transporte aéreo de passagei-
ros (medida em Passageiros-
Quilômetros Pagos transpor-
tados) despencou 94% em
abril na comparação com o
mesmo mês em 2019.

http://www.estadao.com.br/e/aviacao

“O amor não é o oposto
do ódio, o poder
é o oposto do amor”
Carl Jung

A


s manifestações que to-
mam conta das ruas de
cidades americanas e
europeias em decorrência do
martírio de George Floyd sob
os joelhos de cinco policiais
de Minneapolis impressio-
nam por terem tomado feição
pacífica após os primeiros
confrontos, de grande violên-
cia, no Estado de Minnesota.
Essa novidade importantíssi-
ma da resistência na luta aber-
ta contra o racismo passa des-
percebido da imprensa e da
opinião publica, que se con-
tenta com dados estatísticos
e históricos, contabilizando-a
entre as maiores nos Estados
Unidos, comparáveis às dos
anos 1950 e 1960.
Acontece que o presente
movimento não é mais do
mesmo. Agora existe um gran-
de congraçamento e uma
enorme coragem dos milha-
res de participantes, que, em
vez de invocarem o black
power, ajoelham-se – numa
perna só para mostrar digni-
dade, e não submissão –, con-
vidando os policiais a faze-
rem o mesmo.
O mantra é “não consigo
respirar”, em lugar de impre-
cações contra os esbirros do
violento racismo. Não se
propõem negros e brancos,
juntos, a confrontar, mas a de-
monstrar amor e compaixão
em torno do sacrifício de tan-
tas vítimas da persistente dis-
criminação que envergonha
secularmente a maior demo-
cracia do mundo.
Há uma comovente invoca-
ção do amor ao próximo e da
misericórdia nesse reencon-
tro dos participantes, ao pro-
clamarem que sem justiça
não há paz. Ao invés de con-
frontarem o poder das ruas e
dos votos, milhares se deitam
em toda a extensão de uma
enorme ponte na posição do
martírio de oito minutos de
George Floyd.
Esse é o caminho que es-
pontaneamente tomou a par-

cela antirracista do povo ame-
ricano na sua reivindicação pe-
lo direito dos negros de não
serem perseguidos e massacra-
dos pelo poder público, com o
respaldo dos supremacistas.
Nada de confrontos com a
polícia ou a temida Força Na-
cional, armada para reprimir
“os terroristas internos”, nas
palavras do autocrata Trump.
Não se tem mais vergonha de
se comportar nas ruas com
amor. Essa palavra, banida do
uso comum por demonstrar
fraqueza e pieguice, volta
com força capaz de congregar
pretos e brancos na reivindi-
cação de dignidade humana
para as vítimas cotidianas da
discriminação.
Os manifestantes mostra-
ram profundo respeito por
George Floyd e sua filha de 6
anos. A pessoa, a figura do
mártir, não foi utilizada para

reivindicações cerebrinas e es-
tratégicas de empoderamento
dos oprimidos.
Tudo leva a crer que o povo
antirracista – pretos, brancos,
latinos, amarelos – percebeu
que a resistência ao poder
iníquo é o melhor caminho,
em vez de confrontá-lo direta-
mente, num ajuste de contas
com um Estado altamente
aparelhado e truculento. Per-
cebeu-se que o racismo é, so-
bretudo, uma questão emocio-
nal, fruto dos recalques de al-
ma que afetam tanto winners
como losers e que apenas uma
permanente campanha educa-
cional pode dissipar no decor-
rer das gerações.
O embate se dá entre os va-
lores culturais e emocionais
do racismo, cultivados no
meio familiar e social, mos-
trando a indignidade humana
que essa conduta representa.
A propósito, interessante
notar que as palavras “amor”,
“caráter” e “honra” foram
abolidas do vocabulário e das
crônicas da vida contemporâ-

nea. Mas o amor voltou, não
em palavras, mas em atitude
dos manifestantes america-
nos, que, sem muita teoriza-
ção, perceberam que é inútil
confrontar o poder dos bran-
cos no seu racismo institucio-
nalizado com o “poder dos ne-
gros”, que, na realidade, pou-
co pode fazer.
Procura-se agora, com enor-
me sabedoria, mostrar que o
racismo é uma vergonha para
uma nação e para todos as
pessoas que a integram. Só a
afirmação do amor e da súpli-
ca pela justiça podem trazer
essa consciência aos donos
do poder e seus centuriões.
Essa mensagem deve persis-
tir uma vez amainadas as ma-
nifestações de rua que ora pre-
senciamos. É necessário que
as personalidades envolvidas
nessa missão de resgate da
dignidade dos negros em to-
do o mundo tenham a cora-
gem de falar a palavra amor.
Barak Obama, no seu espe-
rado pronunciamento sobre a
luta contra o racismo, nenhu-
ma vez invocou o amor que
os manifestantes incorpora-
ram ao seu comportamento
nas ruas de Washington, No-
va York e tantas outras cida-
des daquele país. Tampouco
nos maravilhosos depoimen-
tos das nossas jornalistas ne-
gras na GloboNews, em 3 de ju-
nho, se ouviu essa invocação
do amor. Nem mesmo quan-
do falaram, para nossa profun-
da comoção, da dúvida exis-
tencial das negras sobre a ma-
ternidade, pondo filhos neste
mundo odioso.
O racismo somente se dissi-
pará quando demonstrarmos
às gerações presentes e futu-
ras que ele é uma vergonha e
o seu exercício, mais do que
um crime, é uma indignidade
pessoal para quem o pratica.
É fundamental que as gran-
des fundações privadas e a so-
ciedade civil se empenhem
nessa campanha em favor do
amor e contra o ódio, pura e
simplesmente.

]
ADVOGADO
Dedico este artigo a Fernando Gabeira

Elenco de ‘Brooklyn Nine-
Nine’ doa US$ 100 mil a ati-
vistas contra o racismo.

http://www.estadao.com.br/e/atos

GOOGLE


Buscas por passagem aérea despencam


O líder Bayern e o Hertha
Berlin são os únicos que ven-
ceram as duas partidas em
casa após o retorno do Cam-
peonato Alemão.

http://www.estadao.com.br/e/alemao

l“Pensei que já fossem. Com certeza os atos têm tudo para crescer. O
governo deveria temer a violência em curso.”
RENATO ALVES

l“Bem feito. Se não é pelo amor, é pela dor. Agora ele para de ir para a
rua fazer aglomeração e instigar movimentos.”
MIRIAM RAHUAM

l“O povo está vendo mais essa manobra dos golpistas derrotados
pelo voto popular. Investigação para se chegar aos mandantes!”
EITEL SANTIAGO

l“Como falava vovó, ‘pipoca que muito pula, sai da panela’. O cara
está em campanha em plena pandemia.”
CARLOS EDUARDO

INTERAÇÕES

CONSELHO DE ADMINISTRAÇÃO
PRESIDENTE: ROBERTO CRISSIUMA MESQUITA
MEMBROS
FERNANDO C. MESQUITA
FERNÃO LARA MESQUITA
FRANCISCO MESQUITA NETO
GETULIO LUIZ DE ALENCAR
JÚLIO CÉSAR MESQUITA

“É uma grande homenagem
aos jornalistas”, resumiu o
delegado geral do festival,
Thierry Frémaux, sobre o
novo filme do diretor.

http://www.estadao.com.br/e/wes

Espaço Aberto


A


lúcida visão, de déca-
das atrás, do pensador
católico Alceu Amoro-
so Lima desponta atual, ago-
ra, no Brasil. “O passado não é
aquilo que passa, mas aquilo que
fica do que passou”, disse ele.
Como se não bastasse o
horror da covid-19, acumulan-
do cadáveres Brasil afora, o fi-
nal de maio desnudou a mais
perigosa ameaça que jamais
surgiu no País. Vimos o presi-
dente da República solidari-
zar-se com os manifestantes
que, em Brasília, pediam uma
“intervenção militar”, cujo
nome real e concreto é “dita-
dura”. Ao lado do general mi-
nistro da Defesa, Bolsonaro
solidarizou-se com os mani-
festantes e até desfilou a cava-
lo entre eles, como um Napo-
leão tropical.
Antes disso, o filho deputa-
do de Bolsonaro havia frisado
que, agora, se trata apenas de
saber “quando” se deve rom-
per o sistema democrático e
voltar aos tempos do AI-5,
com medo e perseguição co-
mandando tudo. Já não se dis-
cute (disse ele, como numa
alucinação) a necessidade,
mas apenas o “quando”.
Nunca houve no Brasil algo
tão despudorado. Nem se-
quer em 1964, quando se pre-
gava a derrubada do governo
para “preservar a democra-
cia”, mas em seguida se insta-
lou a ditadura. Hoje já não se
trata de opção política entre
“ditadura” e “democracia”
(dualismo inaceitável, pois
não se escolhe entre “o bem”
e “o mal”), mas de posição
moral e ética. Está em jogo a
segurança que só a democra-
cia proporciona a cada habi-
tante do País.
Nesse contexto de aberta
pregação ditatorial, indireta-
mente estimulada pelo Palá-
cio do Planalto, surgiu o aler-
ta do decano do Supremo Tri-
bunal Federal, Celso de Mel-
lo, comparando o Brasil atual
à Alemanha de 1933, quando
Hitler subiu ao poder pelo vo-
to, “guardadas as devidas pro-
porções”. É desnecessário fa-
lar do terror de Hitler ou re-
petir o que Celso de Mello re-


sumiu sobre o eleito que vi-
rou ditador brutal.
O alerta de Celso de Mello
não afeta a imparcialidade do
decano do STF. Apenas mos-
tra que ninguém – menos ain-
da um juiz – pode ser “neu-
tro” diante do crime. Não há
crime maior do que estraça-
lhar os Poderes que guiam a
democracia, tal qual pregam
os próximos a Bolsonaro.
No Brasil, a confusão domi-
na a política e o que dela deri-
va passa a simulacro. Os par-
tidos já não definem posi-
ções e ideias diferentes sobre
a organização da sociedade,
hoje são meros aglomerados
de gente ansiosa por desfru-
tar o poder. A definição tradi-
cional entre “direita”, “es-
querda” ou “centro” já não
existe. Ainda que os termos
sigam em voga, são apenas
fantasmas num mundo aqui

desaparecido.
Os exemplos gritantes são,
de um lado, o PT e Lula da Sil-
va e, de outro, Jair Bolsonaro.
O antigo metalúrgico chefia
um partido que, até pela deno-
minação, seria de “esquerda”,
mas se jacta de que os bancos
(símbolos da “direita”) “nun-
ca lucraram tanto” quanto
nos seus anos de presidente
da República. Não oculta se-
quer o que, em si mesmo, é
aberrante e contraditório
De outro lado, em 2018 Bol-
sonaro usou os novos instru-
mentos das chamadas “redes
sociais” e chefiou uma rebe-
lião popular que o levou à
Presidência da República
sem jamais definir o que sua
rebeldia significava. Ao con-
trário, sempre silenciou. Sob
a alegação de que estava sob
cuidados médicos devidos à
facada que sofreu, não parti-
cipou sequer dos debates
com seu adversário no segun-
do turno. Foi, de fato, um re-
belde sem causa.
Antes, quando o juiz Sergio

Moro e a Polícia Federal des-
montavam a rede corrupta
entre grandes empresários e
os chefes dos partidos no po-
der (do PT ao MDB, PP e ou-
tros da “base alugada”), o
candidato Bolsonaro aprovei-
tou-se da nova situação psi-
cossocial e, de apagado depu-
tado do chamado “baixo cle-
ro” na Câmara dos Deputa-
dos, travestiu-se no candida-
to que prometia ser “o vinga-
dor” do ultraje cometido pe-
la baixa política.
Usou uma situação de que
foi mero espectador como se
fosse um dos atores. A “novi-
dade” das chamadas “redes”
chegou às famílias brasileiras
como “a volta” à honestidade
ou à ordem e ao progresso da
Bandeira. O estelionato elei-
toral ficou claro 16 meses
após a posse de Bolsonaro,
quando o ministro da Justi-
ça, Sergio Moro, teve de se
demitir ao denunciar as ma-
nobras do presidente para fa-
zer da Polícia Federal uma
instituição protetora da pro-
le presidencial.
Esse simulacro que domina
a política é, ainda, um dos res-
quícios herdados dos 21 anos
da ditadura implantada em


  1. Ali, tudo era simulação.
    A ditadura se implantou em
    nome da “liberdade”, mante-
    ve aberto os Legislativos com
    eleições sob controle, em que
    os opositores mais aguerridos
    não podiam concorrer. O Ato
    5 permitiu ao governo contro-
    lar o Judiciário e a sociedade
    toda ao censurar a imprensa.
    Esses 21 anos se impregna-
    ram de tal forma na visão po-
    lítica do País que ainda hoje o
    povo confunde “democracia”
    com “eleição”, como se o de-
    bate livre não existisse.
    Vivemos já 35 anos sob de-
    mocracia, mas não nos liber-
    tamos por inteiro do fantas-
    ma principal da ditadura, ain-
    da presente e atual.


]
JORNALISTA E ESCRITOR,
PRÊMIO JABUTI DE LITERATURA
2000 E 2005, PRÊMIO APCA 2004,
É PROFESSOR APOSENTADO
DA UNIVERSIDADE DE BRASÍLIA

PUBLICADO DESDE 1875

LUIZ CARLOS MESQUITA (1952-1970)
JOSÉ VIEIRA DE CARVALHO MESQUITA (1947-1988)
JULIO DE MESQUITA NETO (1948-1996)
LUIZ VIEIRA DE CARVALHO MESQUITA (1947-1997)
RUY MESQUITA (1947-2013)

FRANCISCO MESQUITA NETO / DIRETOR PRESIDENTE
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]
Flávio Tavares


Tema do dia


Sugestões incluem usar mí-
dias digitais, fazer parcerias
e personalizar atendimento.

http://www.estadao.com.br/e/pme

O fantasma sempre


presente e atual


Ninguém – menos
ainda um juiz –
pode ser ‘neutro’
diante do crime

Racismo


e amor


Há uma comovente
invocação do amor ao
próximo nas atuais
manifestações nos EUA

AMÉRICO DE CAMPOS (1875-1884)
FRANCISCO RANGEL PESTANA (1875-1890)
JULIO MESQUITA (1885-1927)
JULIO DE MESQUITA FILHO (1915-1969)
FRANCISCO MESQUITA (1915-1969)

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SÁBADO) E R$ 7,00 (DOMINGO). RJ, MG, PR, SC E DF:
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  • SP E GRANDE SÃO PAULO – R$ 134,90/MÊS. DEMAIS
    LOCALIDADES E CONDIÇÕES SOB CONSULTA.
    CARGA TRIBUTÁRIA FEDERAL: 3,65%.


Governo teme atos


de rua maiores e


pró-impeachment


Bolsonaro chamou manifestantes
contrários ao governo e pró-democracia
de ‘marginais’ e ‘terroristas’

]
Modesto Carvalhosa

HENRY ROMERO/REUTERS CINEMA

No estadao.com.br


EUA

Atores ajudam
manifestantes presos

PME

Consultor do Sebrae
dá dicas a empresas
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