O Estado de São Paulo (2020-06-07)

(Antfer) #1

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O ESTADO DE S. PAULO DOMINGO, 7 DE JUNHO DE 2020 Economia B


Tânia está viva,


mas governo a


considera morta


MERCEDES-BENZ AXOR 2041 S 13/13 - LEILÃO DIA 11/06, QUINTA, 11H.

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BRASÍLIA

U


ma eventual prorro-
gação do auxílio
emergencial de R$
600 a trabalhadores infor-
mais até o fim do ano pode
devolver aos cofres da União
cerca de 45% dos valores pa-
gos às famílias, calculam eco-
nomistas do Centro de De-

senvolvimento e Planejamento
Regional (Cedeplar) da Univer-
sidade Federal de Minas Gerais
(UFMG). A estimativa conside-
ra os desdobramentos de um
programa tão vultoso de trans-
ferência de renda sobre o consu-
mo e a atividade das empresas,
com consequente aumento na
arrecadação de tributos.
Os cálculos estão em nota téc-

nica divulgada pelo Núcleo de
Estudos em Modelagem Econô-
mica e Ambiental Aplicada do
Cedeplar/UFMG. A partir dos
dados, os especialistas reconhe-
cem que a extensão do auxílio
emergencial traz custos para a
União, mas eles seriam meno-
res quando confrontados com
o efeito positivo. Além disso, o
argumento é que a manutenção
da política até o fim de 2020 evi-
taria mergulhar o País em uma
recessão mais profunda.
A equipe econômica já se ma-
nifestou de forma contrária à
manutenção do auxílio emer-
gencial nos moldes atuais e ace-
nou com a possibilidade de pror-
rogar o benefício por mais dois
meses com um valor menor, de
R$ 300. Seria uma forma de miti-
gar o alto custo da política, que
beira os R$ 50 bilhões ao mês.
Em relatório de acompanha-

mento do auxílio, o Tribunal de
Contas da União (TCU) aler-
tou para o risco de o gasto com
proteção social chegar a R$
379,5 bilhões se houver prorro-
gação até o fim de 2020.
A economista Débora Freire,
uma das autoras da nota, avalia
que a quantia de R$ 300 avalia-
da pelo governo é insuficiente
para atenuar os impactos da cri-
se sobre as famílias e sobre as
empresas. Além disso, segundo
ela, pode ser um “tiro no pé” do
ponto de vista fiscal.
Pelas contas, o custo líquido
da política é proporcionalmen-
te menor com a extensão até o
fim do ano do que no caso de
limitação aos três meses previs-
tos inicialmente. Isso porque as
famílias terão mais recursos pa-
ra gastar, e as empresas terão
tempo para planejar a demanda
e retomar investimentos.

Num cenário de auxílio pago
por três meses, só 24% do custo
da política retornaria aos cofres
públicos por meio de tributos.
“Muito se fala do custo de
manter a política até o fim do
ano, mas a gente precisa pensar
no custo líquido. Sem o benefí-
cio, a atividade econômica vai
cair mais, e aí a gente tem impac-
tos nas contas públicas da mes-
ma forma”, afirma Débora.
Nas contas dos economistas,
o pagamento do auxílio por ape-

nas três meses atenua a re-
cessão no segundo trimes-
tre em 0,44 ponto porcen-
tual a cada 1% de queda pre-
vista no cenário base (sem a
adoção da medida), com efei-
tos apenas residuais nos pe-
ríodos seguintes.
Já com a manutenção do
benefício até dezembro, o
impacto acumulado chega a
0,55 ponto porcentual de me-
lhora a cada 1% de queda no
cenário base até o fim do ano
e se estende para 2021, com
0,31 pp de melhora.
“Assegurar o benefício até
o fim de 2020, gera um im-
pacto cinco vezes maior ao
final de 2021 do que por três
meses”, diz a nota, assinada
também pelos economistas
Edson Domingues, Aline Ma-
galhães, Thiago Simonato e
Diego Miyajima. /A.F. e I.T.

Adriana Fernandes
Idiana Tomazelli/ BRASÍLIA


Numa mobilização nacional,
162 organizações e movimen-
tos lançam hoje documento
que aponta 20 obstáculos en-
contrados na implementa-
ção do auxílio emergencial de
R$ 600 que precisam ser ata-
cados com urgência para a
prorrogação do benefício e a
elaboração de uma base para
tirar do papel a criação de um
programa de renda básica pa-
ra os brasileiros mais vulnerá-
veis.
No documento, as organiza-
ções cobram uma resposta ime-
diata dos órgãos do governo fe-
deral responsáveis pela efetiva-
ção do auxílio e alertam os parla-
mentares que estão discutindo
projetos de lei que prorrogam a
política ou propõem um novo
benefício para ampliar a rede de
proteção social depois da pan-
demia para a necessidade de
corrigir os problemas.
O movimento “A Renda Bási-
ca que Queremos!” vem no ras-
tro das seguidas descobertas,
nas últimas semanas, do recebi-
mento indevido do auxílio por
centenas de milhares de milita-
res, sócios de empresas e cida-
dãos de alta renda, enquanto
cerca de 10 milhões de pessoas
aguardam a análise, algumas há
mais de 50 dias. Outras 42,7 mi-
lhões de pessoas foram conside-
radas inelegíveis pelo cruza-
mento de dados do governo, se-
gundo o Ministério da Cidada-
nia, mas são muitos os casos de
requerentes que discordam da
justificativa para a recusa dada
na resposta.
Entre os obstáculos aponta-
dos estão também a falta de arti-
culação com Estados e municí-
pios, a ausência de um canal de
contestação para quem teve o
auxílio negado, a não atualiza-
ção do Cadastro Único de pro-
gramas sociais e restrições a gru-
pos específicos. Mais de 12 mi-
lhões de famílias fizeram a últi-
ma atualização no CadÚnico há
mais de um ano, e um milhão
delas, há mais de dois anos, se-
gundo relatório do Tribunal de
Contas da União (TCU).
A exigência de telefone, cone-
xão à internet, e-mail e uso de
aplicativos para o auxílio e a fal-
ta de um canal de atendimento
à população que precisa do be-
nefício também foram apresen-
tados como entraves. Outro
problema é a existência de um
limite ao número de tentativas
de solicitação, que não foi pre-
visto na lei.
“Tenho ouvido muitas pes-
soas que estão em desespero, es-
perando uma resposta. Como o


CPF delas é negado e o do dono
da Havan é aprovado? Tem al-
gum problema nesse processo
de cruzamento. Concorda co-
migo?” pergunta a assistente so-
cial e diretora de relações insti-
tucionais da Rede Brasileira de
Renda Básica, Paola Carvalho,
que no dia a dia lida com relatos
dramáticos de quem precisa e
não consegue o auxílio.

Vazamentos. O empresário Lu-
ciano Hang, dono da rede vare-
jista Havan, foi cadastrado e
aprovado para recebimento do
auxílio emergencial de R$ 600.
O caso veio à tona após dados
do empresário terem sido vaza-
dos por supostos hackers. Em-
bora o cadastro de Hang tenha
sido aprovado, ele afirmou em
post em rede social que não re-
cebeu o benefício.
O TCU sugeriu em relatório
técnico a criação de um meca-
nismo de prestação de contas
anual por beneficiários de pro-
gramas sociais, a exemplo da de-
claração de Imposto de Renda
da Pessoa Física (IRPF), em
que os contribuintes fazem o
ajuste anual de tributos devi-
dos ou a serem restituídos. Na
visão dos técnicos, o instrumen-

to pode funcionar como uma
malha fina de beneficiários que
eventualmente descumprirem
os requisitos. A medida ajuda-
ria a cobrar pagamentos indevi-
dos.
Para Paola, as falhas revelam
não só incompetência do gover-
no, mas também uma tentativa
de inviabilizar uma política na-
cional de renda que o Brasil tem

condições de fazer. “Temos
uma tarefa agora de pegar todas
essas pessoas que se cadastra-
ram no aplicativo e incluí-las
num grande cadastro”, propõe.
Para o presidente da Rede
Brasileira de Renda Básica,
Leandro Ferreira, o auxílio
emergencial é um ensaio para
um programa de renda mínima
permanente. “Um dos ganhos

do auxílio foi mostrar que as po-
líticas de transferência de ren-
da devem estar na ordem do dia
da proteção social no momen-
to”, diz Ferreira. Segundo ele, é
preciso aumentar a porta de en-
trada do Bolsa Família (um pro-
grama de renda mínima) para o
País caminhar na direção de um
programa de renda básica no
País.

PANDEMIA DO CORONAVÍRUS


lRetorno

BENEFÍCIO MAIS


LONGO É MELHOR


ATÉ PARA UNIÃO


lEsperando os R$ 600

‘Estadão’ passa a publicar coluna de Trabuco, do Bradesco. Pág. B4 }


“Sem o benefício, a
atividade econômica
vai cair mais, e aí a gente
tem impactos nas contas
públicas da mesma forma.”
Débora Freire
ECONOMISTA DA UFMG

Ajuda aguardada

Prorrogar auxílio pode devolver quase metade
dos recursos aos cofres públicos, aponta estudo

10 milhões
ainda aguardam a análise de da-
dos para receber os R$ 600 do
auxílio emergencial. Outras 42,
milhões de pessoas foram consi-
deradas inelegíveis pelo cruza-
mento de dados do governo

LUAN LIMA

Entidades se unem


para prorrogar


auxílio de R$ 600


Documento lançado por 162 organizações aponta 20 barreiras na


implementação do programa e pede respostas rápidas do governo


Mínimo. Para Ferreira, da Rede Brasileira de Renda Básica, programa deve ser permanente

BRASÍLIA

Estou viva. Foi essa mensagem
de desespero que a gaúcha de
Porto Alegre Paola Carvalho, di-
retora da Rede Brasileira de Ren-
da Básica, recebeu da paulista-
na Tânia Aparecida Gonçalves,
há mais de 20 anos sem empre-
go formal. Antes da covid-19,
ela fazia bicos sendo cobaia pa-
ra testes de produtos para as em-
presas. Teve o pedido de auxílio
emergencial negado pelo gover-
no. Motivo: falecimento.
Com uma página no Face-
book que acabou sendo um ca-
nal de ajuda e acolhimento para
aqueles que têm seu pedido de
auxílio recusado, Paola foi en-
contrada por Tânia por uma di-
ca de um pessoa próxima que
ajudou na comunicação via re-
de social. “Ela começou a man-
dar fotos para mim de que não
estava morta”, conta Paola. De
Porto Alegre, Paola buscou aju-
da em São Paulo para resolver o
problema. Mas até agora o bene-
fício não foi concedido.
Ao Estadão, Tânia conta que
não há nenhum problema com
os seus documentos e insiste
no pedido de socorro: “Você vai
me ajudar?”, pergunta à repór-
ter. “Juro que estou viva”.
Para Paola, o drama de Tânia
se junta a tantos outros que tive-
ram seu pedido negado e não
conseguem canal de comunica-
ção para mostrar que o cruza-
mento de dados do governo po-
de ser impreciso e ter falhas.
/A.F. e I.T.
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