O Estado de São Paulo (2020-06-08)

(Antfer) #1

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A2 Espaçoaberto SEGUNDA-FEIRA, 8 DE JUNHO DE 2020 O ESTADO DE S. PAULO






Durante a fase inicial do confi-
namento, as vendas de bebi-
das alcoólicas cresceram con-
sideravelmente. Muitas pes-
soas aumentaram seu consu-
mo em casa como um substitu-
to às saídas com os amigos. Ao
mesmo tempo, porém, a pan-
demia fez os consumidores
perceberem – por si mesmos,


ou por intermédio de suas fa-
mílias – seu excesso, afirma
um porta-voz do Alcoólicos
Anônimos da Alemanha.
Com as restrições de saúde
impostas desde março, gru-
pos de Berlim priorizaram reu-
niões online.

http://www.estadao.com.br/e/alcoolismo

U


rge que o presidente
Bolsonaro pare sua es-
calada rumo ao autori-
tarismo, mediante o uso indis-
criminado do arbítrio. Deci-
sões presidenciais num Esta-
do democrático passam por
uma série de mediações, sen-
do as mais importantes o Le-
gislativo e o Judiciário, e no
que concerne a este último, o
STF. Arrogar a si a verdade e a
decisão arbitrária só é fonte
de confrontos incessantes.
Acontece que o presidente e
sua família operam segundo a
concepção schmittiana da dis-
tinção entre amigo e inimigo,
fazendo que qualquer crítica
ou divergência seja vista sob o
prisma do inimigo a ser ataca-
do. O mesmo vale para ami-
gos em definições mutáveis,
pois, ao passarem a ser consi-
derados uma ameaça, tornam-
se inimigos a ser abatidos – os
casos mais eloquentes, Bebian-
no, Moro e Santos Cruz.
A distinção amigo-inimigo
não é, todavia, exclusiva da ex-
trema direita, vale também pa-
ra a esquerda. O próprio Carl
Schmitt, após ter sido apoia-
dor entusiasta de Hitler, es-
creveu, no pós-guerra, que
Mao e Lenin se encaixavam
na mesma concepção, tecen-
do-lhes elogios. Chávez e ago-
ra Maduro são seus discípu-
los. A distinção lulopetista en-
tre “nós” e “eles” é dessa mes-
ma estirpe.
No caso da experiência ve-
nezuelana, considerada por
Lula um exemplo de democra-
cia, processou-se a subversão
da democracia por meios de-
mocráticos. As instituições de-
mocráticas foram inicialmen-
te preservadas, enquanto o
seu interior foi progressiva-
mente minado. A imprensa e
os meios de comunicação em
geral foram, passo a passo, ca-
lados, o Legislativo perdeu
suas funções, com o presiden-
te passando a legislar por de-
cretos, e o Supremo Tribunal,
após ser atacado, foi coopta-
do. Milícias foram criadas e
passaram a violentar e contro-
lar os cidadãos.
No Brasil, estamos vivendo
um processo semelhante nos

seus inícios, só que de sinal
trocado. Da extrema esquerda
passamos para a extrema direi-
ta. Os ataques sistemáticos à
imprensa, aos meios de comu-
nicação em geral e o financia-
mento e operação organizada
de grupos encarregados de di-
fundir fake news mostram essa
tática de ataque ao “inimigo”.
A ameaça de ruptura institu-
cional, apesar de apresentada
como defesa da democracia
contra o espantalho do comu-
nismo, é outro de seus braços.
A constituição de milícias digi-
tais, agora tornadas milícias
de rua, até mesmo armadas,
caso do grupo liderado por Sa-
ra Winter, é outro de seus ins-
trumentos. A antiga bandeira
preta da Ucrânia, símbolo da
extrema direita naquele país,
é o seu símbolo.
Na mesma linha, a declara-
ção presidencial de que popu-

lação brasileira deve ser arma-
da para não ser escravizada
procura, na verdade, a servi-
dão dessas forças ao domínio
da extrema direita. Uma coisa
é a posse de armas no legíti-
mo exercício da autodefesa,
um direito; outra, muito dife-
rente, é armar a população pa-
ra se opor às autoridades, co-
mo os governadores de Esta-
do, por suas políticas de com-
bate à pandemia.
Contudo parar esse proces-
so rumo ao precipício exige
moderação do presidente,
com a subsequente alteração
da equipe governamental me-
diante o afastamento dos
mais exaltados, os ideológi-
cos. A perseguir tal política,
as crises sanitária, política e
econômica só tendem a se
agravar, levando o País a um
impasse perigoso, estando o
próprio mandato presidencial
em questão.
As recentes manifestações
de reação a este autoritaris-
mo por meio de vários mani-
festos pela democracia exi-

bem uma sociedade atuante,
ciente de que suas institui-
ções devem ser defendidas in-
dependentemente dos gover-
nos. A democracia é tida por
um valor maior, situado aci-
ma das contendas políticas e
partidárias. No entanto, não
deveria esse processo ser con-
duzido sob o modo de uma
nova polarização, embora pos-
sa ser necessária num primei-
ro momento, sob pena de ou-
tra forma de autoritarismo
surgir novamente no horizon-
te. O impasse institucional se-
ria o seu resultado.
Salta à vista que dois terços
da população brasileira não
são pró-democracia, apesar
de serem anti-Bolsonaro. Aí
estão incluídos, por exemplo,
os responsáveis pelo mensa-
lão, que minaram o sistema re-
presentativo com a corrupção
e o descalabro fiscal, para
além das tentativas, felizmen-
te infrutíferas, de controle da
imprensa e dos meios de co-
municação, apresentadas na-
quele então como sendo a ver-
dadeira democracia. Para não
falar das milícias do MST in-
fernizando o campo brasilei-
ro. Convém estar atentos a es-
ses “novos democratas”.
Deve-se olhar igualmente
com precaução a participação
de torcidas organizadas nas
manifestações, pois conside-
rá-las como democráticas é
outro equívoco. Na pressa de
uma oposição atuante nas
ruas, corre-se o risco de con-
fundir alhos com bugalhos, na
medida em que se caracteri-
zam por serem uma espécie
de quadrilhas, cujo prazer é
extraído do uso da violência.
A sociedade brasileira deve
sair da polarização, tendo co-
mo norte a democracia, sob
pena de perpetuarmos o im-
passe pelos próximos dois
anos e meio, além de correr-
mos o perigo de nele permane-
cer por mais quatro anos, seja
sob a égide da extrema direita,
seja da extrema esquerda.

]
PROFESSOR DE FILOSOFIA
NA UNIVERSIDADE FEDERAL DO
RIO GRANDE DO SUL (UFRGS)

Italiano e John Williams ti-
veram reconhecimento por
criação de trilhas sonoras.

http://www.estadao.com.br/e/musica

ALEMANHA


Reuniões online contra o alcoolismo


Desde meados de março de-
creto obriga 2,6 milhões de
idosos a permanecerem con-
finados. Multa equivale ao
salário mínimo.

http://www.estadao.com.br/e/colombia

l“Aos profissionais da saúde, o meu mais profundo respeito. Arriscam-
se todos os dias para, no final, terem de ouvir impropérios: que frauda-
ram declarações de óbito.”
SONIA MATIAS

l“A canalhice do governo federal é assombrosa.”
EDMILSON ANDRADE

l“Enquanto isso, o mundo se preocupa em conseguir uma vacina.
Vergonha é pouco!”
CRISTINA NASSIF

l“O Ministério da Saúde virou um cabide de emprego de militares em
plena pandemia.”
ROBERTO WEIGAND

INTERAÇÕES

CONSELHO DE ADMINISTRAÇÃO
PRESIDENTE: ROBERTO CRISSIUMA MESQUITA
MEMBROS
FERNANDO C. MESQUITA
FERNÃO LARA MESQUITA
FRANCISCO MESQUITA NETO
GETULIO LUIZ DE ALENCAR
JÚLIO CÉSAR MESQUITA

Monitor das Doações Co-
vid-19 contabiliza mais de
R$ 5,5 bi doados por empre-
sas, pessoas físicas e entida-
des públicas no Brasil.

http://www.estadao.com.br/e/doacoes

Espaço Aberto


A


s realidades pessoais,
especialmente econô-
micas, podem ser abso-
lutamente distintas e dois ou
três quarteirões podem sepa-
rar sobrevivências amparadas
por cestas básicas de outras
em que iguarias e bebidas nu-
ma só refeição custam alguns
salários mínimos.
Saudável para um número
enorme de lares é conceito de-
terminado pela ausência de fo-
me e muito bem estabelecido
se o consumo alimentar for ao
menos três vezes ao dia. Des-
se lado do muro, na maioria
das vezes o artigo que resolve
a questão responde pelo no-
me de comida e o “combo” po-
de conter qualquer casta de di-
geríveis saciantes.
Em todas as mídias observa-
mos boas matérias acerca da
“institucionalização” dos deli-
veries de alimentos, agora mui-
to além do fast-food, dada a in-
clusão de restaurantes de en-
vergadura qualitativa com
suas opções, em amplificação
e ampliação causadas pelas
ações no contingenciamento
da pandemia de covid-19.
Mais alvissareiras são as repor-
tagens observando famílias
com pais e filhos novo(a)s
chefs de cuisine e suas refeições
partilhadas por todos à mesa.
Seja qual for a lente captan-
do o inusitado cotidiano
atual, as preocupações projeta-
das são a transgressão calóri-
ca, a rédea perdida da boa for-
ma ou questionamentos mais
cerebrais conjecturando o sal-
do psíquico e comportamen-
tal quando o isolamento so-
cial for completamente des-
continuado.
Porém quase metade da po-
pulação brasileira é de famílias,
com média de três integrantes,
agraciadas com 0,8% da renda
do País, que custeia sua existên-
cia com menos de dois salários
mínimos por mês, quantia res-
ponsável por albergar, assear,
vestir e alimentar incontestes
gênios da economia que encon-
tram métricas para seguirem vi-
vos. São muitos em inúmeras
funções que podem não ter ga-
rantido nenhum rendimento
se lhe faltam o trabalho ou a


força para exercê-lo.
Na mesma análise os dados
oficiais informam 10% dos bra-
sileiros detendo por volta de
40% da renda nacional, enquan-
to os dois universos citados es-
tão separados por um grupo in-
termediário, classificado for-
malmente como classe média,
esta, porém, claramente dividi-
da em alguns escalões. À parte,
mas não desatentos, estão ges-
tores de enormes agregados fi-
nanceiros atuantes em vários
segmentos, os quais afrontam
cientistas e desdenham de nú-
meros de óbitos em justificati-
vas ancoradas na fome e misé-
ria vindouras com a retração
econômica pós-pandemia.
Como já dito, privação e so-
frimento já são expectativas
perenes para metade de nossa
nação, nessa substancial fra-
ção populacional o medo da ca-
rência extrema é e sempre foi

infinitamente maior que a
preocupação com outras amea-
ças de qualquer natureza, que
incluem enchentes, desmoro-
namentos e tantas mazelas
contagiosas.
Então, é para o grupo inter-
mediário, ao qual pertenço,
que a maior parte dos recados
é endereçada, sejam observa-
ções para nosso deleite e in-
trospeção, ou os estratégicos
cutucões de quem timoneia o
barco da engrenagem financei-
ra. Mas, por aqui, quando trata-
mos de coisas sérias estamos
discutindo se o medicamento
é usado para prejudicar o go-
verno estadual ou não está sen-
do prescrito para atrapalhar o
federal. Já definimos também
que a ousadia de não usar más-
cara afirma com louvor a ban-
deira política que defende-
mos, enquanto abordar a ciên-
cia perante discussões sobre a
pandemia de covid-19 expõe o
marxista que nos habita.
É desalentador imaginar
que essa catástrofe não nos fa-
ça pensar nada além do nosso

umbigo e quando nos aparta-
mos dos ranços ideológicos o
que fazemos é continuar desti-
lando possibilidades para o
“novo normal”. Imaginamos a
perpetuação do home office,
das reuniões em plataformas
virtuais, motoboys cruzando a
cidade para nos representa-
rem em gôndolas de super-
mercados, balcões de farmá-
cias e restaurantes. Cenários
futuros para “nós”.
Se compomos os 90 mi-
lhões do grupo entre os extre-
mos, somos ao menos 60 mi-
lhões de interlocutores entre
as duas verdades. Passa da ho-
ra de assumirmos nossa parce-
la na indispensável mudança
que não impede a contempla-
ção de hábitos novos, mas não
permite continuarmos enxer-
gando metade do País como
fonte de nossos serviçais.
O plano mitigador dos inevi-
táveis danos da pandemia pre-
cisa negar o mergulho no escu-
ro proposto pelos detentores
do caixa, mas impõe a humilda-
de de solicitar-lhes as luzes pa-
ra clarear os caminhos de uma
reconstrução real. As compassi-
vas doações bilionárias de vá-
rias instituições mantêm nos-
sos reféns no jogo, mas não
mudam suas perspectivas.
Entre tantos deveres, fica a
cargo do poder público provi-
denciar urgentemente redes de
esgotos, água potável e educa-
ção de base de alta linhagem;
para a livre-iniciativa, a inclu-
são para além da excludência,
lembremos que o escalonamen-
to produtivo de ínfimos custos,
na ausência de mão de obra hu-
mana com boa remuneração,
caminha a passos rápidos para
um mercado de extraordiná-
rias ofertas sem ninguém com
recursos para consumir.
Muito mais que um novo nor-
mal, precisamos de uma nova
fome, a saciada por mudanças
que melhorem a vida de todos.

]
DOUTOR EM ENDOCRINOLOGIA
PELA FACULDADE DE MEDICINA DA
UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO
(USP), É MEMBRO DA SOCIEDADE
BRASILEIRA DE ENDOCRINOLOGIA
E METABOLOGIA (SBEM)

PUBLICADO DESDE 1875

LUIZ CARLOS MESQUITA (1952-1970)
JOSÉ VIEIRA DE CARVALHO MESQUITA (1947-1988)
JULIO DE MESQUITA NETO (1948-1996)
LUIZ VIEIRA DE CARVALHO MESQUITA (1947-1997)
RUY MESQUITA (1947-2013)

FRANCISCO MESQUITA NETO / DIRETOR PRESIDENTE
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10 maiores doações
durante a pandemia

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]
Antonio Carlos do Nascimento


Tema do dia


Polo Cultural buscou solu-
ção técnica para recriar cli-
ma de batalha de poesias.

http://www.estadao.com.br/e/poesia

O Brasil tem


fome de quê?


Privação e sofrimento
já são expectativas
perenes para metade
da nossa nação

O caminho


do arbítrio


Estamos vivendo um
processo semelhante ao
da Venezuela chavista,
só que de sinal trocado

AMÉRICO DE CAMPOS (1875-1884)
FRANCISCO RANGEL PESTANA (1875-1890)
JULIO MESQUITA (1885-1927)
JULIO DE MESQUITA FILHO (1915-1969)
FRANCISCO MESQUITA (1915-1969)

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    LOCALIDADES E CONDIÇÕES SOB CONSULTA.
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Governo esconde


dados de covid e quer


recontar mortes


Para Ministério da Saúde, Estados e
municípios manipulariam informações
para se beneficiarem de verbas federais

]
Denis Lerrer Rosenfield

OLEG POPOV/REUTERS E-INVESTIDOR

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