Estado de Minas (2020-06-08)

(Antfer) #1

Pela vozdetrês moradores de BH, EMretrataarepercuss ãodos movimentosque


se espalhampelo mundo easexpectativas de umapopulaçãoembuscade respeito


Indignaçãoeesperança


à flor da pele


❚LUTA ANTIRRACISTA


ANAMEN DONÇA*

Manifestaçõescontraoracismose espalhampelo mundo.CidadescomoNovaYork,Londres,Paris,Vancouver,São PauloeBelo Horizontetrans-
formamas ruas em palcode protestos,em muitoscasos,luta eenfrentamentos.Oestopimdos movimentosfoi amorte do ex-segurançanegroGeor-
ge Floyd,asfixiadopor um policialbrancoem uma“abordagem”nos EstadosUnidos.Afrase “Nãoconsigorespirar”se transformouem lemapla-
netaafora,reverberandooapelo da vítimaenquantoera mantidasob ojoelhodo agressorecobrandoofim do racismoestrutural.Mesmocom o
riscode seremcontaminadospelo novocoronavírus,negrosebrancosse deramas mãosparaexigirmudança.No Brasil,omovimentoantirracis-
ta se fundiuadiversasoutraspautas,comapelospor democraciaesendoconvocadoinclusivepor torcidasrivais,comoocorreuno maiorprotes-
to, em São Paulo,há umasemana–que acabouem confronto.Acena de torcidasrivaisjuntasse repetiuontemem São PauloeBelo Horizonte.Pa-
ra entenderdramasconcretospor trás de reivindicaçõesque por vezesparecemdifusas,oEstadodeMinasdeu voz atrês personagens,que dão tes-
temunhossobreepisódiosde discriminaçãona capitalmineiraepõemem palavrasador que milharesde brasileirossentemna pele.

ConhecidocomoTomTom,
Gleidistoneafirmasesentirre-
presentadopelomovimento an-
tirracismoecrêqueomundo
passaporummarconahistória.
“É ummomento queextrapola
barreiras,sociaiseinternas,algu-
masaté mesmosanitárias,devi-
doaonovocoronavírus.Aspes-
soasnãotêmmais medo,aban-
deiraficoumaiorqueisso.Preci-
samos falar sobre racismo e
ecoarogrito dequepessoaspre-
tasestãomorrendo.Vidaspretas
importam”,afirma.
Quandoquestionadosobre
eventualmudança,porém,opu-
blicitário éreticente. “Muda?Não
seidizer.Portodaaminhavida
vivi emumasociedaderacista,is-
soestáimpregnadonapolíticae

nahistória domundo.Oracismo
noBrasil éinstitucional.Por que
umbrancojulgaumpretonotri-
bunal?Ojuizprecisaserpreto.Só
assimojulgamento vaiser justo.
Éprecisoquepessoasbrancasen-
xerguemisso,comecemase
questionar.Observemoqueestá
acontecendo,aprendamaescu-
tar.Issoéummarco,umaopor-
tunidade”,avalia.
Paraele,pessoasbrancas
podemajudaromovimento
antirracistaprocurando en-
tenderacausa.“Nãotentem
protagonizarumespaçoneste
momento.Busquemporco-
nhecimentoeporeducação,
leiamlivros,artigosejornais.
Criemespaçosparaavozpre-
ta.Usemempresasecontra-

temmodelospretos.Emfesti-
vais demúsica,contratemar-
tistaspretos.Sãopequenas
ações que transformam o
mundoetrazemrepresentati-
vidadeparaacausa”,acredita.
Opublicitário classificouco-
mo“péssimo”omovimento
“BlackoutTuesday”,quelotouo
Instagramdefotospretas.“Tira
ofocodaação.Aspessoaspreci-
samverosrostosdasvidasque
foramassassinadas. NoEstados
Unidos,foiFloyd, aqui,noBra-
sil,ameninaAgatha, ojovem
JoãoPedroetantosoutrosmor-
tospelarepressãopolicial”,lem-
bra.Paraele, umahashtagnão
muda,nãotransforma. “É preci-
soverpessoaspretasfalando,
vernossosrostos.”

Aestudante daPUCMinas usa
suavozparafalarcomamigosso-
brealutaantirracista.Moradora
doFuncionários,bairrodeclasse
médiaalta deBH,ajovemsempre
estudouemcolégiosparticulares
econvive emambientesmajorita-
riamente frequentadosporpes-
soasbrancas.“Comoumapessoa
negra,emumasituaçãode privilé-
gio,convivocommuitagente
branca,oquejá esboçaoracismo
estruturalnoBrasil.Oracismo
acontecediariamente. Porserqua-
se sempreaúnicanegra,chamoa
atençãoaochegar,aspessoasme
olhamemejulgam”,conta.
Auniversitária relata quejá so-
freudiscriminaçãoemespaços
comoshoppingeboate da capital,
eque,emumdosepisódios,che-
gouachamarapolícia. Masconta


quenada foifeito.“Chegaramefa-
laramqueeuestava exagerando.”
Questionadasobreomovimen-
to quevemtomandoconta deci-
dadespelomundo,AnaCarolina
dizquese sente representada.“Re-
presentatividadeimportamuito,
aindamais na vidadascriançasne-
gras. Tododia,essasmeninas eme-
ninosescutamqueoqueébonito
éser branco.Ter abocapequena, o
narizfino,acormais clara.Elas
crescemescutandoisso.Vendoes-
sasimagens,dasruasedomundo,
issoinspira.Eumesinto represen-
tadaporqueaindignaçãodaco-
munidadenegrafinalmente está
aí. Eissoprecisaserlembrado,as-
simcomoopedidopelavidadas
criançasnegrasmortasnasfavelas
doRiode Janeiro.Esseéoverdadei-
ro pedidodesocorro.”

Inspiradapormovimentos
antirracistas,ajovemusaaplata-
formadoInstagramparatirardú-
vidasde jovensdoseumeiosocial.
Deacordocomela,muitosami-
gosaprocuraramparaentendero
queestava acontecendonomun-
do.“Issomedeixafeliz,mas, mui-
tasvezes,as pessoassó falamso-
breracismoquandoapauta está
emalta.Esperamalgoacontecer.
Entendam,nãoépreciso esperar
algoacontecernosEstadosUni-
dosparaabrir umdiálogo”.Ao
afirmar queopresidente doBrasil
éconhecidopor“declaraçõesra-
cistas,machistas,homofóbicas”,
elaquestiona: “E aí?Porquenin-
guémfaznada?Éprecisoterro-
dasdeconversa,incluindoessas
pessoasracistas,porqueessaé
umaproblemáticabranca.”

Pertodecompletarocursode
direitonaFaculdadeArnaldo,Po-
lianadesabafa:“Estoumefor-
mandoagorae, nafotodaturma,
souaúnicamulhercomcabelo
cacheado.Édifícil olhar paraos
sonhosenãosentirqueexiste
chancedeconquistá-los”,lamen-
ta.Eladestacaque,emtodaahis-
tória doSupremoTribunal Fede-
ral(STF)–postoqueémetapara
qualquerestudante dedireito–,
houveapenasummagistrado
negro.“Um,apenas um.Precisa-
mosfalarsobrerepresentativida-
deeopapelqueelatemnavida
depessoaspretas”,afirma.
Quandoquestionadasobrea
atuaçãodepessoasbrancasnalu-
ta antirracismo,aestudante cita

oatorPauloGustavo.“Durante
estasemana, elecedeuapágina
noInstagramparapessoasne-
gras.Eumesenti representada.É
issoquebrancosprecisamfazer:
darvozàspessoasnegras.Afala
quandovemdabocadeumne-
groémuitomais forte”,diz.
Polianarelata queacobertu-
ra damídiadurante oprotesto
proporcionouum momento
únicoemsuavida.“Minhamãe
émaisvelha, nãosabeescrever,
nãoteveasmesmasoportuni-
dades.Outrodia,megritou:‘Fi-
lhaestãofalandodosnegrosna
TV’.Fiquei emocionada. Ela
nuncatinhavistoaquilo,efi-
nalmente estáse reconhecendo
comonegraeentendendoque

elanãoéoproblemaesimpar-
te dasolução”,afirma, admitin-
doqueelamesmademoroua
se aceitarnegra.
Aestudante fazumalertaso-
breaimportância damilitância
nasruas.Segundoela,ajuventu-
detemumpodermuitogrande
nasmãosepodecontribuirpara
queapauta sejarealmente escu-
tada.“Semprefaloqueaspes-
soasprecisamsairdasredesso-
ciaiselevar asério.Osjovenses-
tãocomeçandoatomarcons-
ciência doseupapelnasocieda-
de.Masvale lembrarqueame-
lhorformadefazeradiferençaé
elegendorepresentantespolíti-
cosquesãoafavordaluta,da
culturaedainclusão.”

““AAbbaannddeeiirraaffiiccoouummaaiioorrqquueeoommeeddoo””


■■Gleidistone Silva,p ublicitário,26anos

““NNããooéépprreecciissooeessppeerraarr aallggooaaccoonntteecceerr””


■■Ana Carolina Nagem,estudante de psicologia,20 anos

““PPeessssooaasspprreecciissaammssaaiirrddaassrreeddeesseelleevvaarraasséérriioo””


■■PolianaRamos,estudante de direito,28anos

*Estagiáriasob supervisãodoeditor RoneyGarcia

FOTOS: GLADYSTONRODRIGUES/EM/D.A PRESS

NAS REDESEntrevistadospelareportagemusamredes sociaispararesponderàsp erguntas sobrealuta antirracista.Acesseparasabermaisesemanter informado:@eugleistone


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POLÍTICA

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