O Estado de São Paulo (2020-06-10)

(Antfer) #1

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H6 Especial QUARTA-FEIRA, 10 DE JUNHO DE 2020 O ESTADO DE S. PAULO


casa


Leandro Karnal


PARA OS IDOSOS


l]


EXERCÍCIO

Especialista ensina movimentos simples, que ajudam


a manter o corpo ativo sem a necessidade de sair de casa


Danilo Casaletti
ESPECIAL PARA O ESTADO


A instrutora de pilates Marcia Pi-
res decidiu, logo que a epidemia
chegou ao Brasil, levar a mãe, An-
gela Melli dos Santos, de 84
anos, para passar a temporada
de isolamento em seu aparta-
mento, onde mora com o mari-
do e os filhos. A idosa nunca ha-
via feito exercícios físicos antes,
mesmo com a filha formada em
educação física, mas concordou
com as orientações de Marcia de
que precisava se exercitar. Mar-
cia montou uma série de exercí-
cios que dona Angela tem feito
pelo menos três vezes por sema-
na. “Elaborei a série de acordo
com as necessidades dela, com
exercícios para fortalecer as per-
nas e ativar a circulação, respei-
tando os problemas que ela tem
de coluna”, diz Marcia.
Nas últimas semanas, os go-
vernos estaduais e municipais
vêm promovendo a reabertura
de lojas, shoppings e outras ativi-
dades comerciais, mesmo com
os índices de contaminação no
País seguirem altos. Porém, prin-
cipalmente para os idosos, que
estão no grupo de risco de conta-
minação por covid-19 (segundo
boletim divulgado pelo Ministé-
rio da Saúde em 25 de maio,
69,4% dos casos de óbitos no


Brasil são de pessoas com mais
de 60 anos), retornar às ruas é
ainda mais arriscado.
“Esse relaxamento do isola-
mento social tem como crité-
rios, entre outros fatores, o nú-
mero de leitos em hospitais.
Mas ele não indica que o contá-
gio diminuiu, pelo contrário,
ele é maior agora do que em mar-
ço. Os idosos terão que esperar
mais tempo”, diz Daniel Apoli-
nário, geriatra do HCor. Portan-
to, para eles, o isolamento se-
gue e, com isso, aumenta a ne-
cessidade de atividade física –
para a boa saúde física e mental.
Dona Angela diz que já perce-
be os resultados. “Sinto mais faci-
lidade para me movimentar e
durmo melhor à noite”, diz ela,
que promete não parar mais de
se exercitar. Para incentivar a

confiança e a independência da
mãe, Marcia anotou os exercí-
cios e deixa com que ela mesma
faça os movimentos.
Para o geriatra Daniel Apoli-
nário, esse é o caminho correto


  • o idoso pode e deve se exerci-
    tar, mesmo que sozinho. “Exer-
    cícios como sentar e levantar,
    movimentar braços e pernas,
    são de baixo risco. É seguro fa-
    zer em casa”, diz, explicando
    que a falta de atividade física
    nessa faixa etária pode causar
    perda de massa muscular, dimi-
    nuição da capacidade cardior-
    respiratória, constipação, insô-
    nia, entre outros problemas.
    Do ponto de vista emocional,
    exercitar-se pode ajudar a dimi-
    nuir a ansiedade, transtorno
    que tem se tornado comum en-
    tre os idosos, segundo explica


Apolinário. Ele diz que a pró-
pria pandemia, a situação de ris-
co e problemas familiares – co-
mo a perda do emprego dos fi-
lhos – são as principais causas
de inquietação. O geriatra ain-
da chama a atenção para aque-
les que faziam fisioterapia an-
tes da pandemia: o tratamento
não pode parar, mas deve ser fei-
to da própria residência. “Se ne-
cessário, pode-se receber o fi-
sioterapeuta em casa, desde
que ele use equipamentos co-
mo máscara e avental.”

Para fazer em casa. A pedido
do Estadão, o educador físico
Rodrigo Sangion preparou, espe-
cialmente para os idosos, uma
série com quatro exercícios. São
atividades sem impacto, que
usam apenas o peso do corpo ou

objetos simples, como uma almo-
fada, que devem ser feitos pelo
menos três vezes por semana ini-
cialmente. Com o tempo, pode-
se aumentar para cinco vezes.
“São exercícios simples, mas
que combatem o sedentarismo
e tudo que ele acarreta, além de
evitar o atrofiamento dos mús-
culos e, como consequência, a
perda de mobilidade”, diz San-
gion. Outro hábito que deve ser
evitado, segundo o educador,
que atua há mais de 20 anos na
área, é ficar longas horas senta-
do ou deitado. “Uma das compli-
cações que aparecem é a trombo-
se”, aponta Saigon, que sugere
aos idosos a caminhada, mesmo
dentro de casa, em três séries de
dez minutos ao longo do dia.
Caso o idoso se sinta seguro,
segundo o geriatra Daniel Apoli-
nário, respeitando os cuidados
de higiene e com o uso de másca-
ras, ele pode descer para cami-
nhar nas áreas abertas do prédio
ou no máximo dar uma volta no
quarteirão. “Ao ar livre, o risco
de contágio é pequeno, basta
guardar distância de outras pes-
soas”, diz. Os resultados da ativi-
dade física aparecem após um
mês do início, com grande ga-
nho, sobretudo, de mobilidade,
diz Sangion. “É muito gratifican-
te trabalhar com esse público.
Ao contrário dos mais jovens,
que visam a questão estética, os
idosos vibram com as pequenas
conquistas e se sentem motiva-
dos a continuar.”

EM SEGURANÇA

ESCREVE ÀS QUARTAS-FEIRAS E AOS DOMINGOS

Os exercícios selecionados aqui
devem ser realizados diariamen-
te, com 3 séries de 12 repetições.
Abaixo, dicas para se movimen-
tar em segurança.

l Faça atividades entre 1h e
2h após as refeições. Escolha o
horário em que estiver mais dis-
posto – geralmente, pela manhã

l Faça os exercícios em um
local plano, seco e sem tapetes.
Use roupas leves e tênis. Se o
equilíbrio for um problema, peça
ajuda.

l Em caso de dúvida, procure
ajuda de um profissional

A


vida corria tranquila na pe-
quena Loudun, no interior
da França. A orgulhosa tor-
re (Tour Carrée) da cidade já era
velha de meio milênio quando os
Bourbons assumiram a coroa. O
cotidiano modorrento seria abala-
do por vários acontecimentos ex-
traordinários.
Alguns anos antes dos fatos que
descreveremos, foi nomeado um
padre para a paróquia de São Pedro
e com um cargo na vizinha igreja da
Santa Cruz. Urbain Grandier era
dotado de boa cultura, aparência
agradável e um incontrolável im-
pulso de seduzir mulheres. Suas
boas relações políticas o livraram
de algumas acusações graves de as-
sédio às paroquianas.
O caldo começou a ficar mais den-
so: a região foi atacada por uma peste
(1632) e crescia a tensão entre protes-
tantes e católicos em torno de ques-
tões se a cidade deveria ou não man-
ter seus muros, cuja demolição já ti-
nha sido ordenada pelo cardeal Ri-

chelieu. Vamos acrescentar uma outra
personagem: Joana de Belcier, descen-
dente de uma pequena nobreza provin-
ciana, dotada de um leve defeito físico
na postura. Após fracassar em um con-
vento beneditino, acabou integrando a
ordem das irmãs ursulinas, em Loudon.
O lugar passa a viver estranhos acon-
tecimentos sob a liderança de Joana,
agora com o nome religioso de Joana
dos Anjos. Tudo começou com a visão
do fantasma do antigo confessor das re-
ligiosas. Depois, as freiras apresenta-
ram ataques histéricos e gritavam pala-
vras obscenas para um público escanda-
lizado. As convulsões se multiplicam e
vozes estranhas saíam das gargantas
das religiosas. O caso lembrava o prece-
dente em Aix-en-Provence onde, igual-
mente, freiras ursulinas tinham sido in-
fectadas por espíritos malignos, em


  1. Quase toda a Europa (protestante,
    inclusive) vivia um surto de “caça às bru-
    xas” e a crença na existência real do de-
    mônio e sua ação maléfica unia intelec-
    tuais, reis e a população em geral.
    Joana dos Anjos acusou formalmen-


te o padre Grandier de ser o causador
de todos os distúrbios no convento. O
clérigo tinha um bom número de inimi-
gos e tinha se pronunciado contra a de-
cisão do cardeal-ministro de demolir
os muros da cidade, aumentando o co-
ro dos descontentes contra o Don Juan
clerical. O espetáculo da possessão co-
letiva das freiras era, agora, um tema
nacional. Diante de autoridades e inter-
rogadores, as freiras rolavam no chão e
gritavam blasfêmias.
Urbain Grandier foi preso e julgado.
Apareceu um pacto diabólico, um docu-

mento concreto assinado por vários
demônios e conservado até hoje nos
arquivos franceses. Os crimes, claro,
foram todos comprovados. No dia 18
de agosto de 1634, com uma multidão
que excedia a população local, o fogo
foi aceso em frente à igreja da Santa
Cruz. O clérigo foi muito torturado e,
como era esperado, encontraram-se
pontos insensíveis à dor e ao sangra-
mento no seu corpo, outro sinal evi-
dente de que tinha selado um acordo
com o Inferno. O agente de Satanás
convertera-se em carne carbonizada.
Restava a possessão do convento.

As freiras foram exorcizadas diversas
vezes. O problema era a grande quanti-
dade de demônios. Expulsava-se um e
surgiam vários outros que diziam seus
nomes e permaneciam no corpo das afli-
tas. Houve rivalidade entre as ordens.
Os capuchinhos foram substituídos
por jesuítas na luta contra as legiões. O
exorcismo envolvia opiniões do cardeal
Richelieu, dos juízes locais e do bispo.
Lutava-se pelas almas das ursulinas, lu-
tava-se contra a ação dos seres infernais
e, acima de tudo, pelo triunfo do poder
monárquico e católico sobre a região. O
caso é tão envolvente que a própria Joa-
na dos Anjos é levada à presença do rei
Luís XIII e da rainha Ana de Áustria.
Um erudito e místico jesuíta, Jean-Jo-
seph Surin, foi trazido para participar
do esforço de exorcismos. Conseguiu
expulsar ainda mais demônios, porém
entrou em crise depressiva e descre-
veu que os demônios retirados do cor-
po das freiras vinham para o seu. O
religioso desenvolveu tendências sui-
cidas e descreveu como sentia uma en-
tidade dentro dele. Em janeiro de 1665,
morreu Joana. Seus anos finais foram
marcados pela obsessão de virar santa.
Imersa em afasia e penitências, marca-
da por estigmas pelo corpo, a popular
freira do século 17 faleceu de complica-
ções respiratórias. A 22 de abril do mes-
mo ano, o padre Surin também fecha-
va os olhos definitivamente. Ele havia

trocado uma forte correspondência
com a exorcizada.
O caso de Loudon foi descrito co-
mo histeria coletiva, jogo político, es-
quizofrenia e fruto da “demonoma-
nia” moderna. Após o escândalo, os
juízes passaram a acreditar menos
em possessões demoníacas, como
defendeu Robert Mandrou no con-
troverso livro Magistrados e Feiticei-
ros na França do Século 17 (ed. Pers-
pectiva). O jesuíta Michel de Cer-
teau escreveu uma análise clássica:
La Possession de Loudun, ainda sem
versão em português. De Certeau
também explorou a escrita mística
do padre Surin, seu colega de ordem.
Freud interessou-se pelas narrativas
em texto de 1923. Aldous Huxley pu-
blicou o romance Os Demônios de Lou-
dun, em 1952. O livro inspirou uma
ópera de Krzysztof Penderecki.
Jerzy Kawalerowicz fez um filme: Ma-
dre Joana dos Anjos. O inglês Ken Rus-
sell dirigiu Vanessa Redgrave e Oli-
ver Reed tratando do episódio. A pos-
sessão inspirou o intelecto e as artes.
E os demônios? Ainda brilhariam
em Salem, no fim do século 17. De-
pois iriam perder lugar para outras
atrações. A histeria coletiva? Essa so-
breviveu e ainda assombra governan-
tes e juízes. Ah se madre Joana dos
Anjos tivesse internet... É preciso
manter a esperança... e a sanidade.


  1. Flexão
    de braços.
    Com os pés
    afastados,
    braços
    estendidos ,
    apoiado
    sobre a
    parede.
    Fazer uma
    flexão e
    extensão –
    importante
    manter o
    abdômen
    contraído.


FOTOS RODRIGO SANGION


  1. Agachar
    na cadeira.
    Sentado
    com os pés
    afastados,
    mãos sobre
    as pernas,
    fazer o
    movimento
    de sentar e
    levantar,
    mantendo a
    postura
    ereta


3.
Caminhada
marchando
Caminhe
levantando
a perna até
a altura da
cintura ou
até onde
conseguir

Os demônios de


antigamente


A crença na existência real do
demônio e sua ação maléfica unia
intelectuais, reis e população


  1. Adutor.
    Sentado
    com pés
    paralelos
    e coluna
    ereta,
    colocar
    uma
    almofada
    entre as
    pernas.
    Aperte e
    junte as
    pernas

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