O Estado de São Paulo (2020-06-10)

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A6 Política QUARTA-FEIRA, 10 DE JUNHO DE 2020 O ESTADO DE S. PAULO


ROSÂNGELA


BITTAR


O


desfecho das manifestações
nas ruas, dos manifestos
dos movimentos organiza-
dos, das reuniões privadas e debates
públicos ainda não está totalmente
visível. Os opositores ao lamentável
governo Jair Bolsonaro já iniciaram
a caminhada, mas seu horizonte ain-
da não tem o nome de um líder ou
uma definição clara sobre o cenário
político que procuram. O propósito
é levar adiante um processo, organi-
zado e consequente.
A partir de agora, estão decididos
a selecionar os fatos, dia a dia, até
que fiquem instaladas as condições
para providências concretas. No de-

bate do domingo, na GloboNews, em
que formalizaram sua união contra o
mal, o ex-presidente Fernando Henri-
que Cardoso e os ex-ministros Ciro Go-
mes e Marina Silva apontaram está-
gios diferentes da reação política ao
escárnio do governo Jair Bolsonaro
com a opinião pública dos brasileiros.
Ciro, por exemplo, fixou-se no im-
peachment, opção do grupo de parti-
dos de esquerda e centro com quem
tem conversado. Não agora, imediata-
mente, mas com previsão para agosto
ou setembro. Fernando Henrique de-
monstrou cautela com relação a isto
e seu raciocínio sobre os desdobra-
mentos da nova frente ampla aponta

em direção à travessia até as eleições
de 2022.
Por sinal, o impeachment nunca foi
a primeira opção do ex-presidente. Na
deposição do ex-presidente Fernando
Collor, FHC dizia que “impedimento é
bomba atômica, existe para não ser
usada”. Uma semana depois desta ca-
racterização extrema, estava ele, pes-
soalmente, colhendo a assinatura de
Marcelo Lavenère, então presidente
da OAB, à petição. Entre a frase e a ação
o impeachment se impusera.

No caso atual, o ex-presidente ainda
se guia pela fase inicial, a prudência. É
preciso observar como, nesses próxi-
mos dois a três meses, os fatores das
crises produzidas e alimentadas por
Bolsonaro se refletirão sobre o destino
do governo.
Podem surgir elementos que acele-

rem o processo de impedimento ou
que retardem a saída para a disputa
eleitoral. Por exemplo: o inquérito das
fake news vai evidenciar a participação
de algum filho nas atividades do gabi-
nete do ódio? Algum dos processos
que restaram no TSE poderia afastar a
chapa Bolsonaro-Mourão? O inquéri-
to da interferência do presidente na
ação da Polícia Federal comprovará as
suspeitas de ligação do seu grupo po-
lítico com milicianos?
São questões a terem respostas nos
próximos meses. Definirão a ação da
frente de oposição.
As eleições municipais que ocorre-
rão neste meio tempo não são obrigato-
riamente pontes para um grande con-
senso, mas podem funcionar como ma-
ta-burro.
Muito há para ser definido. No diálo-
go das forças que agora se unem con-
tra o esfacelamento político, econômi-
co, humano e ético do Brasil, não apa-
receram nomes de líderes que pode-
rão galvanizar essas forças políticas. É
o que mais se procura, hoje. Os no-

mes. O nome.
É preciso, antes, avaliar conver-
gências, incompatibilidades, esque-
mas que podem sustentar a mudan-
ça. O que colocar no lugar? Que par-
tidos vão se aliar para formar uma
chapa? Quem com quem, em torno
do quê? São questões urgentes na
agenda deste período que se segue
ao primeiro passo, o da união.
O fato político que servirá de de-
nominador comum ainda não ama-
dureceu, mas a iniciativa de aliança
já foi suficiente para evidenciar que
Jair Bolsonaro está absolutamente
isolado. O Centrão, grupo parlamen-
tar que divide o governo Bolsonaro
com os militares, tem votos para evi-
tar o impeachment, mas não tem
consistência para garantir estabili-
dade política que o presidente preci-
sa. Os partidos tradicionais, de cen-
tro e centro-esquerda, que pode-
riam assumir o papel, são domina-
dos pelos líderes ora em oposição. E
não poderá contar com os arranjos
espontâneos do eleitorado de 2018.

E-MAIL: [email protected]
ROSÂNGELA BITTAR ESCREVE SEMANALMENTE ÀS
QUARTAS-FEIRAS

Pedro Venceslau


Na manifestação contra o gover-
no Jair Bolsonaro do domingo
passado no Largo da Batata, Pi-
nheiros, zona oeste de São Pau-
lo, nenhum político com man-
dato discursou no carro de som,
e isso deve ser de repetir no
próximo fim de semana, quan-
do ativistas prometem voltar às
ruas. Os líderes dos atos já en-
viaram um protocolo à Polícia
Militar requisitando a Avenida
Paulista no domingo, e dizem
que não irão abrir mão do local.


A avaliação entre os organiza-
dores, muitos deles filiados a
partidos, é que a participação
de parlamentares no ato pode
causar divergências internas
em um movimento heterogê-
neo e de equilíbrio frágil, além
de afastar manifestantes que
não são de esquerda. No domin-
go passado havia poucas bandei-
ras e faixas de partidos como
PCO, PCB e PSOL.
O foco de resistência aos po-
líticos é a aliança entre lideran-
ças das torcidas organizadas,
que compõem o principal eixo
de mobilização. Muitos partici-
pantes dessas organizações
têm aversão aos partidos e al-
guns são ex-bolsonaristas. A ex-
ceção aberta no carro de som
foi para o ex-presidenciável e
pré-candidato a prefeito da ca-
pital Guilherme Boulos (P-

SOL), que falou em nome da
Frente Povo Sem Medo e do Mo-
vimento dos Trabalhadores
Sem-Teto (MTST).
O PSOL é o partido que mais

se destaca nos bastidores do mo-
vimento. Apesar de ser filiado
ao partido de Boulos, o líder do
movimento Somos Democra-
cia, que representa as torcidas,

Danilo Pássaro, disse que deten-
tores de cargos eletivos têm ou-
tro papel. “Nas ruas temos que
dar voz aos movimentos so-
ciais. Não são só torcidas, mas a
população tem resistência aos
políticos”, disse o ativista, que
faz parte da Gaviões da Fiel.
“É uma construção coletiva.
Se a organização dos atos ava-
liar que é melhor evitar falas de
parlamentares, assim será. Mas
o fundamental não é quem fala.
É o ato em si, a mobilização e o
que se defende nela”, pontuou
Guilherme Simões, da Frente
Povo sem Medo.
A ideia de evitar parlamenta-
res não é consenso entre os or-
ganizadores e causou descon-
forto em petistas, que reserva-
damente reclamaram do espa-
ço aberto a Boulos. Embora o
PT não esteja na organização,

quadros do partido têm defendi-
do e incentivado os atos de rua.
“Eu avalio que o movimento
precisa dialogar para que os par-
tidos que queiram participar
das manifestações. A negação
do partidos políticos nas primei-
ras manifestações do MPL em
2013 teve um resultado desas-
troso. Ali teve início a criminali-
zação da política, especialmen-
te a política de esquerda”, afir-
mou Raimundo Bonfim, diri-
gente da Central de Movimen-
tos Populares (CMP), que inte-
gra a coordenação dos atos.
Os partidos de esquerda opta-
ram por não convocar nem parti-
cipar institucionalmente dos
atos, mas também não censu-
ram a participação dos militan-
tes. Pelo contrário. Após reu-
nião da executiva nacional, o PT
divulgou uma nota se dizendo
“solidário” aos atos e recomen-
dando precauções aos ativistas,
além de cuidado com provoca-
ções e possíveis infiltrados.

Opositores ao governo já
iniciaram a caminhada,
mas ainda não há um líder

Vinícius Valfré / BRASÍLIA


Donos das maiores bancadas
na Câmara dos Deputados, o
PT e o PSL vão receber as ver-
bas mais altas do Fundo Elei-
toral para custear as campa-
nhas candidatos a prefeitos e
vereadores este ano. Segun-
do divisão anunciada anteon-
tem pelo Tribunal Superior
Eleitoral (TSE), o PT terá à
sua disposição R$ 200,9 mi-
lhões, enquanto o PSL ficará
com R$ 193,7 milhões.
Os critérios para a divisão do
fundo levam em conta os totais
de votos recebidos pelos candi-


datos dos partidos na eleição an-
terior, além dos tamanhos das
bancadas na Câmara e no Sena-
do. Uma parte menor é distri-
buída de maneira uniforme en-
tre todas as siglas.

Com a pandemia do novo co-
ronavírus, circularam no Legis-
lativo propostas para que o Fun-
do Eleitoral fosse revertido pa-
ra ações de enfrentamento à cri-
se sanitária. Levantamento fei-

to pelo Estadão no fim de abril
mostrou que ao menos 269 de-
putados eram a favor de encami-
nhar parte do dinheiro destina-
do às campanhas para o comba-
te ao vírus. Onze projetos de lei
sobre o assunto foram apresen-
tados, e sua aprovação depen-
dia de maioria simples. Essas
propostas, no entanto, não pros-
peraram na Câmara.

Parcelas. Ao todo, serão distri-
buídos R$ 2,034 bilhões para fi-
nanciar as campanhas políti-
cas. Todos os 33 partidos for-
malmente registrados no TSE
terão direito a alguma parcela
do Fundo Eleitoral. A menor se-
rá de R$ 1.233.305,95, para o Uni-
dade Popular (UP), sigla que foi
aprovada pela Justiça Eleitoral
em dezembro de 2019.
Depois do PT e do PSL, o par-
tido terá mais recursos para a
campanha será o PSD, com R$
157,2 milhões. Na sequência,
aparecem o MDB e o PP, com,
respectivamente, R$ 154,9 mi-
lhões e R$ 140,2 milhões.
Os valores serão transferidos
para os diretórios nacionais
após as legendas informarem
os critérios de distribuição, con-
forme previsto em lei. Ao Novo
ficaram reservados R$ 36,6 mi-
lhões, mas o partido decidiu re-
nunciar às verbas. Assim, os re-
cursos deverão voltar ao Tesou-

ro no momento da apresenta-
ção da prestação de contas.
Criado em 2017 pelo Congres-
so como alternativa à proibição
do financiamento eleitoral por
empresas, determinada pelo Su-
premo Tribunal Federal (STF),
o fundo contou com R$ 1,7 bi-
lhão nas disputas de 2018.
O montante destinado para
este ano foi definido pelo Con-
gresso no fim de 2019 e provo-
cou polêmica. Em dezembro, o
elaborar o projeto de Lei Orça-
mentária Anual (LOA), o depu-
tado Domingos Neto (PSD-
CE), destinou R$ 3,8 bilhões de
recursos públicos para finan-
ciar as campanhas. O presiden-
te Jair Bolsonaro declarou pu-
blicamente que não sanciona-
ria a lei com este valor e, após
articulação do governo, a verba
foi reduzida para R$ 2 bilhões.
O presidente chegou a fazer
uma enquete em suas redes so-
ciais sobre se deveria aprovar a
lei, mas acabou sancionando o
valor em 2 de janeiro.
O Fundo Eleitoral é diferente
do Fundo Partidário, que existe
desde 1995 e é usado para que as
siglas possam pagar as despesas
diárias, como aluguéis, contas
de luz e de água e salários de
funcionários. Além de dinheiro
público, o fundo partidário é
constituído por multas pagas
por legendas e doações.

Movimentos ligados a torcidas querem evitar políticos


Vice da PGE


defende eleição


em outubro


GABRIELA BILO/ ESTADAO

O processo


lRecursos

TABA BENEDICTO/ESTADAO-7/6/

Apesar de intenção,


Boulos discursou domingo


passado; organizadores


planejam ato contra


governo na Paulista


São Paulo. Manifestantes em ato contra governo, domingo

Rodrigo Sampaio
ESPECIAL PARA O ESTADO

O vice-procurador-geral eleito-
ral, Renato Brill de Góes, defen-
deu ontem a manutenção das
datas das eleições municipais
de 2020, apesar da pandemia do
novo coronavírus. A informa-
ção consta em um ofício envia-
do aos presidentes da Câmara
dos Deputados, Rodrigo Maia
(DEM-RJ), e do Senado, Davi Al-
columbre (DEM-AP, que sus-
tenta a tese da adoção de proto-
colos de segurança associada à
possível queda do número de ca-
sos da doença – apoiada por es-
tudos estatísticos –, permitin-
do que as votações ocorram nos
dias 4 e 25 de outubro, de acor-
do com o calendário da Justiça
Eleitoral.
No documento, Brill de Góes
também alega a impossibilida-
de da prorrogação dos manda-
tos em curso, e afirma que caso
seja “inevitável a modificação
das datas”, o adiamento não ul-
trapasse 30 dias. Neste caso, a
sugestão do Ministério Público
Eleitoral (MPE) é para que os
pleitos sejam transferidos para
25 de outubro (1º turno) e 15 de
novembro (2º turno).
Em dia 25 de maio, ele apre-
sentou uma petição ao Tribunal
Superior Eleitoral (TSE) em
que listou “elementos que con-
sidera de indiscutível relevân-
cia ao debate sobre a alteração
ou não das datas do pleito”,
mencionando que o assunto foi
tema recente de reunião entre
Maia e Alcolumbre. Uma cópia
do pedido, ainda em análise,
também foi enviada aos presi-
dentes da Câmara e do Senado.
Com relação à pandemia, o vi-
ce-PGE afirma ainda, no ofício,
que o MPE se baseia em estudos
matemáticos preditivos, sendo
um deles realizado pela Univer-
sidade Federal do Rio de Janei-
ro (UFRJ), em parceria com a
Universidade de Bordeaux, na
França. Segundo a pesquisa, os
números de registros da covid-
19 devem se estabilizar no fim
de julho, o que reforçaria a tese
de que não haveria necessidade
de adiamento das eleições.

33
partidos registrados no TSE têm
direito ao fundo eleitoral.

R$ 2 bi
é o valor total do fundo eleitoral.

R$ 200,9 mi
é o valor – a maior fatia – que
será destinado ao PT.

R$ 193,7 mi
receberá o PSL, a 2ª maior cota.

PT e PSL terão


quase R$ 400 mi


de fundo eleitoral


Divisão é feita com base em votos da eleição passada; proposta de


usar verba de quase R$ 2 bilhões para coronavírus não prosperou


Ministro


e Maia
falam

de covid
O ministro inte-
rino da Saúde,
general Eduar-
do Pazuello,
participou on-
tem de reunião
da Comissão
Externa de
Ações contra o
Coronavírus na
Câmara, ao
lado do presi-
dente da Casa,
Rodrigo Maia.
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