CULTURA
4
Um outroBrooklyn reafirmaJacquelineWoodsoncomo escritoracuja linguagem vaialém
do públic ojovem que aconsagrou, além de retratar comrealismoouniverso dos negros
❚LITERATURA
JacquelineWoodson
escrevesobreolutoe
ador da perda a
partir da personagem
que retorna paracasa
paraoenterrodopai
CARLOS DIAZ/DIVULGAÇÃO
Aatriz KennedyMcCann protagonizaoseriadoNancyDrew,emcartaz no Globoplay
AescritoraamericanaJacqueline
Woodsonjá haviapublicadomais de 30
livrosparajovensleitoreseganhadová-
riosprêmios(comdestaqueparaMe-
morialAstrid Lindgren,de2018)quan-
domudouorumoparaumaescrita
mais adulta.Primeiro,comoimpactan-
teUm outroBrooklyn,lançadoem 2016
equeagorachegaaoBrasil,pelaedito-
ra Todavia.Depois,comRed at the bone,
quetambémganharáumaediçãoem
português,em2021.
Independentemente dafaixaetária
deseuleitor-alvo,Jacquelinemantéma
coerência,poistodosseuslivroscolo-
camcriançaseadolescentesnegrosno
centrodatrama–semcondescendên-
cia, masposicionadosemsituaçõesrea-
listasecomprofundacompreensãoda
psiquedeseuspersonagens.Outra
constante éofascíniopeloBrooklyn,
bairrodeNovaYorkondefoimorarnos
anos1970.ElacresceuemBushwick, re-
giãoque,naépoca,eraocupadaprinci-
palmente pornegroselatinos.
Opassardotempo,porém,foidolo-
rido.“Oquarteirãoemquecresciagora
épredominantemente branco”,afirma
aautora,que,nãoàtoa,nadedicatória
deUm outroBrooklynanotou:“Para
Bushwick(1970-90).Emmemória”.
Discretolamento peladescaracteri-
zaçãodaregião,valorizadapelachega-
dadegrandesinvestimentosque“es-
branquiçaram”obairro,aponto deJac-
quelineterdificuldadeemalugar um
apartamentonosanos 1990 –ospro-
prietáriosevitavamfazernegócioscom
estranhos,mãessolteirasenegros.
Essainvisibilidadesocialestápre-
sente emseusromances,queJacqueli-
neWoodsonutilizacomoumaforma
debuscaporsi mesma. Nolivro,Augus-
ta éumaantropólogaquevolta paraca-
sa paraoenterrodopai–suapesquisa
acadêmicafocajustamente nosrituais
funeráriosdeváriasculturas,umafor-
madedesvendaromistério doluto ea
dordaperda.
AoreencontrarSylvia, amigadelon-
gadata,Augustavoltaaosanos1970,
quando chegou ainda meninaao
Brooklyn,umlugarondegarotascomo
elapodiamsonhar comumfuturoaco-
lhedor.Nestaentrevista,Jacqueline
Woodsonfaladeseulivro.
Comomuitoator ouatrizaspirante,
KennedyMcCannestavalutandopara
sobreviver,usandoaindaas roupasde
quandoeraadolescente,trabalhando
comobabádurante atardeefazendo
testespelamanhã–muitasvezes,as
criançasaajudavamapraticaros diálo-
gos,queelatambémdecoravanome-
trô.“Éumestilonormal devidapara
umajovemartista”, explicouMcCann.
Maseladeusorte.Recém-formada
naprestigiadaUniversidadeCarnegie
Mellon,naPensilvânia,caiuemsuas
mãosoroteirodeNancyDrew,versão
modernizadadeumaclássicacoleção
delivrosamericanaqueexistedesdeos
anos 1930 sobreumainvestigadorade
mistérios.Eela conseguiuopapelprin-
cipal na série, produzida porJosh
SchwartzeStephanieSavage(Gossip
Girl)equechegouaoserviçodestrea-
mingGloboplay, depoisdeboarecep-
çãonosEUA.
OUSADIAComomuitasmulheresque
leramoslivrossobreadetetiveadoles-
cente àprocuradeverdade,McCann,fi-
lhadeumaescritoradelivrosparajo-
vensadultos,tambémerafã deNancy
Drew. “Elameinfluencioumuito”,diz a
atriz, de 23 anos.“Elameensinouaser
ousada,apaixonadaequedefendero
queécertosemprevale apena, quais-
quersejamas consequências.”Aatriz
descreveasériecomo“misteriosae
cheiadesuspense,tocante eromântica,
brincalhonaeleveeumpouquinho
aterrorizante”.
ANancyDrewnaproduçãoéuma
jovemqueestáemluto–acaboude
SÉRIE
À caça de mistérios
CBS/DIVULGAÇÃO
perderamãe–etevedeabandonar o
sonhodedeixarapequenaHorseshoe
Bayeirparaauniversidade.Suarela-
çãocomopai,Carson(ScottWolf), é
cheiadeconflitos.Nopassado,ela era
famosaporinvestigar mistérios,mas
deixouissodelado,até virarsuspeita
doassassinatodeTiffanyHudson(Si-
neadCurry),dafamíliamais rica dolo-
cal,junto comseuscolegas detrabalho
norestaurante,alémdoseuficante,
Ned(Tunji Kasim).
Você éumdaquelesautores rarosque
escreveparatodas as faixas etárias.Co-
moequandovocêdecideparaqualfaixa
etáriaestá escrevendo?
Oslivrosmeescolhem.Nuncadecidi
escreverparaumpúblicoemparticu-
lare, àsvezes,nemfaçoideiadequal
seráopúblico-alvoatéoprocessode
escritaavançarbastante.Oslivros
ilustradosparecemmais comopoe-
masparamim.Aficçãoadulta permi-
te queoleitormeencontrenomeio
docaminhocomsuasprópriasexpe-
riênciasealiteraturajuvenilmeper-
mitepensarebrincar.Normalmente,
estoutrabalhandoemmais deumgê-
neroacadavez.
QuãobiográficoéUmoutro Brooklyn?
Qual opapel da experiênciapessoalem
termosde inspiração?
Sempredigoquemeuslivrossãomais
psicologicamente autobiográficosdo
quepelosfatosemsi. Todaemoçãoque
meuspersonagenssenteméamesma
quesenti emalgummomento.Muito
domeupassadoressoacomigo–tanto
osmomentosbonscomoosruins.En-
tão,éissoquetragoparaanarrativa.Ob-
viamente, existemelementosqueestão
diretamente foradaexperiência física–
NaçãodoIslã(grupopolíticoereligioso
surgidonosEUAnosanos 1930 eque
pregavaaconscientizaçãodapopulação
afro-americana),Bushwick,terboas
amigas.Masamaioria dasexperiências
dolivroUm outroBrooklynéimagina-
dae/ouinspiradapelomundoqueme
rodeia.
Porque oromancesechamaUm outro
Brooklyn?Quero dizer, existe um pri-
meiroBrooklyn?
InspiradoporTerraestranha,deJa-
mesBaldwin,eBrooklyn,deColm
Toíbín,oromancese propõeacontar
umahistória diferente sobreumlu-
garqueaspessoassentemqueco-
nhecem.Tambémrepresentaaper-
cepçãodepessoasquedesejamen-
contrarumasaída.
No início ,Augustadiz: “Agora sei que
trágiconãoéomomento.Éamemória”.
Existe uma trama paraatragédiaque
nãoestácompletaatéqueatragédiase-
ja repetidana memóriaeentendidaco-
mo uma?
Boapergunta.Nãoseise possofalarde-
finitivamente sobrecomoamemória e
aexperiência funcionamjuntaspara
todos.Paramim,comoescritora,anar-
rativa ésempresobreolhar algoprofun-
daefrequentemente,olharparatrás
emrelaçãoaalgo.
Você se vê como uma escritorapolítica
ou sente que os escritores sãoc riaturas
inevitavelmente políticas?
Souumaescritoraqueépolítica.Eu
nemsempreconcordocomosqualifi-
cadoresapareceremantesdaarte.
Qual aimportânciada perspectivado
narrador?Existeconexãoe ntre perspec-
tivaeverdade?
Augustaéumnarradornãoconfiável.
Euachoqueissoéimportante paraessa
história emparticularporcausadetu-
dooqueacontecenela.Porém,nãopos-
sofalarportodososnarradoresdeto-
dasas histórias.
Redatthe bonecontém referênciasadi-
ferentestiposeépocasdemúsica. Como
éouso da músicano livroeaforça de
conexãoq ue ela representa?
Amúsicatemumpapelimportante em
todososmeuslivros.Ouçoenquanto
escrevoeamúsicaqueescuto tendea
coincidircomoperíodoemqueescre-
vo.Comoolivro abrangeumaextensão
detempotãolonga, euqueria quea
músicafosserepresentada.Então,você
temdetudo,desdejazzebluesatéo
hip-hopcontemporâneo,entrelaçado
nanarrativa.(EstadãoConteúdo)
UM OUTRO BROOKLYN
●De JacquelineWoodson
●EditoraTodavia
●122 páginas
●R$ 49,90eR$34,50(e-book)
Oenigmaenvolveelementossobre-
naturais,comoofantasmadeLucy,
umaadolescente morta 19 anosatrás.
Cadapersonagemtemseupróprio se-
gredoaser desvendado–omaiordeles
envolveNancy.“Elaétãofocadanoex-
terior,obcecadaementenderas pessoas
àsuavolta”,diz McCann.Umgrandese-
gredosobreelamudaráavidadeNan-
cy eaforça aolhar paradentro.
Acombinaçãodemistérios,persona-
gensquenãosãooqueparecemero-
mancesadolescentesgeraramcompa-
raçõesaRiverdale,exibidanomesmo
canal nosEUA. “Hásemelhançasestéti-
cas,masNancyDrewestáemseupró-
prio universo.Ospersonagenssãomais
velhos,eatramaéfundadaemrelacio-
namentoseexperiênciasreais”,diz a
atriz, comrazão,poisNancyDrewtem
possibilidadedeagradaraopúblico
“menosteen”.Aprimeiratemporadate-
ria22episódios,masfoi interrompida
pela novapandemiaeacaboucom18.
EstadãoConteúdo)
AINDA
MAIS
MADURA
“Inspirada pelo mundo que me rodeia”
TODAVIA/REPRODUÇÃO