O Estado de São Paulo (2020-06-19)

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O ESTADO DE S. PAULO SEXTA-FEIRA, 19 DE JUNHO DE 2020 A


Decisões judiciais estão dando
respaldo ao governo de São Pau-
lo na retomada gradual das ativi-
dades econômicas durante a
pandemia. Desde o início de
abril, prefeituras paulistas en-
traram com 35 ações para obter
flexibilidade nas regras. Até on-
tem, 28 processos (80%) ti-
nham despachos, liminares ou
decisões definitivas favoráveis
às regras previstas em decretos
estaduais, impedindo municí-


pios de relaxar o isolamento.
Cinco ações julgadas a favor das
prefeituras tinham recursos
pendentes. Dois processos não
tinham decisões, segundo le-
vantamento do Estadão.
A maioria dos processos foi
iniciada pelo Ministério Públi-
co de São Paulo, após prefeitu-
ras adotarem por conta própria
medidas menos restritivas que
as decretadas pelo Estado. Em
ações mais recentes, o alvo dos
prefeitos foi o Plano São Paulo,
do governo estadual, que esta-
belece fases para a reabertura
do comércio, sendo a 1 (verme-
lha) mais rigorosa, evoluindo
para a 2 (laranja) e 3 (amarela).
Ontem, o Tribunal de Justiça
de São Paulo (TJ-SP) indeferiu

pedido da prefeitura de Olím-
pia para retornar à fase 3. A cida-
de fica na região de Barretos, re-
baixada para a fase 1. O desem-
bargador Francisco Antonio
Casconi alegou que um novo en-
quadramento exporia morado-
res a dano irreparável. A prefei-
tura estuda recurso.
Na quarta-feira, o TJ negou
pedido da prefeitura de Botuca-
tu para evoluir à faixa amarela –
a cidade está na laranja. O muni-
cípio alegou ter índices de coro-
navírus e indicadores de saúde
melhores do que outras cida-
des, não sendo justo que “tenha
sua população penalizada por
outros municípios da região
que têm condição diferente”. A
prefeitura estuda recurso.
Em Penápolis, a prefeitura
acatou decisão do TJ e publicou
decreto ontem suspendendo o
funcionamento de bares, res-
taurantes, salões de beleza e bar-
bearias, autorizados a abrir du-
rante seis horas diárias. O TJ
também cassou liminar que per-
mitia o funcionamento de bar-
bearias e salões de beleza em

São José do Rio Preto.
A prefeitura de Santos, no lito-
ral paulista, teve de se adequar à
fase laranja, após liminar da Jus-
tiça em ação do MP questionan-
do a reabertura de comércio e
serviços por 6 horas diárias,
além do funcionamento de
salões de beleza, barbearias e
clínicas de estética. Praia Gran-
de e Guarujá também foram al-
vo de ações para se enquadra-
rem nas regras estaduais.
De acordo com o procurador-
geral de Justiça, Mário Sarrub-
bo, a atuação do MP-SP tem si-
do no sentido de derrubar a vali-
dade de decretos municipais
que flexibilizam a quarentena
para além dos limites estabeleci-
dos na norma estadual. Segun-
do ele, o papel dos municípios é
suplementar nessa matéria, co-
mo definiu o Supremo Tribunal
Federal. As cidades, portanto,
podem definir regras ainda
mais restritivas do que o Esta-
do, mas não podem fazer o con-
trário. “A Justiça tem entendi-
do que, em relação a temas liga-
dos à saúde e ao funcionamen-

to, de forma ampla, das ativida-
des econômicas face à pande-
mia, as prerrogativas do Estado
prevalecem em relação ao muni-
cípio”, diz o professor Acacio
Miranda da Silva Filho, especia-
lista em direito constitucional.

MG e RS. Em outras regiões do
País, também há queda de bra-
ço entre prefeituras e Estado
em relação à quarentena. Em
Minas Gerais, por exemplo, há
descompasso entre o plano de
retomada estadual, o Minas
Consciente, e ações das prefei-
turas. O Estado tem registrado
alta de casos e o governador Ro-
meu Zema (Novo) já prevê “es-
trangulamento” do sistema de

saúde. O secretário-geral do go-
verno mineiro, Mateus Simões,
reclamou do que chamou de
ações “divorciadas” de Belo Ho-
rizonte, que reabriu salões de
beleza na primeira fase, enquan-
to o plano estadual prevê o fun-
cionamento desses estabeleci-
mentos só na segunda onda de
reabertura. Para o governo mu-
nicipal, porém, o aumento de ca-
sos não tem relação com a não
adesão ao Minas Consciente.
No Rio Grande do Sul, muni-
cípios também resistem em en-
durecer medidas de flexibiliza-
ção da quarentena. Em Vacaria,
por exemplo, onde foi determi-
nado o fechamento do comér-
cio, o prefeito Amadeu Boeira
(PSDB), permaneceu com as fle-
xibilizações e acionou a Justiça
para tentar manter o funciona-
mento do varejo. “Por mais que
o governador seja do mesmo
partido que o meu, ele errou.” O
governador Eduardo Leite
(PSDB) informou que o Execu-
tivo vai abrir prazo para even-
tuais questionamentos. /J.M.T.,
LEONARDO AUGUSTO e LUCAS RIVAS

José Maria Tomazela
SOROCABA


A taxa de ocupação dos leitos
hospitalares por pacientes
com o novo coronavírus atin-
ge níveis preocupantes no in-
terior de São Paulo. Alguns
hospitais de referência no tra-
tamento da doença estão lota-
dos e estão sendo obrigados a
recusar novas internações. E
prefeitos já cogitam transfe-
rir pacientes para a capital.

Conforme a Secretaria da Saú-
de, a média de ocupação dos lei-
tos de UTI no Estado atingiu
70,6% ontem, mas há sobrecar-
gas pontuais que estão sendo
atendidas com a abertura de no-
vos leitos. Algumas das maiores
cidades do interior, como Cam-
pinas, Sorocaba, Ribeirão Preto
e São José do Rio Preto, estão
com lotação de leitos da covid-
19 acima da média – em alguns
casos com 100% de lotação.
Em Campinas, a rede munici-
pal que atende o Sistema Único
de Saúde (SUS) estava com os
120 leitos destinados a pacien-
tes da covid-19 totalmente ocu-
pados. Em toda a rede pública e


privada, a taxa de ocupação dos
leitos de UTI exclusivos para a
doença chegou a 87%, o porcen-
tual mais alto até agora. Dos 328
leitos, 284 tinham pacientes,
mas a maior parte dos leitos de-
socupados estava na rede parti-
cular. No SUS estadual, que in-
clui o Ambulatório Médico de
Especialidades e o Hospital das
Clínicas da Universidade Esta-
dual de Campinas (Unicamp),
50 dos 57 leitos estavam ocupa-
dos – taxa de 88%. Na rede priva-
da, a ocupação era de 77%.
Diante desse cenário, o prefei-
to de Campinas, Jonas Donizet-
te (PSB), não descarta transfe-
rir doentes para a capital ou ci-
dades da região, se não houver
alívio na pressão sobre a rede
hospitalar local. “Quero lem-
brar que, quando São Paulo esta-
va no sufoco, nós recebemos pa-
cientes de lá. Estamos conver-
sando, mas há uma situação lo-
gística a ser considerada. Se
houver necessidade, o que ain-
da não aconteceu, preferimos
transferir para cidades de mé-
dio porte da nossa própria re-
gião metropolitana, que recebe-
ram respiradores do Estado.

Ainda não estamos fazendo,
mas não é descartado”, disse.
A prefeitura de Campinas in-
formou que, desde ontem, a
Unidade de Pronto Atendimen-
to (UPA) Carlos Lourenço pas-
sou a ser exclusiva para interna-
ção de pacientes com a covid-


  1. A unidade terá 28 leitos, sen-
    do três para estabilização de pa-
    cientes que precisam ser trans-
    feridos para UTI.
    Ao anunciar um novo recorde
    de mortes em um dia, nesta quar-
    ta – mais 21 mortes, elevando o
    total para 185, além de 334 novos
    casos – o secretário de Saúde de
    Campinas, Cármino de Souza,
    disse que a situação é grave. “Es-
    tamos vivendo o pior momento


da epidemia e o que nós pode-
mos fazer é dar a melhor estrutu-
ra, a melhor atenção aos pacien-
tes. Só temos uma arma eficien-
te neste momento: isolamento
social”, disse.

Avanço. Em Sorocaba, a taxa
de ocupação de leitos de UTI
para a covid-19 nos três hospi-
tais públicos subiu de 70% no
dia 1.º de junho para 95% nesta
quarta-feira, quando foram con-
firmados 219 casos de coronaví-
rus. A Santa Casa, com maior
número de leitos de tratamento
intensivo na rede municipal, es-
tava com lotação total. De acor-
do com o administrador, padre
Flávio Miguel Junior, houve um
crescimento acentuado nas in-
ternações de pacientes com o
vírus nos últimos dias. “Esta-
mos conseguindo controlar,
mas estamos no limite”, disse.
O Conjunto Hospitalar de So-
rocaba, com dez leitos, tinha
100% de ocupação. No Hospital
Regional Adib Jatene, o índice
era de 90%. Na cidade, desde o
início de junho, a ocupação dos
leitos de enfermaria subiu de
59% para 64%. O número de pes-

soas internadas com covid-
ou suspeita subiu de 62 para
149, incluindo a rede privada.
Em São José do Rio Preto,
com 142 casos positivos nas últi-
mas 24 horas – recorde de infec-
tados em um único dia –, a pres-
são sobre a rede hospitalar tam-
bém aumentou. Segundo a pre-
feitura, 178 pessoas estavam in-
ternadas anteontem com sín-
drome respiratória grave, sen-
do 70 em UTI. “No meio de
maio, tínhamos 277 casos notifi-
cados de síndrome gripal leve
por dia e agora, do dia 6 de ju-
nho para cá, tivemos aumento,
com um pico de 617 notifica-
ções em um dia. As pessoas es-
tão procurando o serviço de saú-
de com sintomas”, afirmou a ge-
rente da vigilância epidemioló-
gica Andréia Negri.
Em Ribeirão Preto, a taxa de
ocupação de leitos de UTI que
era de 85% caiu para 79% após a
chegada de 32 respiradores, mas
ainda está acima da média esta-
dual. Os equipamentos chega-
ram na segunda-feira, com escol-
ta policial. O prefeito Duarte No-
gueira (PSDB) disse que os respi-
radores permitiram ampliar o

número de leitos para tratamen-
to exclusivo de pacientes com
covid-19 na cidade. “Saímos de
121 leitos para 131 e chegaremos
a 154 apenas em Ribeirão Preto.”
A Santa Casa de Sorocaba in-
formou ter recebido dez respira-
dores e está em diálogo com a
prefeitura para ampliar os lei-
tos de UTI. A direção do Conjun-
to Hospitalar informou que
mais dez leitos devem entrar
em operação este mês.

Estado. O secretário estadual
de Saúde, José Henrique Ger-
mann, disse que o governo esta-
dual já distribuiu cerca de 2,
mil respiradores para ampliar a
oferta de leitos para pacientes
graves da covid-19 no Estado.
Outros 350 equipamentos es-
tão para chegar e serão distribuí-
dos às regiões que ainda preci-
sam de suporte. O secretário de
Desenvolvimento Regional,
Marco Vinholi, que representa
o Conselho Municipalista no co-
mitê de operações de emergên-
cia do coronavírus, foi na mes-
ma linha. “Vamos manter todas
as regiões com capacidade hos-
pitalar”, ressaltou.

PANDEMIA DO CORONAVÍRUS


l Interpretação

Lotados, hospitais no interior paulista


recusam novas internações por covid


l Mortes no Estado

Algumas das maiores cidades do Estado de São Paulo, como Campinas, Sorocaba, Ribeirão Preto e São José do Rio Preto, estão com a


ocupação de leitos acima da média – em alguns casos já não há vagas. E prefeitos cogitam até mesmo enviar pacientes para a capital


País tem 1.204 mortes e falha cria subnotificação. Pág. A16 }


80% das decisões são


contrárias à reabertura


nos municípios paulistas;
RS e MG também têm


queda de braço


“A Justiça tem entendido
que as prerrogativas do
Estado prevalecem em
relação ao município.”
Acacio Miranda da Silva Filho
ESPECIALISTA EM DIREITO
CONSTITUCIONAL

Brigas na Justiça para


relaxar quarentena


dão vitória ao Estado


WAGNER SOUZA/FUTURA PRESS–17/6/

325
mortes foram registradas em SP
nas últimas 24 horas por covid. O
total chega a 11.846.

18 mil
mortes é a estimativa do Estado.

Rua 13 de Maio, em Campinas. Sinalização foi feita em calçadão para evitar aglomerações; de 328 leitos, 284 têm pacientes, mas a maior parte dos desocupados está na rede particular


Metrópole

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