O Estado de São Paulo (2020-06-19)

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A16 Metrópole SEXTA-FEIRA, 19 DE JUNHO DE 2020 O ESTADO DE S. PAULO


Em defesa da democracia e sustentabilidade


GENEBRA


A Organização Mundial da Saú-
de (OMS) espera que centenas
de milhões de doses de uma va-
cina contra o novo coronavírus
possam ser produzidas ainda
neste ano e outros 2 bilhões de
doses até o fim do ano que vem,
afirmou ontem a cientista-che-
fe da organização, Soumya Swa-
minathan.
A OMS elabora um planos pa-
ra ajudar a decidir quem deve-
ria receber as primeiras doses
quando uma vacina for aprova-
da, afirmou a cientista. A priori-
dade seria dada a profissionais
da linha de frente, como médi-
cos, pessoas vulneráveis por
causa da idade ou outra doença
e a quem trabalha ou mora em
locais de alta transmissão, co-
mo prisões e casas de repouso.
“Estou esperançosa, estou oti-
mista. Mas o desenvolvimento


de vacinas é uma empreitada
complexa, envolve muita incer-
teza”, disse ela. “O bom é que
temos muitas vacinas e platafor-
mas, então, se a primeira fracas-
sar ou se a segunda fracassar,
não deveríamos perder a espe-
rança, não deveríamos desistir.”
Cerca de dez imunizantes em
potencial estão sendo testados
em humanos, na esperança de
que um possa se tornar disponí-
vel nos próximos meses para
prevenir a infecção da covid-19.
Países já começaram a fazer
acordo com empresas farma-
cêuticas para encomendar do-
ses antes mesmo de se provar
que alguma funciona. Soumya
descreveu o desejo por milhões
de doses de uma vacina ainda
neste ano como otimista, acres-
centando que a esperança de
até 2 bilhões de doses de até três
vacinas diferentes no ano que
vem é um “grande se”.

Sem mutação. A cientista afir-
mou que os dados de análise ge-
nética coletados até agora mos-
traram que o novo coronavírus
ainda não passou por nenhuma
mutação que alteraria a gravida-
de da doença que causa.
A Agência Europeia de Medi-
camentos estimou em maio,
sendo “otimista”, que uma vaci-
na poderia estar pronta em um
ano. No mesmo período, a OMS
ainda falava em 18 meses.
Mas muitos países já espe-
ram desenvolvimentos até o
fim do ano, até para evitar uma

segunda onda da epidemia com
a chegada do inverno no Hemis-
fério Norte. Assim, os Estados
Unidos esperam distribuir 300
milhões de doses em janeiro de
2021, por meio de projetos de
financiamento a laboratórios.
No caso, a intenção também é
dar prioridade a idosos, cida-
dãos com histórico médico e tra-
balhadores essenciais.
Na China, a empresa farma-
cêutica estatal Sinopharm, que
atualmente prepara duas vaci-
nas em potencial, espera lançá-
las no mercado até o início de


  1. Na Europa, onde vários
    projetos estão em andamento,
    esses prazos também estão em
    queda. Alemanha, França, Itália
    e Holanda assinaram um acor-
    do com a AstraZeneca para for-
    necer à UE 300 milhões de do-
    ses. Grupos farmacêuticos repe-
    tem que as vacinas serão vendi-
    das a um preço acessível, e mes-
    mo a preço de custo. A AstraZe-
    neca prometeu “não lucrar na-
    da”, segundo o presidente Oli-
    vier Nataf, que estima um preço
    de 2 euros (US$ 2,24 ) por dose. /
    COM AGÊNCIAS INTERNACIONAIS


Érika Motoda
Paulo Favero


O Brasil registrou pelo tercei-
ro dia consecutivo mais de
mil mortes por covid-19. Fo-
ram 1.204 em 24 horas, segun-
do levantamento feito por
Es-
tadão , G1, O Globo, Extra, Fo-
lha
e UOL. Já as secretarias es-
taduais de Saúde relataram
dificuldades para atualizar


dados na plataforma online
do Ministério da Saúde, o e-
SUS. A falha agrava a subnoti-
ficação. Para o ministério, po-
de haver erro na forma de
abastecimento de dados.
Apesar disso, o número de ca-
sos confirmados da doença no
País saltou de 960.309 para
983.359 entre anteontem e on-
tem – foram 23.050 novos regis-
tros em 24 horas. O total de vi-

das perdidas chega a 47.869,
conforme o levantamento dos
veículos de imprensa, iniciado
após o governo Bolsonaro falar
em rever a forma de divulgação.
Se na terça-feira a pasta con-
firmou 34.918 casos e na quarta
o número caiu para 32.188, on-
tem a média foi menor ainda,
com 22.675 novas confirma-
ções. O que poderia levar a crer
que a curva estaria diminuindo

no Brasil, ou a quantidade de
testes seria menor. Na realida-
de era um problema de sistema
e não diminuição de casos.
O e-SUS e o Sistema de Infor-
mação de Vigilância (Sivep) são
plataformas online utilizadas
pelos serviços de saúde e gesto-
res das três esferas do Executi-
vo. De acordo com o protocolo
do Ministério da Saúde, a priori-
dade é notificar, investigar e
confirmar os casos de Síndro-
me Respiratória Aguda (SRAG)
que derem entrada no hospital.
Após receber o resultado positi-
vo dos laboratórios, o serviço
que atendeu o paciente deve
atualizar a notificação – pode fa-
zer diretamente nos sistemas
oficiais –, comunicando tam-
bém o caso confirmado ou des-
cartado à prefeitura, que é a res-
ponsável por abastecer o siste-
ma oficial do ministério.
Ontem, o secretário estadual
da Saúde de São Paulo, José
Henrique Germann, disse que
está há dois dias sem conseguir
atualizar os dados na platafor-
ma do e-SUS – por isso, só rela-
tou 1.111 registros em 24 horas.
Na terça-feira, chegou a relatar

8,8 mil casos. A Secretaria de Es-
tado de Saúde do Rio disse que
teve de usar outro programa, o
Sivep-Gripe, mas que atualiza-
ria os dados no e-SUS quando
possível. A lentidão e a instabili-
dade levaram o Pará a elaborar
sistema próprio. “Apesar das di-
ficuldades, a secretaria tem
orientado os gestores munici-
pais a fazerem a devida alimen-
tação e, inclusive, montou uma
força-tarefa para atualizar os da-
dos no e-SUS durante a noite.”
A Secretaria de Saúde da Ba-
hia também relatou dificuldade
de acessar as bases do e-SUS.
“Recentemente é quase uma
constante o problema”, afir-
mou a Secretaria de Saúde do
Piauí. A Secretaria de do Rio
Grande do Norte disse que,
diante do problema, a estraté-

gia adotada foi focar nos resulta-
dos de RT-PCR (teste rápido)
liberados pelo Laboratório Cen-
tral de Saúde Pública (Lacen).
“Ou seja, a partir dos dados do
dia anterior, são acrescentados
os resultados liberados no dia.”
Secretarias de saúde de ou-
tros Estados também relata-
ram o problema, como a do Dis-
trito Federal, que não conse-
guiu baixar o banco para atuali-
zação de dados, apesar de ver
“melhora”. Já a do Amazonas
comentou que a inserção das in-
formações referentes à covid-
19 se encontrava normalizada.
O ministério disse não haver
falhas e destacou que há duas
formas de exportar dados do e-
SUS: diretamente do aplicativo
ou por meio de uma aplicação.
“Este último utiliza tecnologia
mais leve e é indicado para gran-
des volumes de dados, caso de
secretarias estaduais e grandes
municípios. Ocorre que algu-
mas unidades da Federação uti-
lizaram o aplicativo para expor-
tação de dados, o que não é reco-
mendado.” / COLABORARAM
PALOMA COTES, SANDY OLIVEIRA,
MARINA ARAGÃO e JOÃO KER

V


ivemos inédito momento his-
tórico de aviltamento e amea-
ça à democracia consagrada
na Constituição de 1988 de parte do
próprio Poder Executivo por ela
constituído.
A omissão, indiferença e ação anti-
científica do governo federal trans-
formaram o desafio da covid-19 na
mais grave tragédia epidemiológica
da história recente do Brasil, causan-
do danos irreparáveis à vida e saúde
de milhões de brasileiros. A tragédia
seria ainda maior não fosse a ação de
Estados e municípios, apoiados por
Legislativo e Judiciário.
A sustentabilidade socioambien-
tal está sendo comprometida de for-
ma irreversível por aqueles que têm
o dever constitucional de garanti-la.

A destruição dos biomas brasileiros
avança em taxas aceleradas que não se
registravam há mais de uma década,
com aumentos expressivos de desma-
tamentos na Amazônia, no Cerrado e
na Mata Atlântica, enquanto os órgãos
ambientais e as normas federais são sis-
tematicamente desmantelados. Povos
indígenas, comunidades quilombolas
e populações tradicionais veem cres-
cer de modo exponencial as ameaças
aos seus territórios e às suas vidas.
A degradante reunião de 22 de abril
passado é o retrato fiel desse desgover-
no, com horas dedicadas a ofender e
desrespeitar de maneira abjeta os de-
mais poderes do Estado, sem uma pala-
vra de comando para o enfrentamento
da crise econômica ou superação da
crise “pandêmica”.
A única menção à pandemia, feita pe-
lo ministro do Meio Ambiente, não se
destinou a estabelecer conexões entre
a agenda da sustentabilidade e os desa-
fios na saúde e na economia, mas, ina-
creditavelmente, para se aproveitar do
sofrimento geral em favor dos nefan-
dos interesses que defende. Na oca-
sião, confessou de público o que pode

caracterizar crime de responsabilida-
de, por desvio de função e poder, ao
revelar o verdadeiro plano em execu-
ção por este governo que é “passar a
boiada” sobre a legislação socioam-
biental aproveitando o “momento de
tranquilidade no aspecto de cobertura
de imprensa, porque só fala de covid”.
Causa indignação e espanto que a pro-
posta não merecesse reprimenda em
nome do decoro, nem reparo dos pre-
sentes, em defesa da moral e da honra.
Responsáveis durante décadas pela
política ambiental desde a redemocrati-
zação do País, criamos este Fórum para
demonstrar que a polarização e radicali-
zação promovidas pelo governo po-
dem e devem ser respondidas com a
união e colaboração entre pessoas de
partidos e orientações diferentes fiéis
aos valores e princípios da Constitui-
ção. Como ex-ministros do Meio Am-
biente nossa responsabilidade específi-
ca se consubstancia na valorização e
preservação do meio ambiente e no de-
senvolvimento sustentável. Aprende-
mos, porém, pela dura experiência com
o atual governo, que quando a democra-
cia, a liberdade e a Constituição são

ameaçadas e/ou violentadas os primei-
ros valores sacrificados são os relativos
ao meio ambiente e direitos humanos.
Sem democracia forte, não haverá
sustentabilidade. Sem sustentabilida-
de, não haverá futuro para nenhum po-
vo. Diante do exposto, solicitamos:
Aos ministros do Supremo Tribunal
Federal que velem pelo cumprimento
efetivo dos princípios constitucionais
de preservação do meio ambiente eco-
logicamente equilibrado, bem de uso
comum do povo “essencial” à sadia qua-
lidade de vida assim como pela inde-
pendência entre os Poderes; aos mem-
bros do Congresso Nacional para que,
sob a coordenação dos presidentes da
Câmara dos Deputados e do Senado,
assegurem o controle dos excessos e
omissões do Poder Executivo Federal,
não permitindo a tramitação e aprova-
ção de projetos de lei e medidas provi-
sórias que fragilizem ou promovam re-
trocessos na legislação socioambien-
tal; aos governadores e prefeitos que,
diante da situação criada pela ausência
de liderança e ação prejudicial do presi-
dente da República, sigam firmes no
enfrentamento responsável da pande-

mia usando de todos os recursos dis-
poníveis, garantindo transparência
máxima na divulgação dos dados e
promovam políticas públicas de con-
servação ambiental e desenvolvi-
mento sustentável, bloqueando a es-
calada de destruição de nossos bio-
mas; e ao procurador-geral da Repú-
blica que adote medidas jurídicas ca-
bíveis de forma firme e tempestiva
para barrar iniciativas de estímulo à
degradação do meio ambiente, pro-
movidas pelo governo federal, as-
sim como cumpra o compromisso
constitucional de examinar com im-
parcialidade e presteza as denúncias
de crimes de responsabilidade po-
tencialmente cometidos pelo minis-
tro do Meio Ambiente de acordo
com representações protocoladas a
esta PGR durante a Semana do Meio
Ambiente.
Fazemos um apelo em favor de
uma urgente união nacional em de-
fesa da Constituição e da edificação
de um Brasil à altura das aspirações
do povo brasileiro por uma Nação
plenamente Democrática, Plural e
Sustentável. / CARLOS MINC, EDSON
DUARTE, GUSTAVO KRAUSE, JOSÉ CAR-
LOS CARVALHO, IZABELLA TEIXEIRA,
MARINA SILVA, RUBENS RICUPERO, SAR-
NEY FILHO E JOSÉ GOLDEMBERG

PANDEMIA DO CORONAVÍRUS


l Balanço do governo

lUm consórcio científico que
reúne especialistas de 43 países,
que havia iniciado em maio um
estudo sobre sintomas da covid-
19, anunciou ontem os primeiros
resultados, que comprovam que
a perda de olfato e do paladar

está associada, em maior ou me-
nor grau, à doença.
A iniciativa Global Consortium
of Chemosensory Researchers
(GCCR) considerou dados de
4.039 pesquisas traduzidas para
30 idiomas, realizadas em pacien-
tes ou pessoas que tiveram conta-
to com o novo coronavírus. Da-
dos iniciais da Universidade de
Mons, na Bélgica, já apontavam
para possibilidade de anosmia e
disgeusia em oito em cada dez.

978.142 casos
é o total registrado no Brasil, con-
forme balanço do Ministério da
Saúde (mais 22.765 relatos). No
período, foram 1.238 mortes.

País tem 1.


mortes e falha cria


subnotificação


Número de infecções tem queda, mas secretarias estaduais relatam


problema de sistema; ministério vê erro em abastecimento de dados


Carta aberta do Fórum de
ex-ministros do Meio
Ambiente pede a autoridades
compromisso com os
princípios constitucionais

Artigo


Estudo confirma elo


de covid e perda de


olfato e de paladar


NA WEB
Portal. Saiba
mais sobre
vacinas em estudo

estadao.com.br/e/vacinacovid
6

THOMAS ANGUS/REUTERS-10/6/

Meta é garantir milhões


de doses e prioridade


para profissionais de


saúde e pessoas mais


vulneráveis


OMS fala pela 1ª vez


em possibilidade de


vacina para este ano


Esperança. Cerca de dez imunizantes em potencial estão sendo testados em humanos; no Brasil, são 5 mil voluntários
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