O Estado de São Paulo (2020-06-19)

(Antfer) #1

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H8 Especial SEXTA-FEIRA, 19 DE JUNHO DE 2020 O ESTADO DE S. PAULO


Ignácio de Loyola Brandão


ESCREVE ÀS SEXTAS-FEIRAS

l]


PREMONIÇÃO, NÃO:


Caderno 2


Romance de 1981 de Dean Koontz viralizou na internet por falar


de vírus em Wuhan, mas autor nega qualquer similaridade


PESQUISA

C


aro Sidarta Ribeiro, nem ima-
gina como foi bom participar
de uma live com você. Há ins-
tantes em nossa vida em que, se esti-
vermos abertos, descobrimos que al-
go se passou e continuamos a viver
um pouco diferentes. Ao longo da vi-
da, criamos cracas, assim como as
antigas caravelas viviam cheias delas
agarradas ao casco e que diminuem a
velocidade na navegação. É preciso
limpeza de tempos em tempos. Vo-
cê, de cara, me conquistou ao contar
que meu romance Não Verás País Ne-
nhum te abalou aos 12 anos. Pronto,
me entreguei. Conversar contigo du-
rante hora e meia, na live promovida
pelo Fernando Quintino e pelo Da-
niel Brandão, meu filho, foi um up-
grade para mim.
Sabia quem você era quando me
convidaram, te vi no Roda Viva , um
dos melhores dos últimos anos. Mi-
nha falha foi ainda não ter lido seu

livro O Oráculo da Noite , mas já enco-
mendei. Mas veja que curioso. Tenho
83 anos e você 49. Portanto 34 anos nos
separam, o que é bastante nestes tem-
pos em que tudo gira em velocidade.
Durante nossa conversa deveria ter di-
to uma coisa, não disse. Mas teríamos
tido mais assunto. Quando você nas-
ceu em 1971 eu tinha 35 anos e começa-
va a preparar a edição brasileira da revis-
ta Planeta , cujos direitos Luis Carta ti-
nha comprado da França. A Planète foi
criação de Louis Pauwels e Jacques Ber-
gier, que criaram o realismo fantástico
em um livro que viralizou no mundo, O
Despertar dos Mágicos.
Do que se ocupava a revista? O poder
da mente dos povos primitivos, a trans-
missão pelo pensamento, a neurociên-
cia, o movimento do pensamento alquí-
mico, as civilizações desaparecidas, o
universo paralelo, o poder dos raios, os
extraterrestres, a existência das fadas,
alucinógenos, LSD, o poder da plantas,

xamãs, religiões orientais, as medicinas
alternativas, a mescalina, as portas da
percepção (Huxley), a expansão da
consciência, câmeras que fotografavam
o passado, a vida artificial, mistérios da
água. Durante sete anos editei a revista
que foi um assombro, porque tratava de
assuntos insólitos, alguns proibidos.
Lembre-se, era plena ditadura Médici.
Nunca me esqueço do artigo O Ho-
mem Vai Sobreviver? , de José Maria
Domènech, publicado em 1973, quando
você tinha 2 anos. Ele indagava: O ho-
mem vai conseguir chegar ao terceiro

milênio? Respondia que sim, com a ciên-
cia, a expansão dos microscópios e teles-
cópios cada vez mais potentes, a desco-
berta das chaves dos códigos genéticos,
as ondas sonoras nas frequências de hi-
perciclagem, as futuras descobertas
científicas e as tecnológicas trazidas pe-
las pesquisas cada vez mais amplas com
recursos colossais poderão mudar o pa-
norama. Quase 50 anos depois, as per-
guntas continuam a ser feitas. A live da

qual participamos ligou uma chave en-
tre passado e futuro para mim. E me fez
perguntar: e agora, Ignácio?
Este fui eu, Sidarta. E veja você. O
primeiro Sidarta – ou Buda – que me fez
a cabeça foi o do Herman Hesse. Éra-
mos muito jovens quando lemos Hes-
se, Sidarta , Demian , O Lobo da Estepe.
Depois, parece que fiquei meio parado,
quando devia ter continuado. Agora
nos encontramos e você me dá uma sa-
cudida semelhante à que tive quando
fiz Planeta e li Hesse, Krishnamurti, Bla-
vatsky e descobri planetas novos no co-
nhecimento. Aquela pergunta de 1973
na Planeta está sendo respondida. E o
meu descrédito no futuro do homem
me deixou constrangido. Pessimista
não sou. Mas tinha pouca fé. Também
lembro de uma frase de Curt-Meyer
Clason, meu tradutor para o alemão,
quando me dizia que o “pessimista é
um otimista com experiência”.
Passo rápido pela velha discussão
sobre acasos ou coincidências – ou co-
nectividades – sempre levantados.
Neste momento, terminei de escrever
um longuíssimo depoimento que me
fez refletir sobre nosso tempo e a vida
que levamos. É biografia de Hiroshi
Ushikusa, psicoterapeuta que foi ci-

rurgião gastro e descobriu que mais
eficaz do que o seu bisturi eram as
conversas e o entendimento de que
as doenças de seus pacientes não
eram físicas e, sim, estavam no ínti-
mo, na profundidade do espírito.
Hiroshi é o quê? Um espiritualista,
praticante da Mahikari.
Na pergunta de nossos âncoras no
final da live, você me alertou, ou ensi-
nou, que há novas ciências, novos pro-
cessos de pesquisas, novas mentalida-
des e possibilidades ao nosso alcan-
ce, com elementos tirados da nature-
za, destinados à expansão do conheci-
mento e da consciência. Uma ciência
natural que pode afastar o homem
dos caminhos a que ele está sendo
conduzido até agora, um tempo de
depressões, traumas, aflições, medo,
pesadelos, martírios. Ciências e técni-
cas que nos afastarão do torpor a que
estamos sendo conduzidos por dro-
gas sintéticas que nos escravizam,
anestesiam e nada resolvem. Sem fa-
lar dos sistemas políticos. Você me
deu um grito: acorde. Você vem dan-
do esse grito: acordemos todos.

PS: Você percebeu que nem um minu-
to, um segundo, falamos de política?

Ao longo da vida, criamos
cracas, assim como as antigas
caravelas viviam cheias delas

André Cáceres


Assim que a covid-19, doença
provocada pelo novo coronaví-
rus, começou a se alastrar pelo
mundo, no começo do ano, um
dos boatos mais curiosos que
tomaram as redes sociais e os
aplicativos de mensagem ins-
tantânea sobre a origem da
pandemia falava a respeito de
um suposto livro que teria pre-
visto o surgimento do vírus
em Wuhan, na China, no sécu-
lo 21, como sendo fruto de um
laboratório.
Os Olhos da Escuridão , de
Dean Koontz, publicado em
1981, é um thriller sobre o desa-
parecimento de uma criança e a
busca empreendida por sua
mãe, guiada por mensagens pa-
ranormais. E, sim, o romance
também fala sobre um vírus sur-
gido em Wuhan, embora esse
não seja o tema principal do en-
redo literário.
Trechos do livro viralizaram
na internet, alavancados por no-
tícias falsas e teorias conspira-
tórias, e a atenção repentina ge-
rada pela obra fez com que a
editora Citadel se interessasse
em publicá-la, tanto é que che-
ga agora ao Brasil.
“A nova vida que o livro ga-
nhou por causa da pandemia na
vida real é verdadeiramente in-
teressante”, comentou o autor
sobre esse inusitado sucesso
tardio. “A obra foi publicada ori-
ginalmente sob um pseudôni-
mo quando eu era mais jovem e
ainda lutando para construir
uma carreira.”
Apesar das semelhanças com
as situações que o mundo vem
enfrentando, Koontz nega ter
tentado prever qualquer coisa.
“O vírus em Os Olhos da Escuri-


dão é o que Hitchcock chamou
de um ‘MacGuffin’, o objeto
que dá início a uma história,
mas não é exatamente sobre o
que a trama trata. Apesar da de-
sinformação grotesca nas re-
des sociais, a obra não é sobre
pandemias, e eu não previ 2020
como o ano em que acontece-
ria”, afirma o escritor.
“No livro, o vírus é uma arma
biológica que foi acidentalmen-
te liberada de maneira limita-
da, e para a qual uma vacina es-
tá sendo pesquisada por cientis-
tas a serviço do Departamento
de Defesa dos Estados Unidos.
Quando eu estava procurando
uma origem plausível para esse
tipo de arma, minhas pesquisas
me levaram aos laboratórios de
biologia bélica na China. Na-
quela época, um deles ficava
próximo a Wuhan”, explica
Koontz, a respeito de como che-
gou a essa solução para seu enre-
do. “Nenhuma clarividência foi
necessária! Só pesquisa.”
Antes da pandemia, o livro já
havia sido traduzido para 30
idiomas e vendido mais de 4 mi-
lhões de exemplares. Apesar do
interesse renovado, Koontz não
é um entusiasta da própria obra.
“Eu colocaria Os Olhos da Escuri-
dão entre os meus romances me-
nos interessantes. Uma história
divertida e cheia de suspense,
mas nada além disso”, afirma o
escritor. “O que eu escrevi des-
se livro em diante é muito mais
ambicioso e complexo.”

31º Grande Leilão de Joias


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Dia 20/06 (sábado), 16h.


É amanhã!


Realidade. Profissionais de saúde em uma casa durante visita para realizar os testes da covid-19, na Cidade do México

OS OLHOS DA
ESCURIDÃO
Autor: Dean
Koontz
Editora:
Citadel
(272 págs.,
R$ 44,90 livro,
R$ 16,99 e-
book)

Podemos, sim,


sair das trevas


PEDRO PARDO/AFP
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