O Estado de São Paulo (2020-06-21)

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O ESTADO DE S. PAULO DOMINGO, 21 DE JUNHO DE 2020 Metrópole A


RENATA


CAFARDO


O


Brasil se livrou na semana
passada de um ministro da
Educação que nada se impor-
tava com Educação. Deixemos então
Abraham Weintraub de lado, agora
que ele finalmente se foi. E falemos
do que as cidades brasileiras fizeram
em suas redes de ensino durante a
pandemia, mesmo sem qualquer arti-
culação do governo federal.
Estudo divulgado um dia depois
que Weintraub deixou o MEC mos-
tra que 82% das redes municipais es-
tão oferecendo aulas ou conteúdos
durante o fechamento das escolas.
Claro que se pode olhar o copo meio
vazio e dizer que 18% não consegui-

ram fazer nada. Mas diante da total falta
de ajuda do ministério, é uma vitória.
A pesquisa “A Educação não pode pa-
rar” foi feita pelo instituto Interdiscipli-
naridade e Evidências no Debate Educa-
cional (Iede) e pelo Comitê Técnico de
Educação do Instituto Rui Barbosa (C-
TE-IRB). Foi ouvida uma amostra de
232 municípios. Os números por região
mostram que Sudeste e Sul, as mais
ricas, têm 100% das suas cidades com
ensino remoto. No Norte e Nordeste,
fica em torno de 75%.
A pesquisa traz relatos como o da ci-
dade de Setubinha, em Minas Gerais,
que fica a 500 quilômetros da capital e
tem 11 mil habitantes. Toda semana, os

professores elaboram atividades, ti-
ram cópias na secretaria da Educação e
entregam aos pais ou aos próprios alu-
nos na escola. Nesse dia, os docentes
explicam a atividade nova e recebem as
que foram feitas na semana anterior.
“Se, por acaso, algum aluno não de-
volve, o professor vai até a casa dele,
procura saber o que aconteceu e re-
solve o problema”, conta o responsá-
vel pelo programa em Setubinha. A
cidade é extremamente pobre e rural.
A prefeitura percebeu que não seria
possível cobrar o uso do computador
ou do celular dos alunos. Setubinha
“resolveu o problema”.
Houve também municípios que cria-
ram 0800 para se tirar dúvidas, grupos
e grupos de WhatsApp ou até passaram
com carro de som avisando os pais so-
bre a importância de ajudar os filhos.
E exemplos de extrema organiza-
ção, como Guajará Mirim, em Rondô-
nia, que estabeleceu exatamente as
funções do professor neste momento
de escolas a distância: “1. Planejar as
aulas não presenciais a serem desen-

volvidas; 2. Apresentar à supervisão es-
colar com antecedência as atividades
elaboradas para apreciação”... e seguia
até a última, que é “registrar as ativida-
des pedagógicas remotas desenvolvi-
das em portfólio, constando relatórios
descritivos e fotográficos das ações,
com gráficos do resultado do rendi-
mento do estudante”.

A pesquisa mostrou ainda que 79%
dos municípios já criaram estratégias
para evitar o abandono escolar, indica-
do como um dos maiores riscos em
tempos em que a escola fica fechada –
seja em guerras, desastres naturais ou
greves. Muitas delas ligam com fre-
quência para os alunos que deixam de
fazer contato. E 84% já têm projetos
sobre como vão organizar a volta às
aulas, coisa que muita escola particu-
lar ainda não sabe como fazer. A maio-

ria planeja uma avaliação diagnósti-
ca dos alunos para ver o que apren-
deram no período em casa, medida
recomendada por dez entre dez es-
pecialistas.
“Sucesso absoluto não é nossa me-
ta, mas já observamos bons resulta-
dos, pois os alunos estão procurando
pelos professores, solicitando ajuda
e alguns pais procuram por nós para
agradecerem pelos filhos estarem de-
dicando uma parte do seu tempo, em
casa, aos estudos”, completa o relato
da secretaria de Setubinha.
Mesmo com a falta de estrutura, a
cidade fez na pandemia o que se es-
pera de uma escola. Manteve-se
preocupada com seus alunos e se es-
forçou para que aprendessem sob
qualquer circunstância. Valores sim-
ples, mas que nunca passaram perto
do nosso ex-ministro da Educação.

]
É REPÓRTER ESPECIAL DO ESTADO E
FUNDADORA DA ASSOCIAÇÃO DE
JORNALISTAS DE EDUCAÇÃO (JEDUCA)

l Semana 1 (18 a 24 de mar-
ço) – 45 mortes

O governador de São Paulo,
João Doria (PSDB), anuncia
quarentena com fechamento
do comércio e de serviços não
essenciais (exceção feita a ser-
viços de saúde pública, alimen-
tação, abastecimento, seguran-
ça e limpeza) a partir do dia 24
de março. Manifestações reli-
giosas não são recomendadas,
e parques são interditados.


l Semana 2 (25 a 31 de mar-
ço) – 155 mortes

O número de pacientes hospi-
talizados no Brasil com síndro-
me respiratória aguda grave
(SRAG) aumenta exponencial-
mente, coincidindo com a che-
gada do novo coronavírus, de
acordo com a Fiocruz. Somen-
te em uma semana foram esti-
mados no sistema cerca de
2.250 casos.


l Semana 3 (1 a 7 de abril) –
466 mortes

Hospital de Campanha do Pa-
caembu começa a receber no
dia 6 pacientes de média e bai-
xa complexidade encaminha-
dos por equipamentos de saú-
de da capital paulista. São 200
leitos divididos por dez enfer-
marias. O hospital de 6,3 mil
metros quadrados foi construí-
do dentro do próprio estádio.


l Semana 4 (8 a 14 de abril)


- 865 mortes
A chegada da epidemia nas co-
munidades, um dos maiores
temores das autoridades de
saúde, começa a se desenhar
no Rio de Janeiro. Quatro das
maiores comunidades cariocas
registram pelo menos seis mor-
tes confirmadas por covid-19.
Rocinha, Manguinhos, Maré e
Vigário Geral somam 23 casos
registrados da doença.


l Semana 5 (15 a 21 de abril)


- 1.209 mortes
O aumento dos enterros em
Manaus exige o uso de valas
coletivas no Cemitério Parque
Tarumã em um período em
que o Amazonas é bastante afe-
tados pela doença. Embora
com distanciamento entre os


caixões e identificação das se-
pulturas, as valas coletivas se
tornam uma das imagens mais
dramáticas dos efeitos da co-
vid-19 na região. Em meio à es-
calada de casos, o Brasil enfren-
ta a primeira troca do ministro
da Saúde. Luiz Henrique Man-
detta é demitido da pasta por
divergências com o presidente
Jair Bolsonaro e o médico onco-
logista Nelson Teich assume.

l Semana 6 (22 a 28 de
abril) – 2.276 mortes
Plano emergencial para o servi-
ço funerário da Prefeitura de
São Paulo prevê a abertura de
13 mil covas e a contratação de
220 coveiros. Os casos de co-

vid-19 deixam ainda de ter um
velório comum. As medidas
buscam evitar o colapso no se-
pultamento de corpos diante
do avanço de mortes.

l Semana 7 (29 de abril a 5
de maio – 2.904 mortes
Decreto estadual torna obriga-
tório o uso de máscaras por
todos os cidadãos que saírem
às ruas em São Paulo. A fiscali-
zação da regra fica a cargo de
cada uma das 645 prefeituras,
que determinam, em cada mu-
nicípio, como vigiar e punir em
caso de descumprimento.

l Semana 8 (6 a 12 de maio)

- 4.479 mortes


Após fracasso nos bloqueios
viários para forçar o aumento
das taxas de isolamento, a Pre-
feitura de São Paulo adota no-
va forma de rodízio para esti-
mular as pessoas a ficarem em
casa. O revezamento de veícu-
los passa a valer para toda a
capital, não apenas o centro
expandido, o dia todo, e fins de
semana. A proibição foi dividi-
da em placas pares e ímpares.

l Semana 9 (13 a 19 de maio)

- 5.008 mortes
Nos EUA, a empresa de biotec-
nologia Moderna, em parceria
com o Instituto Nacional de
Alergia e Doenças Infecciosas,
anuncia testes preliminares po-


sitivos em ensaios clínicos. Ní-
veis de anticorpos das primei-
ras oito pessoas testadas são
semelhantes aos das recupera-
das. Faltam os testes em larga
escala, em julho. Menos de um
mês após ter assumido o Minis-
tério da Saúde, Nelson Teich
pede demissão, também por
divergências com Bolsonaro.
O militar Eduardo Pazuello
assume a pasta interinamente.

l Semana 10 (20 a 26 de
maio) – 7.104 mortes
A emergência nacional de saú-
de, social e econômica causada
pela pandemia cria uma onda
de solidariedade que resultou
em mais de R$ 5 bilhões em

doações. A maior parte vem de
grandes empresas, mas pes-
soas físicas também colabo-
ram para mudar o cenário de
filantropia no País. A expectati-
va é de que haja uma consolida-
ção da cultura de doações.

l Semana 11 (27 de maio a 2
de junho) – 6.687 mortes
O Brasil se consolida como o
país com o maior número diá-
rio de óbitos do mundo, supe-
rando os EUA. O País já é o se-
gundo colocado em relação ao
número acumulado de infec-
ções. O aumento acontece no
contexto em que a América Lati-
na é considerada pela Organiza-
ção Mundial de Saúde (OMS)
como epicentro da doença.

l Semana 12 (3 a 9 de junho)

- 7.298 mortes
A vacina da Universidade de
Oxford, no Reino Unido, será
testada também no Brasil, em
pelo menos 2 mil voluntários.
Considerado o estudo mais
promissor e avançado em bus-
ca da cura, o imunizante já está
na fase três de testes, a última,
em que será testada para com-
provação a sua eficácia.


l Semana 13 (10 a 16 de ju-
nho) – 6.959 mortes
A cidade de São Paulo permite
a reabertura, com restrições,
de concessionárias e imobiliá-
rias em junho e, em seguida,
escritórios e lojas de rua. O ter-
ceiro movimento de abertura
inclui shopping centers, mas
só quatro horas por dia. É o pla-
no de reabertura do governo
para a saída da quarentena, em
vigor desde 24 de março.

l Semana 14 (17 a 20 de ju-
nho) – 4.602 mortes
Segundo país do mundo com
maior número de mortos pela
covid-19 e com mais de um mi-
lhão de casos, o Brasil superou
a triste marca de 50 mil mortos
de acordo com o levantamento
feito pelo consórcio da impren-
sa que reúne os veículos de co-
municação Estadão , G1, O Glo-
bo , Extra , Folha e UOL. Apenas
os Estados Unidos estão à fren-
te. / GONÇALO JÚNIOR

PANDEMIA DO CORONAVÍRUS


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ACLIMAÇÃO - VISTA 360º
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(11)98188-

A evolução das mortes produziu imagens inesquecíveis, como a dos cemitérios em São Paulo. A primeira vítima morreu em 17 de março


Minas agora estuda lockdown. Pág. A18 }


O exemplo de Setubinha


82% das redes municipais estão
oferecendo aulas ou conteúdos
durante fechamento de escolas

AMANDA PEROBELLI/REUTERS

A pandemia no Brasil em 14 semanas


Dramas familiares. Enterro no Cemitério da Vila Formosa, em São Paulo, durante a escalada da doença em poucos dias
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