O Estado de São Paulo (2020-06-21)

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O ESTADO DE S. PAULO DOMINGO, 21 DE JUNHO DE 2020 A


Esportes

Jairzinho,
75 anos, atacante
da seleção brasileira
na Copa de 1970

‘A Copa de 70 é


uma grande aula


para os jovens’


Rivellino,
74 anos, meia da
seleção brasileira
na Copa de 1970

Gerson,
79 anos, meia da
seleção brasileira
na Copa de 1970

Clodoaldo,
70 anos, volante da
seleção brasileira
na Copa de 1970

Emerson Leão,
70 anos, goleiro da
seleção brasileira
na Copa de 1970

Futebol. Craques que estiveram no México recontam ao ‘Estadão’ como a equipe liderada por Pelé se tornou a melhor de todos os tempos


Seleção brasileira celebra os 50 anos


da conquista do Tri mundial em 1970


]O Corinthians teve oito jogadores e
cinco outros profissionais, da comis-
são técnica e demais setores do clu-
be, diagnosticados com coronavírus.

Todos estão assintomáticos. Os resul-
tados positivos foram apontados por
190 exames realizados. Recém-con-
tratado, o atacante Jô ainda não foi
testado para o coronavírus. Caso o
resultado seja negativo, ele estará
livre para ser integrado ao elenco.

Pelé se preparou como


nunca para outro título


Zagallo, o maestro que


entrou em cima da hora


ALEX SILVA / ESTADÃO

Pela primeira vez a seleção jogou
com cinco camisas 10, todos jogado-
res de alto nível. O mundo todo
aplaudiu a qualidade do futebol bra-
sileiro, ofensivo e de muita técnica.
Não tivemos nenhum problema em
termos de esquema tático, coletivi-
dade ou falta de amizade. Todo mun-
do se enquadrou dentro daquela filo-
sofia. Até hoje está escrito nos anais
do futebol que o time de 70 foi a me-
lhor seleção de todos os tempos. Za-
gallo montou uma seleção que nun-
ca mais ninguém vai conseguir fa-
zer. Essa pandemia melhorou a co-
municação do futebol brasileiro
com a juventude, já que antes as pes-
soas só comentavam, mas não repri-
savam os jogos de 70, como foi feito
agora. Para os mais jovens é uma
grande aula. A Copa de 70 é uma
aula gratuita de futebol.


CORINTHIANS TEM OITO
JOGADORES COM COVID-

Pelé sempre fala com carinho
de 70. A seleção do tri tinha ‘o
melhor Pelé de todos’ então
com 29 anos. O fracasso do Bra-
sil na Inglaterra em 1966 fez
com ele reavaliasse sua despedi-
da do time nacional como havia
planejado. Disse que não queria
mais. Mudou de ideia.
Pelé fez de tudo para retri-
buir o carinho e empenho de to-
dos. Quando algum problema
aparecia na concentração que


fosse mais sério, lá estava Pelé
para fazer o meio de campo en-
tre o grupo e os dirigentes, pe-
dindo para a comissão colocar
panos quentes porque o objeti-
vo era ser campeão.
Pelé, já coroado rei, treinava
como se fosse um juvenil. Dava
exemplo. Comia o que era servi-
do. Também apanhava sem re-
clamar em campo, como foi na
partida contra o Uruguai na se-
mifinal, quando também mos-

trou ao mundo que sabia bater.
Pelé já disse algumas vezes
que a seleção de 70 teve dois
méritos: o tempo para treinar e
a escalação de um ataque em
que todos eram 10 em seus res-
pectivos times. A festa após a
final contra a Itália no Estádio
Azteca, na cidade do México, di-
mensiona o que a seleção brasi-
leira e seus jogadores represen-
tam na história do futebol. Pelé
guarda com carinho o chapéu
mexicano colocado em sua ca-
beça quando ele foi erguido nos
ombros de torcedores na come-
moração. A Copa de 70 deu a
Pelé o que já pertencia a Pelé:
reinado e glória para sempre.

DEPOIMENTOS


Um dos fatos mais controver-
sos da história do tri de 1970 foi
a demissão do técnico João Sal-
danha a poucos dias do início da
preparação da seleção para a Co-
pa do México. Para seu lugar foi
chamado Mario Jorge Lobo Za-
gallo, bicampeão em 1958 e 1962
como jogador. Nunca se saberá
se aquela equipe voltaria do
México com o título sob o co-
mando de Saldanha, mas a histó-
ria sabe que, com Zagallo, o Bra-

sil teve um dos melhores times
de todos os tempos.
Na opinião do “'Velho Lobo”,
a seleção precisava de mudança


  • principalmente dentro de
    campo. “Faltavam dois meses
    para iniciar a Copa de 1970, e eu
    reformulei tudo”, contou em
    entrevista à CBF TV em 2018.
    “Quando eu assumi a seleção,
    o Saldanha jogava num 4-2-4.
    Eu disse: ‘Se nós jogarmos as-
    sim, não vamos chegar a lugar


nenhum’. Peguei o Clodoaldo e
o Rivellino, que eram reservas,
e coloquei como titulares. Colo-
quei o Piazza para quarto za-
gueiro, ele era homem de meio-
campo.” Citou ainda a mudan-
ça na lateral-esquerda, com Eve-
raldo entrando na vaga do lesio-
nado Marco Antônio. A nova
equipe foi armada em um 4-3-3.
Segundo Zagallo, a inspira-
ção foram as seleções de 1958 e


  1. “Mas não foi uma mudan-
    ça fácil. Não pensem que acon-
    teceu da noite para o dia.”
    Atualmente com 88 anos, o
    ex-treinador está bem de saú-
    de, mas, devido à pandemia,
    tem evitado entrevistas.


‘Havia problemas


no elenco, mas


isso ficava fora’


Saímos do Brasil desacreditados. Fica-
mos dois meses treinando e algo que
me chama a atenção até hoje era o
quanto o Pelé tinha de energia positi-
va, de vontade de vencer... Mesmo já
bicampeão, ele era o primeiro da fila
e nunca reclamava de nada. Em rela-
ção à convivência, este elenco me
marcou bastante também, mas por
um motivo diferente. Essa coisa de
grupo unido para mim é bobagem.
Tem de ser unido dentro de campo.
Eu corro por você hoje, mas amanhã
eu não preciso sair para jantar conti-
go. Havia problemas no elenco, claro,
mas isso ficava fora. O gol do Carlos
Alberto (na final, contra a Itália) é
um exemplo dessa união em campo
que eu digo. Falo na Copa de 70 e na
primeira coisa que vem na minha ca-
beça é aquele gol. Foi o time inteiro
tocando a bola. Coisa linda.

‘Até nas horas


de folga a gente


treinava’


Para nós (jogadores), a troca de
treinador não teve muita diferença,
porque saiu um vitorioso (João Sal-
danha) e entrou outro também vito-
rioso (Zagallo), que só mexeu um
pouco no esquema – o Saldanha
gostava de ponta na frente e o Za-
gallo gostava de ponta fechando o
meio. O que mais marcou foi o en-
trosamento. A gente sabia o que ou-
tro iria fazer, o que gostaria de fa-
zer, de antemão. Ficamos muito
tempo juntos, seja em excursão, Eli-
minatórias, mais três meses de pre-
paro tanto no Brasil quanto lá no
México. E o preparo físico foi mar-
cante. Nas horas vagas, a gente trei-
nava. Ou então discutia a maneira
melhor de jogar, e de marcar os ad-
versários. Não tinha folga. A Copa
compensou a de 66, que foi atípica
(o Brasil caiu na primeira fase).

‘Até hoje aquele


elenco mantém


a amizade’


A memória mais querida que tenho
daquela Copa é da convivência do
grupo. Tínhamos um ambiente mui-
to bom. Claro que a gente era adver-
sários nos clubes aqui no Brasil,
mas em prol da seleção brasileira
conseguimos deixar de lado algu-
mas diferenças e ter um clima bom,
de amizade e companheirismo.
O grupo tinha várias figuras mui-
to queridas. O Brito era o cara mais
divertido. Sempre contava piadas e
tirava sarro. Até hoje nós, jogado-
res, mantemos essa amizade. Recen-
temente, a gente se encontrou em
evento na CBF para inaugurar a es-
tátua do Pelé. Conversamos por
muito tempo. De vez em quando
troco mensagens com alguns. A tec-
nologia nos ajuda a continuarmos
perto, lembrando esse período incrí-
vel que foi a Copa de 1970.

‘O que fez a


diferença foi a


nossa preparação’


O mais importante, o que fez a dife-
rença mesmo foi a preparação da
seleção brasileira para jogar na alti-
tude, algo que ninguém sabia o que
era. Graças à pesquisa feita pelo ca-
pitão (Cláudio) Coutinho, que era
o auxiliar de preparação física, fo-
mos muito bem nisso. Se observar-
mos, ganhamos muitos jogos no
segundo tempo porque tínhamos
uma condição física muito superior
à dos outros. Agora, com a pande-
mia, houve tempo de os mais jo-
vens acompanharem os jogos nas
reprises e ver o nosso estilo, ver co-
mo se jogava o futebol brasileiro
antigamente, com velocidade e tu-
do mais. É uma demonstração. É
para vermos que aquele futebol do
Brasil de 70 deveria continuar sen-
do a característica do jogador brasi-
leiro para decidir as partidas.

Uma seleção que encantou o
mundo. Um esquadrão marca-
do na história. Os elogios nunca
são exagerados para definir a
campanha do Brasil na Copa do
Mundo de 1970. Mais do que ter


vencido a competição no Méxi-
co e conseguido erguer pela ter-
ceira vez a taça de uma Copa do
Mundo de futebol, o grupo de
craques conseguiu ficar marca-
do para sempre na história da

bola como um dos melhores ti-
mes de todos os tempos.
Sob o comando do treinador
Mário Jorge Lobo Zagallo, cra-
ques como Pelé, Carlos Alberto,
Tostão, Gerson, Rivellino, Jair-

zinho, Clodoaldo, e de jovens co-
mo Paulo Cezar Caju e o então
goleiro do Palmeiras Emerson
Leão, que se juntou aos colegas
de posição Félix (titular) e Ado,
conseguiram no México vencer

seis partidas em seis jogos. O
Brasil alcançou a posse definiti-
va da Jules Rimet, troféu que só
seria entregue a quem vencesse
pela primeira vez três edições
da Copa, e ainda ensinou o mun-

do como jogar bonito, com velo-
cidade, ocupação de espaços,
transição defesa, meio e ataque,
alternância de posicionamen-
tos. Uma aula de como se jogar
futebol até nos dias de hoje.
OSWALDO LUIZ PALERMO/ESTADÃO–21/6/1970 ACERVO–ESTADAO–21/06/

ACERVO ESTADAO–21/6/

Memória. Vitória contra
a Itália na final deu ao
Brasil a posse definitiva
da Jules Rimet
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