O Estado de São Paulo (2020-06-21)

(Antfer) #1

%HermesFileInfo:A-2:20200621:
A2 Espaçoaberto DOMINGO, 21 DE JUNHO DE 2020 O ESTADO DE S. PAULO






Novo estudo revela que 1 em
cada 5 organizações da socie-
dade civil, ou seja, ONGs, insti-
tutos, fundações ou coletivos,
já declara estar sem fundos pa-
ra continuar suas atividades.
Entre os impactos negativos
da pandemia, além da diminui-
ção da captação de recursos
(73%), os representantes de


instituições também indica-
ram o distanciamento e difi-
culdade de comunicação com
os públicos atendidos (55%), a
diminuição de voluntários ati-
vos (44%) e o estresse e sobre-
carga das equipes (40%) co-
mo principais pontos.

http://www.estadao.com.br/e/ong

H


á pouco mais de um
ano, não deixou de
causar furor e indigna-
ção a atitude de Matteo Salvi-
ni, o expoente da ultradireita
italiana e, na época, a figura
mais forte do governo, ao se
recusar a celebrar a data de li-
bertação do seu país da ocupa-
ção nazista e do despotismo
mussoliniano. O 25 de abril,
na visão de Salvini, não marca-
va nenhum renascimento na-
cional por trazer um vício de
origem: independentemente
da catástrofe cujo fim aquela
data assinala, trata-se de uma
contraposição – entre fascis-
tas e antifascistas – já arquiva-
da nos desvãos do passado. O
fascismo está derrotado e, por
isso, o antifascismo não tem
mais razão de ser. E, sobretu-
do, não tem mais razão de ser
porque entre os antifascistas,
na primeira fila, estão os odia-
dos comunistas, a quem Salvi-
ni, como os demais compa-
nheiros de cruzada, não reco-
nhece nenhum papel positivo,
em contexto algum.
No entanto, o antifascismo,
apesar de Salvini e compa-
nhia, é um termo que tem
atravessado gerações, redefi-
nindo-se em diferentes con-
junturas críticas. Seus símbo-
los, suas palavras de ordem e
até canções, como a Bella
Ciao , que os jovens voltam a
entoar nas manifestações em
várias línguas, mostram que
ali, naquele termo, há matéria
de memória e de reflexão, es-
pecialmente por quem, consi-
derando as frentes antifascis-
tas um tema relevante ainda
hoje, nem por isso se abstém
de enfrentar contradições
muitas vezes dilacerantes no
próprio campo.
O comunismo, por exem-
plo. Onde quer que tenha ha-
vido fascismo, ou arremedo
dele, como no Brasil do Esta-
do Novo, os comunistas luta-
ram o bom combate. E a
URSS staliniana foi um com-
ponente essencial da aliança
com as democracias ociden-
tais que afastou o pesadelo
de um Reich de mil anos. Mas
é forçoso reconhecer que, lu-
tando pela democracia, os co-

munistas no poder construí-
ram Estados repressivos e, pa-
ra falar com franqueza, totali-
tários; na oposição , ao contrá-
rio, tornaram-se pouco a pou-
co fatores importantes de vá-
rias democracias, moderan-
do-se ao longo do tempo
num sentido social-democra-
ta e dando origem ao prover-
bial “reformismo” legalista
dos velhos PCs. Eles, em tais
contextos, sempre menos an-
tissistêmicos e mais preocu-
pados com a integração dos
“de baixo”, eram meios para
a expansão virtuosa das de-
mocracias, e não para a explo-
são revolucionária, o que ia
ao encontro dos interesses
de toda a sociedade.
O antifascismo original não
anulava nem escondia a diver-
sidade das suas partes consti-
tutivas. Conservadores, libe-
rais e socialistas democráti-

cos, entre outros, deviam ca-
lar temporariamente suas fun-
dadas restrições à versão jaco-
bina que da tradição marxia-
na davam os partidários da Re-
volução de 1917. Estes últi-
mos, comprometidos com a
estatolatria implantada no
país-modelo, se batiam na
frente antifascista ao lado de
aliados que defendiam com
firmeza as liberdades “negati-
vas”, as que protegem cada in-
divíduo contra a onipotência
do Estado e sem as quais os
melhores ideais da igualdade
degeneram em igualitarismo
grosseiro. A coragem demons-
trada nas frentes de batalha,
embora pudesse atingir tons
heroicos, não ocultava a subal-
ternidade “ideológica” dos co-
munistas e da matriz bolchevi-
que, incapaz de assimilar ou
sequer entender o papel das li-
berdades “burguesas”.
O antifascismo consistiu as-
sim numa aliança entre ato-
res diferentes, e até muito di-
ferentes, em razão de um mal
maior. Mas se só houvesse di-

ferenças entre eles a aliança
se definiria negativamente e
teria muito mais dificuldade
para se formar. Ainda que de
modo parcial e imperfeito, to-
dos os atores aliancistas com-
partilhavam uma fundamen-
tal orientação democrática
inerente à modernidade, que
lentamente corroía o mundo
rigidamente hierárquico,
opressivo e “orgânico” de ou-
trora. Por isso se desprendia
do campo conservador, e a es-
te acabava por se contrapor fe-
rozmente, uma versão reacio-
nária da modernidade, capaz
obviamente de elaborar pro-
gramas de reerguimento eco-
nômico, como no caso do cor-
porativismo italiano ou das
políticas nacional-socialistas
contra a depressão, mas asso-
ciados à liquidação radical
dos direitos civis e políticos, à
uniformização compulsória
da vida social e aos mitos
mais regressivos do solo e do
sangue. Em suma, a grande
noite do irracionalismo, a te-
mida temporada do assalto à
razão, que deram, por contras-
te, o cimento essencial para o
bloco antifascista.
Com todos os conflitos in-
ternos, esse bloco esteve na
origem de desenvolvimentos
positivos, como, de certo mo-
do, o reformismo rooseveltia-
no e, seguramente, os “
anos gloriosos” do capitalis-
mo europeu socialmente regu-
lado. Há décadas tudo isso es-
tá sob fogo cerrado não pro-
priamente dos conservadores,
que costumam ter uma cons-
ciência serena do que merece
ser mantido, mas da sua ponta
mais extremada e “revolucio-
nária”, a exemplo de Salvini,
que, como bem se vê, não é
um lobo solitário. Cabe ter es-
perança na ação de uma es-
querda que, desta vez, ao con-
trário dos avós bolcheviques,
assuma a ideia democrática,
sem adjetivos, como convic-
ção íntima e incontornável. A
alternativa é a barbárie.

]
TRADUTOR E ENSAÍSTA,
É UM DOS ORGANIZADORES DAS
‘OBRAS’ DE GRAMSCI NO BRASIL

Podcast “Na Quarentena”
discute as medidas de dis-
tanciamento social.

http://www.estadao.com.br/e/isolamento

PANDEMIA


ONGs terão diminuição de recursos


O uso opcional do acessó-
rio, capaz de detectar os sin-
tomas da covid-19, está in-
cluído no plano da NBA de
reiniciar a temporada.

http://www.estadao.com.br/e/nba

l“Weintraub, como agem os covardes, sai fugido para os EUA com me-
do de ser preso. Fuga patrocinada pelo governo Bolsonaro.”
CINTIA GRAZIELA COSTA

l“Ele apenas é investigado. Se houver condenação e a corte determi-
nar prisão, os EUA e o Brasil têm tratados de extradição.”
MARCÍLIO NENA SANTOS

l“Usou passaporte diplomático para fins pessoais. Desvio de finalida-
de. Bandidagem escancarada.”
PEDRO FERNANDO

l“E o que muda para nós? Votamos para assistir um BBB no Planal-
to? A realidade dos simples mortais é bem diferente.”
SAMUEL GOMES BARCELLOS

INTERAÇÕES

CONSELHO DE ADMINISTRAÇÃO
PRESIDENTE: ROBERTO CRISSIUMA MESQUITA
MEMBROS
FERNANDO C. MESQUITA
FERNÃO LARA MESQUITA
FRANCISCO MESQUITA NETO
GETULIO LUIZ DE ALENCAR
JÚLIO CÉSAR MESQUITA

O beijo no cinema não é al-
go passado. Alguns atores já
voltaram a filmar cenas des-
te tipo na França, país onde
a pandemia retrocede.

http://www.estadao.com.br/e/beijo

Espaço Aberto


O


ódio é um sentimento
que conduz à aniquila-
ção dos valores. Pro-
move a falta de conexão en-
tre pessoas, isola e desliga,
pulveriza e corrói o papel dos
indivíduos, como destaca Or-
tega y Gasset. Tem um efeito
que corrompe e avilta o espa-
ço público.
O ódio tornou-se parte do
contorno da vida política bra-
sileira. Virou um ingrediente
da nossa circunstância. Esteve
presente na dicotomia da elei-
ção de 2018. Alimenta a lógica
do confronto da Presidência
Bolsonaro. Esta se vê conti-
nuamente abastecida por fake
news
e pelas limitadas, mas es-
tridentes manifestações fac-
ciosas de movimentos de
ódio, denegadores das institui-
ções democráticas e propugna-
dores de uma “ascensão aos
extremos”. O radicalismo des-
sas posturas, que usufruem a
acolhedora benevolência do
presidente, impacta a atmosfe-
ra política. Compromete o es-
paço de um centro agregador
da sociedade brasileira.
O ódio não reflete. Agita.
Na esfera pública movimenta
a obscuridade dos ressenti-
mentos privados em relação
ao sistema político. Instru-
mentaliza na sua dinâmica o
sentimento voltado para iden-
tificar não adversários, mas
múltiplos inimigos. Com es-
tes, para essas facções, cabe
travar uma guerra pública, po-
lítica e cultural. É uma mensa-
gem de combate que está em
impregnadora sintonia com a
mentalidade do setor ideológi-
co do governo.
O ódio, público ou privado,
contrapõe-se à prescrição
bíblica. Diz o Levítico (19,17):
“Não terás no coração ódio
pelo teu irmão”. A reflexão tal-
múdica sobre essa prescrição
ensina que o ódio no coração
ao semelhante coloca o ser hu-
mano fora do mundo ( Trata-
do Aboth
, II-16), ou seja, para
falar como Hannah Arendt,
impede a pluralidade do estar
no mundo com outros seres
humanos. Neste mundo o Se-
nhor abomina “o que semeia
a discórdia entre irmãos”


( Provérbios 6,20).
A discórdia na esfera públi-
ca é o que impele o espírito
de facção, denega os direitos
dos outros membros da cida-
dania e os interesses gerais da
comunidade (Hamilton – Fe-
deralista n.º 10 ). O facciosis-
mo da lógica do confronto
presidencial vem comprome-
tendo, entre muitas matérias,
a pauta do federalismo coope-
rativo – até mesmo na situa-
ção-limite da covid-19.
Monteiro Lobato fez o Vis-
conde de Sabugosa dizer: “O
ódio é assim, não respeita coi-
sa nenhuma”. E Machado de
Assis adverte: “Haverá pior
coisa do que mesclar o ódio
às opiniões?”. É essa mescla
que vem envenenando o siste-
ma político brasileiro e a vis di-
rectiva dos valores democráti-
cos consagrados na Constitui-
ção de 1988.

A diversidade de opiniões é
inerente à pluralidade da con-
dição humana. A democracia
protege-a por meio das suas
instituições, entre elas a divi-
são dos Poderes, que permite
ao Congresso e ao Supremo
Tribunal Federal, seguindo a
Constituição, se contraporem
aos excessos monocráticos da
caneta presidencial. Também
é a aceitação de que a verdade
não é uma, e sim múltipla,
que enseja a tutela, no nosso
ordenamento jurídico, da li-
berdade religiosa, de pensa-
mento, de opinião e de sua vei-
culação e manifestação. Essas
são regras do jogo voltadas pa-
ra assegurar numa democra-
cia o modus vivendi da convi-
vência coletiva.
É precisamente a negativi-
dade da mescla do ódio nas
opiniões que impacta a convi-
vência democrática.
As palavras e as mensagens
de ódio e suas consequências
são um risco para o tecido de-
mocrático. Na perspectiva da
Constituição, põe em questão

um dos objetivos fundamen-
tais da República brasileira,
que é o de “promover o bem
de todos, sem preconceito de
origem, raça, sexo, cor, idade
e quaisquer outras formas de
discriminação” (Constituição
federal, artigo 3.º, IV). Esse
objetivo é um bem público.
Estipula um rumo, um senti-
do de direção para a socieda-
de brasileira. Almeja incluir, e
não excluir.
As manifestações dos ódios
públicos e a veiculação das
fake news desqualificam a dig-
nidade dos seus destinatá-
rios. São um assalto ao bem
público da inclusividade de
todos os membros da cidada-
nia brasileira. Comprometem
a responsabilidade, que cabe
ao poder numa democracia,
de proteger a atmosfera de
mútuo respeito.
A democracia requer con-
fiança, ensina Bobbio. A con-
fiança recíproca entre os cida-
dãos e a confiança dos cida-
dãos nas instituições, o que
exige a transparência do po-
der. A transparência deman-
da o rigor da informação. Um
rigor muitas vezes posto em
questão pela atual governan-
ça do País, mas que vem sen-
do contido pela liberdade
exercida pelos meios de co-
municação não impregnados
pelo obscuro facciocismo das
fake news e dos “gabinetes do
ódio”.
Várias manifestações, reu-
nindo um amplo espectro de
pessoas de distintas trajetó-
rias e orientações políticas, fo-
ram recentemente divulga-
das. Exprimem um sentimen-
to majoritário de preocupa-
ção com as consequências pa-
ra o País dos problemas e
suas circunstâncias aqui apon-
tadas. São ações afirmativas
da sociedade civil em prol da
democracia e da recuperação
da confiança que nela, sem
facciocismos excludentes, de-
ve prevalecer.

]
PROFESSOR EMÉRITO DA
FACULDADE DE DIREITO DA USP,
FOI MINISTRO DAS RELAÇÕES
EXTERIORES (1992 E 2001-2002)

PUBLICADO DESDE 1875

LUIZ CARLOS MESQUITA (1952-1970)
JOSÉ VIEIRA DE CARVALHO MESQUITA (1947-1988)
JULIO DE MESQUITA NETO (1948-1996)
LUIZ VIEIRA DE CARVALHO MESQUITA (1947-1997)
RUY MESQUITA (1947-2013)

FRANCISCO MESQUITA NETO / DIRETOR PRESIDENTE
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BASQUETE
NBA vai dar ‘anéis
inteligentes’ a atletas

França autoriza
filmagens com beijo

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REPRODUÇÃO PARAMOUNT

]
Celso Lafer


Tema do dia


Entidade também quer dimi-
nuir o número de partipan-
tes para 20 equipes.

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Ódio


É a negatividade da
mescla do ódio nas
opiniões que impacta a
convivência democrática

Fascismo


e antifascismo


Cabe ter esperança
na ação de uma
esquerda que assuma
a ideia democrática

AMÉRICO DE CAMPOS (1875-1884)
FRANCISCO RANGEL PESTANA (1875-1890)
JULIO MESQUITA (1885-1927)
JULIO DE MESQUITA FILHO (1915-1969)
FRANCISCO MESQUITA (1915-1969)

AV. ENGENHEIRO CAETANO ÁLVARES, 55
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SÁBADO) E R$ 7,00 (DOMINGO). RJ, MG, PR, SC E DF:
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CE, MA, PI, RN, PA, PB, AC E RO: R$ 9,00 (SEGUN-
DA A SÁBADO) E R$ 11,00 (DOMINGO)
PREÇOS ASSINATURAS: DE SEGUNDA A DOMINGO


  • SP E GRANDE SÃO PAULO – R$ 134,90/MÊS. DEMAIS
    LOCALIDADES E CONDIÇÕES SOB CONSULTA.
    CARGA TRIBUTÁRIA FEDERAL: 3,65%.


Exonerado do MEC,


Abraham Weintraub


viaja para Miami


Após deixar governo Bolsonaro,
ex-ministro desembarcou nos EUA onde
deve assumir cargo no Banco Mundial

]
Luiz Sérgio Henriques

PIXABAY CINEMA

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