%HermesFileInfo:B-1:20200621:B1 DOMINGO, 21 DE JUNHO DE 2020 O ESTADO DE S. PAULO
E&N
Temor de prejuízos com imagem negativa
do governo no exterior racha agronegócio
ECONOMIA & NEGÓCIOS
Desentendimentos entre lideranças do setor começaram no ano passado e ganharam corpo após declaração do ministro Ricardo Salles
sobre ‘passar a boiada’, interpretada como sinal para a flexibilização de controles; presidente da SRB fala em buscar o ‘caminho do meio’
PANDEMIA DO CORONAVÍRUS No governo, disputa entre liberais e ideológicos. Pág. B3 }
Mônica Scaramuzzo
O agronegócio, que abraçou
desde o início a campanha de
Jair Bolsonaro à Presidência,
começa a rachar. Preocupa-
dos com a imagem do setor
no exterior, líderes temem
que a política do governo pre-
judique os seus negócios.
Nas últimas semanas, repre-
sentantes de peso no setor ma-
nifestaram suas inquietações
em função de declarações do mi-
nistro do Meio Ambiente, Ricar-
do Salles, na reunião ministe-
rial do dia 22 de abril. No encon-
tro, Salles disse que o governo
deveria aproveitar que a mídia
estava com a atenção voltada à
pandemia do coronavírus para
“ir passando a boiada e mudan-
do todo o regramento e simplifi-
cando normas”.
Um dos líderes mais influen-
tes no setor, Pedro de Camargo
Neto, conselheiro e ex-presi-
dente da Sociedade Rural Brasi-
leira (SRB), renunciou ao cargo
após a entidade, junto com ou-
tras do setor, assinarem um ma-
nifesto em apoio ao ministro.
Os representantes da agroin-
dústria, sobretudo exportado-
res, e a Associação Brasileira do
Agronegócio (Abag), presidida
por Marcello Brito, também de-
cidiram evitar o endosso.
O Estadão apurou que boa
parte dos conselheiros da SRB
estava a favor de Camargo, mas
foi pressionada pela ala bolsona-
rista da entidade a dar apoio pú-
blico a Salles. Desde então, a
presidente da entidade, Teka
Vendramini, está buscando “o
caminho do meio” para apazi-
guar os ânimos em uma das
mais antigas associações de
classe do setor, fundada em
- “A SRB é plural e apoia
boas ideias e ações do governo,
mas não de forma irrestrita”,
disse ela, ao ser procurada pela
reportagem.
Militante bolsonarista, Nab-
han Garcia, secretário especial
de Assuntos Fundiários do Mi-
nistério da Agricultura, minimi-
za a crise. “Camargo e Brito não
representam o agronegócio e
atuam como militantes políti-
cos do PSDB”, disse Garcia, que
também faz parte da União De-
mocrática Ruralista (UDR).
Na alta cúpula do Ministério
do Meio Ambiente, o racha tam-
bém é contemporizado. “As
críticas vêm de fazendeiros da
Faria Lima que nunca pisaram
no campo”, disse uma fonte
próxima a Salles.
O agronegócio tem sido um
dos poucos setores do Brasil
que dá certo. Em meio à pande-
mia, a expectativa é que o PIB
do agronegócio passe a respon-
der por 23,6% do total do País –
no ano passado, ficou em 21,4%.
Lideranças do setor já estão
se desentendendo desde o ano
passado, quando os incêndios
avançaram sobre a região da
Amazônia e escancararam o de-
salinhamento entre os ministé-
rios da Agricultura e do Meio
Ambiente sobre o tema.
Entre o fim de março e abril, a
situação ficou mais delicada
por conta de uma crise diplo-
mática provocada pelas declara-
ções do deputado Eduardo Bol-
sonaro, filho do presidente, e do
ex-ministro da Educação Abra-
ham Weintraub, responsabili-
zando a China pela pandemia –
deixando em lados opostos agri-
cultores e a agroindústria.