O Estado de São Paulo (2020-06-22)

(Antfer) #1

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H6 Especial SEGUNDA-FEIRA, 22 DE JUNHO DE 2020 O ESTADO DE S. PAULO


NO PALCO


TEMPORADA DE


Caderno 2


Marcelo Serrado inicia projeto em que atores e músicos


vão se apresentar no teatro para uma plateia online


PEÇAS

Cresce o número de


espetáculos que


estreiam na internet,
envolvendo diversos


profissionais experientes


ARTISTAS TAMBÉM SE APRESENTAM EM CASA


De celular a gigantescos apare-
lhos de TV, diversos formatos
podem receber a transmissão
de peças ao vivo pela internet.
Veja aqui algumas opções em
cartaz:


Teatro Vivo. Estreou uma pro-
gramação de cinco monólogos
inéditos, transmitidos ao vivo
da casa dos artistas, aos sába-
dos, às 20h. No dia 27, Elias An-
dreato dirige e interpreta Pes-
soa
, do poeta Fernando Pessoa.


No dia 4 de julho, será a vez da
peça Louca de Amor, Quase Sur-
tada, com texto e interpretação
de Lena Roque. Em 11 de julho,
Cássio Scapin apresenta e diri-
ge o clássico de Anton Chekhov
Os Malefícios do Fumo. Luciana
Carnieli encerra a programa-
ção, dia 18 de julho, com a peça
de sua autoria e direção, Meu
Abajur de Injeção , homenagem à
grande atriz Cacilda Becker. Os
ingressos são gratuitos e limita-
dos. Interessados podem se ins-
crever via plataforma @vi-
vo.cultura, no Instagram.

Itaú Cultural. Mantém o Palco
Virtual, espaço fixo em sua gra-
de online de programação, que
exibe espetáculos teatrais em ví-
deo. Um dos destaques é Fim de

Jogo , de Samuel Backett, que o
ator e autor Renato Borghi gra-
vou em sua casa e que será exibi-
do em episódios no site do Itaú
Cultural, entrando no ar de 3 a 7
de julho. A programação come-
ça dia 26/6, com Viúvas – Perfor-
mance Sobre a Ausência , da Tribo
de Atuadores Ói Nóis Aqui Tra-
veiz, e continua com A Borra-
cheira , do rondoniense O Imagi-
nário (dia 27), e Frida Kahlo –
Viva La Vida (dia 28), do Teatro
do Ornitorrinco.

Marat Descartes. O ator ence-
na, de sua casa, Peça, de sua auto-
ria e com direção de Janaina Lei-
te, em que discute o contexto
sociopolítico do Brasil durante
o isolamento social. De 5ª a do-
mingo, às 21h, até 31 de julho.

Basta acessar gratuitamente
youtube/corporastreado.

Ivo Müller. Ator encena dois es-
petáculos na internet: Rilke , ba-
seado no poeta checo Rainer
Maria Rilke (segundas-feiras,
às 21h, no Instagram @ivoomul-
ler), e Caja Chinas , experiência
virtual que flerta com cinema e
teatro (quintas-feiras, às 22h,
na plataforma Zoom).

Sesc. Já faz um mês que man-
tém a série Teatro #EmCasa-
ComSesc. Exibe toda segunda,
quarta, sexta e domingo, às
21h30, um monólogo ao vivo, di-
reto da casa dos artistas. As
transmissões acontecem no ca-
nal @SescAoVivo no Instagram
e na página do SescSP no You-

Tube. Vale conferir também o
importante acervo teatral do
Sesc, que traz, entre outras rari-
dades, peças dirigidas por Antu-
nes Filho.

Teatro Musical. O projeto Va-
mos Invadir a Sua Casa propõe
um bate-papo virtual com artis-
tas, que relembram como foi
participar de determinados es-
petáculos. Trata-se de uma
união do Teatro Riachuelo e do
Teatro Prudential, ambos do
Rio, a fim de arrecadar fundos
para uma instituição do Rio de
Janeiro. Os encontros são reali-
zados às terças e quintas-feiras,
sempre às 20h, na página do Ins-
tagram dos dois teatros. Na pro-
gramação, Vamp , com Ney La-
torraca e Cláudia Ohana (dia
23), Bossa Nova , com Cláudio
Lins e Ariane Souza (25) e 2 Fe-
ras Perigosas , com Dhu Moraes
e Sandra Pêra (30). / U.B.

Crônicas de SP*


T


enho medo de não mudar.
Na verdade, eu sei que não
vou mudar. Quando tudo is-
so acabar, não terei um novo eu pa-
ra exibir ao mundo.
Alguém há de perguntar: como a
quarentena mudou a sua vida? Vou
coçar a cabeça e começar a enume-
rar coisas como “ganhei uns quili-
nhos, uma dor nas costas, aprendi a
usar o zoom meeting...”

Mas não, não basta, o perguntador
vai querer tripudiar da minha superfi-
cialidade e moer e remoer algum grão
de profundidade.
A pressão para transformar o isola-
mento social na “grande experiência
das nossas vidas” vai me agarrar pelo
sovaco e me exibir feito um pequeno
Simba indefeso (todo mundo aqui viu
O Rei Leão , né?): “Vai, Gilberto! Conte
ao mundo sobre sua grande transfor-

mação...”
“Hum, deixa eu ver... Bom, veja-
mos, eu diria que usar vinagre para
tirar manchas do sofá foi um aprendi-
zado e...”
Esse pequeno Simba indefeso que
vos escreve vai ser largado ao relento
por não ter nada remotamente maravi-
lhoso para contar. Vou perder pontos
na escala social por não ter encontra-
do o meu novo eu. Pois é, não achei.
Meu novo eu deve andar com aquela
fantasia de Groucho Marx, com o con-
junto de óculos, nariz e bigode. Meu
novo eu deve se esgueirar pelos cantos
e se esconder atrás das pilastras. Meu
novo eu deve mudar a voz ao falar ao
telefone ou ter adotado um nome ar-
tístico qualquer.

Ou seja: meu novo eu não está afim
de ser encontrado.
Vou ter apenas meu velho eu para
passear por aí quando a pandemia da
covid-19 acabar. Sem um novo jeito de
enxergar a vida, sem a luz de alguma
religião, sem aprender um novo idio-
ma, sem ler James Joyce, sem mudan-
ças profundas naquilo que eu já tinha
para apresentar lá no início do ano.
Em minha defesa, até um impostor
como eu merece alguma defesa, digo
que, talvez, meu novo eu apareça por
aqui exatamente depois que tudo isso
acabar.
Talvez o meu Groucho Marx de ócu-
los, nariz e bigode apareça quando pu-
der sentar-se em uma mesinha bamba
de bar, quando puder ficar espremido

no assento do meio de um avião,
quando tiver carnaval e ele puder
cruzar um bloquinho atrás de um
banheiro químico – e sair dele se-
cando as mãos na própria bermuda.
Meu novo eu só vai dar o ar da
graça (ainda que de óculos, nariz e
bigode) quando puder reclamar de
baladas lotadas, da molecada fazen-
do barulho no cinema ou das via-
gens de ônibus percorridas em pé.
Meu novo eu quer um abraço. E es-
sa, provavelmente, é a condição pa-
ra que ele floresça.
No fundo, o meu novo eu é um
saudosista. Talvez ele ainda espere
pela volta do velho normal. Ou
aguarde até esse novo normal enve-
lhecer um pouquinho.

Ubiratan Brasil


O ator Marcelo Serrado prepara-
se para retomar um desejado hábi-
to: o de representar em um tea-
tro. A partir do dia 4 de julho, ele
subirá no palco do Teatro Petra-
Gold, no Rio, às 17 horas, para
apresentar seu monólogo Os
Vilões de Shakespeare
. A rotina vai
se repetir aos sábados e domin-
gos de julho até o dia 19 e, diante
dele, estarão apenas três câme-
ras, uma pessoa na plateia e um
técnico na cabine. “Mas, pela in-
ternet, poderei ter até no máximo
mil espectadores assistindo ao vi-
vo”, festeja ele. “Alguém que esti-
ver tão distante (em Roraima, por
exemplo) poderá acompanhar.”
O espetáculo, que Serrado es-
treou em 2017, dá início ao proje-
to Teatro Já, criado pela atriz
Ana Beatriz Nogueira e pelo ator
e gestor do espaço André Jun-
queira. Com uma programação
online que vai se estender até o
fim do ano, o projeto tem como
novidade a presença dos artistas
no palco no momento da atua-
ção, uma vez que boa parte das
peças apresentadas atualmente
na internet mostra cada intér-
prete em sua casa (leia abaixo).
As encenações poderão ser
vistas pela plataforma de strea-
ming Zoom, que comporta até
mil pessoas ao mesmo tempo.
Os ingressos, no valor de R$10,
podem ser adquiridos pelo site
do Teatro PetraGold ( teatrope-
tragold.com.br). Ao comprar
um ingresso, a pessoa recebe
um link de acesso com data e
horário específicos para uso
apenas nesse dia e hora. “Parte
do valor arrecadado será desti-
nado aos profissionais que não
estão trabalhando graças às pan-
demia”, conta Ana Beatriz.
O risco do contágio, aliás, de-
terminou regras de segurança.
“Tomamos todos os cuidados
para evitar contatos e proximi-
dades”, explica a atriz. “Enquan-
to os atores acessarão uma en-
trada pela garagem do teatro
que leva diretamente ao cama-
rim, os técnicos chegarão por ou-
tro caminho, evitando contato.”
O monólogo de Serrado, na ver-
dade, vai dar a largada de uma
ampla programação, que vai ocu-
par todas as tardes do Petra-
Gold: o cronograma já conta
com 14 peças, entre solos, shows
musicais e, cereja do bolo, apre-
sentação de textos inéditos. “Pa-


ra começar, convidamos quem
já tinha espetáculos montados,
mas teremos novidades: pedi
aos amigos que desengatassem
projetos não realizados para fi-
nalmente serem encenados.”

Com isso, foi possível elabo-
rar uma programação diversifi-
cada e intensa: enquanto Serra-
do ocupar o horário dos sába-
dos e domingos de julho, a pró-
pria Ana Beatriz assume o palco

às terças e quartas para encenar
o monólogo Um Dia a Menos ,
inspirado no conto de Clarice
Lispector. As quintas-feiras es-
tão reservadas para Paulo Betti
e seu solo Autobiografia Autori-

zada , enquanto Emilio Orciollo
Netto leva seu Também Queria
te Dizer às sextas. Todos espetá-
culos ocorrem às 17h e, como se
trata de uma temporada, quem
não conseguiu assistir à apre-
sentação de um determinado
dia, terá outros como opção – o
mesmo formato que existia an-
tes de a pandemia paralisar as
casas de espetáculo.
Ana Beatriz e André Junqueira
reservaram as segundas-feiras
para a música. “Fiquei sensibili-
zada com a história do violonista
e arranjador Luis Filipe de Lima,
que colocou à venda seu violão
de sete cordas para poder pagar
juros bancários”, explica a atriz.
“Nós o convidamos para organi-
zar encontros musicais e ele lo-
go elaborou a programação.”
Assim, no dia 6 de julho, Luis
Filipe recebe Soraya Ravenle pa-
ra a releitura dos sucessos de Do-
lores Duran, Carmen Miranda e
Isaurinha Garcia, cantoras fun-
damentais da MPB. Na semana
seguinte, dia 13, Verônica Sabi-
no revisita a vasta obra de Marti-
nho da Vila, enquanto que, no
dia 20, Soraya Ravenle está de

volta, ao lado de Marcos Sacra-
mento, para reviver o espírito do
teatro de revista. Na última se-
gunda-feira de julho, Luis Filipe
terá Inez Viana como parceira
de palco para interpretar o reper-
tório de Lupicínio Rodrigues, re-
ferência do samba-canção.
“Nesse dia, eu ficarei na pla-
teia”, diz Ana Beatriz, que prefe-
riu sempre deixar um convidado
no lugar normalmente reservado
ao público. “É uma forma de os
artistas saberem que há alguém
ali, assistindo à sua atuação e re-
presentando o público que esta-
rá na internet. Pode parecer tris-
te fazer espetáculo para uma só
pessoa, mas, como já passei por
isso, sei que a determinação do
artista tem de ser a mesma.”
Textos inéditos serão apre-
sentados a partir de agosto, co-
mo Leonilson (Sob o Peso dos
Meus Amores) , em que Arlindo
Lopes retrata o artista plástico.
Ana Beatriz encena, em setem-
bro, Eu Vou! , texto de Zélia Dun-
can, enquanto Lilia Cabral vai
dividir o palco com a filha, Giu-
lia Bertolli, para uma peça que
ainda não tem título.

Renato Borghi. Ele encena
‘Fim de Jogo’, de Beckett

RAFAEL ARBEX /ESTADÃO

Serrado. A partir de 4 de julho, ator interpretará o monólogo ‘Os Vilões de Shakespeare’ direto do palco do Teatro PetraGold, no Rio, aos sábados e domingos

AMANDA PEROBELLI /ESTADÃO – 24/2/2018

Óculos, nariz


e bigode


GILBERTO AMENDOLA

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