JornalValor--- Página 6 da edição"23/06/20201a CADB" ---- Impressa por cgbarbosaàs 22/06/2020@21:26:47
B6| Valor|Te rça-feira, 23dejunhode 2020
Empresas
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S e r v i ç o s &Te c n o l o g i a
IMPACTOSDO
CORONAVÍRUS
Empresas
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Te n d ê n c i a s & C o n s u m o
.
CenárioCrescimentofoipuxadopelasáreasdesaúde,alimentosetecnologia
Sertrading amplia nível
de importação e clientes
LucianoSapata,daSertrading:maioriadosclientesfoi beneficiado pelapandemia
CAROLCARQUEJEIRO/VALOR
CibelleBouças
DeSãoPaulo
A pandemia de covid-19 pres-
sionou diversossetores econômi-
cos no mundo, contribuindopa-
raumaquedanoProdutoInterno
Bruto (PIB) de 5,2% no mundo e
de 8% no Brasil em 2020, de acor-
do com estimativas do Banco
Mundial. Mas, paraaSertrading,
umadas três maiorestradings de
importaçãodo país, apandemia
foiumestimulanteaosnegócios.
Acompanhiaampliouacarteira
de clienteseonível de importa-
ções durante a pandemia. No pri-
meirosemestre,aSertradingrelata
um crescimento de 80% na receita
em relação ao mesmo período de
2019,totalizando R$ 2,25bilhões.
As importações cresceram 59,5%,
paraR$3,35bilhões.
Para o ano de 2020, acompa-
nhiaprevê um faturamentocom
importaçõesdeR$10bilhões,ante
R$ 6,5 bilhões no ano passado —
um aumento de 53,8%.Are ceita lí-
quida está estimadaem R$ 4,5 bi-
lhões, ante R$ 2,8 bilhões no ano
anterior,umavançode60,7%.
“Em torno de 75%dos nossos
clientes foram até beneficiados
pelapandemia”, disseLucianoSa-
pata, vice-presidenteesócio da
Sertrading. Os clientes aque ele
se refere são dos setores de ali-
mentos, higiene elimpeza, pro-
dutos médico-hospitalares, far-
macêuticos, tecnologia e quími-
cos.Acarteiraincluigruposcomo
Ambev, Procter&GambleeCisco.
ASertrading importa produtos
sobencomendaparaaproximada-
mente 100 multinacionais egran-
des grupos brasileiros. A compa-
nhia atende maisde 12 setores da
economia. Sapata disse que o
maiorcliente da trading responde
por 7% das suas importações to-
tais.“Pornãotermosconcentração
em um setor específico, como a
maioriadas tradings, consegui-
mos um desempenho positivo du-
ranteapandemia”, disseSapata.
Acategoriaque maiscresceu
em importaçõesneste ano foi a
de produtosfarmacêuticos.Ou-
tro segmentocom aumentoim-
portantenas importações é o de
aviaçãoexecutiva.
Alfredode Goeye, presidente e
fundadorda Sertrading,disse que
nesteano importouR$ 1,4 bilhão
em aviões,montante 50%superior
aosR$920milhõesmovimentados
noanopassado.Essesaviõeseheli-
cópteros foram encomendados no
segundo semestre do ano passado
e, segundoo executivo,não houve
cancelamentos de pedidos.As en-
comendas são feitaspor grandes
gruposde varejo, cujos executivos
viajamcom frequência, empresas
detáxiaéreo,entreoutras.
“Neste ano, com as dificuldades
enfrentadas pelosetor aéreo,as
empresas e famílias que pensam
em trocar de avião devem poster-
garasencomendasparaoutromo-
mento”, afirmou Goeye, que prevê
um ritmo maislentopara o setor
de aviação executiva apartir do se-
gundosemestredesteano.
Produtos de tecnologia, como
notebooks e equipamentos de re-
de de telecomunicações,suple-
mentos alimentareseitens de hi-
gienee limpezatambém tiveram
crescimentos importantesduran-
te a pandemia, segundo Sapata.
“Vejo umatendência de cresci-
mento gradual desses setores”,
afirmouo vice-presidente. Ocres-
cimentodeimportaçõesdessasca-
tegoriascompensouaretraçãonas
áreasdecosméticos,vestuário,me-
tais,automotivoeconstrução.
Goeyedisseque a maioriadas
importaçõeschegamao Brasilde
navio.Porisso,acrisedosetoraé-
reo influencioupoucoas impor-
tações da companhia. “Houve
atrasosemcontêineresvindosda
Chinaem janeiro,mas isso já foi
contornado”,afirmou.
O crescimento na receita da
companhia virá do aumentode
importações de clientes e da alta
do dólar, quefavorece aconversão
parareais. “A alta do dólarpara
quaseR$6trouxeumganhotem-
porário.Masseprevalecessenesses
patamaresosimportadoresteriam
problemasemtrazerosprodutose
isso nos afetaria. Agoraparece que
ocâmbio está se acomodando”,
disse Sapata. O executivo conside-
rou que odólar aum patamaren-
tre R$ 4,60 e R$ 4,80 possibilita im-
portaçõesapreçoscompetitivos.
Alémdos ganhoscom avaria-
ção cambial,aSertrading am-
plioua carteiranesteano, com
oito novosclientesdos setores
farmacêutico,detecnologia,quí-
micoedeaviaçãoexecutiva.
EstratégiaFaturamentoglobaldosetordeveencolherentre27%e30%nesteano,calculaaMcKinsey
Grifes de moda tentam se reinventar
LaurenIndvike LeilaAbboud
FinancialTimes,deLondrese Paris
O fim gradual do confinamen-
to na Europae nos EstadosUni-
dos está proporcionandootão
necessáriorespiroparaos vare-
jistasde moda. No entanto, em
todoosetor, das lojas de descon-
tos às marcasmaisluxuosas, o
impacto da covid-19tem sido se-
vero, vergandoum mercado que
depende das cadeiasglobais de
fornecimento, níveis saudáveis
de gastosarbitrários, do turismo
edaslojasfísicas.
Em NovaYork, Dianevon Furs-
tenbergpercebeuque apande-
mia tinhapotencial paraamea-
çar de extinçãoamarca que leva
seunome.Quasetodasassuaslo-
jas estavam fechadas e varejistas
estavam cancelando pedidosdos
coloridosvestidostranspassados
que fizeramda estilistaamerica-
naumnomeconhecido.
Comestoqueparadoeuma
criseno fluxode caixa, Dianevon
Furstenberg decidiu demitir
maiorpartede seus funcionários
e fechartodasas lojasoperadas
diretamente, com exceção de
umano MeatpackingDistrictde
NovaYork. Em sua novaencarna-
ção, aDFV provavelmente conti-
nuarávendendo pela internet e
permanecerá na Chinapor meio
deumacordodefranquiaquein-
cluimaisde30lojas.
O coronavírus “me forçou a re-
posicionar um modelo de negó-
ciosquenãoémaisrelevante”,diz
von Furstenberg. “Por maisdifícil
queseja,étambémumcomeço.”
A consultoriaMcKinseyprevê
que aindústriaglobalda moda
(roupas e calçados),que movi-
mentaUS$ 2,5 trilhões, vai enco-
lherentre27%e30%em2020,en-
quanto o setordeartigosde luxo
—incluindo moda,acessórios,
relógios,joias e produtosde be-
leza —será aindamaisduramen-
te atingido,com as vendascain-
do entre35% e 39%. “Os varejistas
multimarcas endividados e as
marcasindependentesruinsde
caixa”, são as maisameaçadas,
afirma a consultoria.Decorridas
poucassemanasna paralisação
causadapela covid-19
Alémda quedada demanda, o
setor tentadesesperadamente se
adaptaràmaneiracomoapan-
demia mudouas preferências do
consumidor em direção ao “me-
nos é mais”.Como muitaspes-
soas se viramtrabalhando de ca-
sa, a demanda mudou pararou-
pasparaapráticadeyogaecalça-
dospararecreação,comoostênis
decorridaeBirkenstocks.Masse-
rá que o visual casualvai se man-
ter quandoas conferênciaspelo
Zoomcederemespaçoparaosal-
moçosdetrabalho?
Em nenhumlugar a pandemia
foi tão nociva quanto paraas
grandes marcasdo ReinoUnido,
muitas das quaishá anosse en-
contrama beirade uma crise de
insolvência.Desdequeogoverno
britânicofechouocomérciocon-
sideradonão essencialna meta-
de de março, maisde uma deze-
na de redesentraram em regime
de recuperaçãojudicial,comoa
Debenhams,Oasi,acontrolado-
ra da Warehouse (Aurora
Fashions), Laura Ashley,Cath
Kidston, Monsoon(donada Ac-
cessorize)eQuis.
NosEUA,aolongodosúltimos
quatromeses, as lojasde depar-
tamentosNeimanMarcuseJC
Penney pediramproteção contra
os credores.EmpresascomoPVH
Corp, controladora da marca
TommyHilfiger, eaGap registra-
ram prejuízos operacionais de
maisde US$ 1 bilhão cada no pri-
meirotrimestre.
As mesmasdificuldadestêm
sido vistasno mundo todo. Este
mês a Inditex,controladora da
Zara, anunciouque vai fecharaté
1,2 mil pontosde venda,embora
o conglomeradoespanhol tam-
bém tenharegistradoum cresci-
mentode 50% nas vendason-line
no primeirotrimestre. Acompa-
nhiaacreditaque a internetres-
ponderápor maisde um quarto
das vendastotaisaté 2022,com-
paradoa14%nofimde2019.
Para os fornecedores de fast-
fashion pela internet, como a bri-
tânicaBoohoo, acrise vemapre-
sentando uma raraoportunidade.
Em maioacompanhia captou 200
milhõesde libraspara comprar
ativos de empresasem dificulda-
des, adquirindo a Oasise a Wa-
rehousepor5,25milhõesdelibras,
alémdos34%daPrettyLittleThing
queaindanãocontrolava.
Comas novasmarcasem seu
balanço,esperaum crescimento
das vendasde 25% no ano atual
ano fiscal.Entretanto,algunsva-
rejistas on-line passaram um
maubocadodurante o“lock-
down”. Os negóciosda Net-a-
Porter sofreramum durogolpe
depoisque acompanhiadecidiu
fecharseus centrosde distribui-
ção nos EUAenoReinoUnido
por cercade um mês para prote-
gerosfuncionários.
Outrastêm sido lentasou in-
capazes de transferirnovospro-
dutospara seus sites na internet,
enquanto os altoscustosde lo-
gística impõem uma pressão
adicional sobrenegóciosque já
não são lucrativos.
AMytheresa,de Munique,
umavarejistaon-linede artigos
deluxo,foiumadaspoucascapa-
zes de manteras operações em
funcionamento duranteo “lock-
down”.Emboraas vendasconti-
nuemfracas,a empresavem re-
gistrando uma“forterecupera-
ção” na Coreiado Sul, Chinae
Taiwan, segundoopresidente
executivoMichaelKliger.
Umadas poucasáreasdo setor
a prosperar tem sido a de sites de
revenda,umavez que os consu-
midoresestãoprocurandomeios
maisbaratossuprirsua necessi-
dadedemoda.
Desdeabril,o aplicativode ar-
tigosde segunda mão Depopre-
gistraum “crescimentode três
dígitosano sobreano”, com seu
uso tendo crescido 150% no
mundo. Para o concorrente ame-
ricanoPoshmark,aterceirase-
manade abrilfoi a de maiores
vendasdetodosostempos.
O problemaimediatocom os
“lockdowns”foi aindamaispro-
nunciadoparaasmarcasdeluxo,
umavezqueelasdependemdas
lojasfísicaspara até 95% de suas
vendas,segundoanalistas.
A pandemianão só teve um
custopsicológicosobreos con-
sumidores de artigos de luxo,
que tendemaesbanjarquandoa
economia estásaudável, como
tambémacaboucom as viagens
internacionais,que são a chave
docrescimentodosetor.
As maiorescompanhiasestão
melhor posicionadas para su-
portaro que algumastemempo-
derá ser um período prolongado
de demandareprimida.LVMH,
Kering,ChaneleHermèstêm ba-
lançossólidos.Mas isso poderá
ser maisdifícil paraas marcas
maisjovenseindependentesque
não possuemsuas própriasredes
de lojas,e aquelasenvolvidas em
processosde recuperação, como
aSalvatoreFerragamoe aBur-
berry, especialmentese elas esti-
veremendividadas.
Os grandesconglomerados, já
substancialmentemaioresdesde
a últimarecessão, ficarãoainda
maioresàmedidaque foremau-
mentandosuas participações de
mercado e seusportfólios.Os
analistasacreditamque a ativi-
dadede fusõeseaquisiçõesno
setorde artigosde luxoperma-
necerárelativamentecalmano
curtoprazo,mas omercadode-
verá ser “in undado” por empre-
sas comproblemasfinanceiros
no segundosemestre,segundo
afirmaMarioOrtelli,sócio-ge-
renteda Ortelli& Co, umacon-
sultoriadefusõeseaquisições.
ErwanRambourg, diretorde
análisesde consumo e varejodo
HSBC,prevêque odeclíniodas
vendasatinjaofundodopoçono
segundotrimestreeumarecupe-
raçãofirmeocorrano segundo
semestredoano.
BrunelloCucinelli,fundador
da marcade artigosde cashmere
de luxo que leva seu nome,acre-
dita que a recuperaçãovirá mui-
to maiscedoparaa companhia
listadana Bolsade Valoresde Mi-
lão. Aempresaevitoudemissões
até agoraejá está vendouma de-
mandarenovadanaChina.
“Éramos 2 mil pessoasantes
do lockdownesomos2 mil pes-
soas hoje”, diz ele.. Embora o se-
gundotrimestretenhasido “do-
loroso”, ele esperaum segundo
semestrepositivo.
Mesmo depoisdos confina-
mentosforçadospelapandemia,
as marcas de luxocontinuam
avessasaentrarrapidamenteno
comércio eletrônico por teme-
rem um desgasteda experiência
deexclusividade.
Embora algumas marcasco-
moLouisVuittoneGucciestejam
maisativason-line do que no
passado, aindahá grandesmar-
cas relutantescomo a Chanel. A
casa de modade capitalfechado
francesanãocederáemsuaestra-
tégiade proibira vendapela in-
ternetde tudoque não seja per-
fumeecosmético.
“Não pretendemos vendermo-
da, relógiose joiaspelainternet”,
afirmouo diretor financeiro da
Chanel, PhilippeBlondiaux. “Con-
tinuamosconvencidos de queas
relações pessoaisentre oconsultor
de modae o cliente continuarão
sendoaparte centraldaexperiên-
ciacomosartigosdeluxo.”
A China,que já é o mercadode
artigosde luxoque maiscresce,
se tornaráaindamaisvital para o
sucessoda marca.Isso terá um
impactosobreasredesdelojas—
que vão crescerna medidaem
que os consumidoreschineses
passaremafazer maiscompras
emseupaís—enodesign.
Algunscríticospreveemo re-
tornodo minimalismoe de um
luxomaisdiscreto, mas outros
afirmam que essastendências
nãorepercutirãonaChina.“Acho
engraçadoquandoalguémme
dizqueaslogomarcasestãomor-
tas”,diz Rambourgdo HSBC.“Is-
so é um comentáriomuitooci-
dental.É muitobom se expressar
[estilisticamente] na China,ter
produtosde marcaque sejamlu-
minosos,intensosealegres.”
OestilistabritânicoPaul Smi-
th, cuja companhiafaz 50 anos
em 2020,não está preocupado
com ocenário descrito pelos
analistas.Ele, que mantevea loja
de Nottinghamabertadurantea
grevedos mineradoresna déca-
da de 70, quandonão havia ele-
tricidadeem maisde metadeda
semana,reabriuquatro de suas
cincolojasna França.“Sempre
haverá demandaparaum terno
bem-feito.Muitagentequegosta
de roupasvai quererse ves-
tirnovamente”, diz.
Dianevon Furstenberg: demissões,lojasfechadasemNovaYo rke novocomeçoemmodelodenegóciodiferente
MATTHEWSTAVER/BLOOMBERG