O Estado de São Paulo (2020-06-23)

(Antfer) #1

%HermesFileInfo:B-3:20200623:
O ESTADO DE S. PAULO TERÇA-FEIRA, 23 DE JUNHO DE 2020 Economia B3


Idiana Tomazelli / BRASÍLIA


Num momento de forte eleva-
ção de gastos e do endividamen-
to público para mitigar os efei-
tos da pandemia do novo coro-
navírus sobre a economia, a dis-
cussão sobre eventual mudan-
ça na âncora fiscal perseguida
pelo governo brasileiro poderia
tirar o foco dos esforços de apro-
vação das reformas necessá-
rias, afirma o subsecretário da
Dívida Pública do Tesouro Na-
cional, José Franco de Morais,
em entrevista ao Estadão/Broad-
cast.

O alerta é dado em meio ao
crescente debate sobre a susten-
tabilidade do teto de gastos, me-


canismo que limita o avanço
das despesas à inflação e hoje a
“superâncora” do governo bra-
sileiro na sinalização de com-
promisso com o ajuste fiscal, e
sobre a conveniência de alterar
a regra fiscal para prever uma
meta de dívida pública.

Um dos pais da Lei de Respon-
sabilidade Fiscal (LRF), o eco-
nomista José Roberto Afonso é
um dos que defendem adoção
de uma meta de dívida pública,
associada a um teto de gastos
mais flexível. Para ele, a nova
regra sinalizaria a investidores

um compromisso “crível” com
a reorganização das contas pú-
blicas, uma vez que há risco de
descumprimento do teto fiscal
nos próximos anos.
O Tesouro, por sua vez, acre-
dita ser mais produtivo neste
momento centrar poder de fo-
go na articulação pela aprova-
ção das reformas que podem
combater o verdadeiro proble-
ma: o crescimento acelerado de
despesas obrigatórias, aquelas
que o governo não pode cortar
por conta própria e precisa do
aval do Congresso Nacional pa-
ra revisar.

Medidas. “O problema não é a
regra fiscal em si, o desafio é to-
mar as medidas necessárias que
reforcem o processo de consoli-
dação fiscal. Isso vai ter de acon-
tecer independentemente do fa-
to de termos um limite para a
dívida ou um limite para os gas-
tos”, afirma Franco. “O Tesou-
ro está concentrado em tomar

medidas para cumprir o teto de
gastos, que é a âncora fiscal que
nós temos hoje”, diz ele, refor-
çando que não há nenhum deba-
te dentro do órgão para alterar a
regra fiscal.
Neste ano, a dívida bruta de-
ve sair de 75,8% do PIB para
93,5% do PIB, segundo a última
projeção do Ministério da Eco-
nomia. O patamar é considera-
do elevado para países emergen-
tes como o Brasil, daí a necessi-
dade de sinalizar compromisso
com a agenda de reformas, in-
cluindo a tributária, a adminis-
trativa (que mexe no ‘RH’ do
serviço público) e as privatiza-

ções (cujos recursos da venda
podem ser usados para abater
dívida).
Segundo o subsecretário, um
limite para a dívida pública, a
depender de como for desenha-
do, poderia até mesmo amarrar
as ações do Banco Central no
controle da inflação. Quando o
BC vende títulos da dívida públi-
ca (com compromisso de re-
compra após um período) para
enxugar liquidez de recursos
no mercado, as chamadas ope-
rações compromissadas, isso
eleva a dívida bruta do governo.
Se esse indicador tiver um teto,
o BC poderia, em tese, ficar im-
pedido de atuar para cumprir
sua missão de manter a estabili-
dade do poder de compra da
moeda.
Economistas do mercado fi-
nanceiro e a Instituição Fiscal
Independente (IFI) do Senado
advertem para o risco de o teto
de gastos estourar já em 2021,
caso não haja avanço na agenda
de reformas. O Tesouro, po-
rém, prevê que o limite para as
despesas será cumprido em
2021 e 2022.

DE VEÍCULOS - 11H


LEILÕES DIÁRIOS


SOMENTE ONLINE. ENVIE SEU LANCE:
WWW.SODRESANTORO.COM.BR

VOLKSWAGEN 19.370 CLM T 4X2 10/10 - 24/06

VOLVO XC60 2.0 T5 MOM 16/17 - 25/06

VOLKSWAGEN 19.370 CNM T 4X2 07/08 - 24/06

RENAULT LOGAN 1.0 16V 10/10 - 26/06

FIAT DOBLO ESSENCE 7L E 18/18 - 24/06

FORD FOCUS 1.6 FLEX HA 07/08 - 26/06

Mercado ajusta


para 6,5% recuo


do PIB este ano


PANDEMIA DO CORONAVÍRUS


l Alta demanda


Teto flexível. Afonso defende uma meta para dívida pública

Tesouro descarta mudar âncora fiscal e insiste nas reformas


Amanda Pupo / BRASÍLIA


Com a expectativa de que a
pandemia leve a uma onda re-
corde de pedidos de recupera-
ção judicial pelas empresas,
cresce a preocupação de que
o Poder Judiciário não dê con-
ta dessa nova demanda.

Com atuação no Superior Tri-
bunal de Justiça (STJ) focada
em Direito Privado, o ministro
Luis Felipe Salomão defende
ser preciso “achatar” essa cur-
va de procura pela Justiça, a
exemplo do que se tenta fazer
no sistema de saúde. Por isso, o
ministro encabeça uma propos-
ta de recomendação para que
tribunais do País estruturem
centros de mediação específi-
cos para causas empresariais,
pedidos de recuperação judi-
cial e falência. Esses espaços
funcionariam como uma es-
pécie de filtro, com o objetivo
de evitar que as empresas en-
frentem, de fato, processo judi-
cial, sobrecarregando um siste-
ma que já trabalha no “limite”,
pontua o ministro.
Na prática, um pedido de re-
cuperação judicial feito por
uma empresa, por exemplo, se-
ria encaminhado anteriormen-
te para um ambiente de negocia-
ção. Salomão lembra que a legis-
lação já oferece ferramentas pa-
ra essas situações, como a pró-
pria lei da mediação.
“É uma situação de emergên-
cia. São espécies de ‘hospitais
de campanhas’ para enxugar
essa taxa ( de demanda do Judi-
ciário)
. Se não, perdem todos,
o credor, o devedor, e a socie-
dade, que perde empregos, ge-
ração de empregos, tributos. É
preciso fazer alguma coisa”,
disse o ministro ao Esta-
dão/Broadcast.

Para a ideia ser concretizada,
a recomendação precisa ser
aprovada pelo plenário do Con-
selho Nacional de Justiça
(CNJ), onde já funciona desde
2018 um grupo de trabalho cria-
do para melhorar o ambiente
de recuperação judicial no Bra-
sil. Salomão coordena esse co-
mitê e, segundo ele, a proposta


será discutida em reunião na
próxima segunda-feira, quan-
do mais detalhes serão acerta-
dos. Em março, o grupo já foi
responsável por aprovar no
CNJ resolução para orientar o
trabalho dos juízes em proces-
sos de recuperação judicial em
meio à crise.

Rapidez. Apesar de já tramitar
no Congresso Nacional um pro-
jeto de lei que cria um Sistema
de Prevenção à Insolvência, Sa-
lomão defende que o Judiciário
não fique na expectativa e tome
desde já uma providência. O se-
tor já trabalha com números

consideradas preocupantes. A
previsão é de que o Brasil supe-
re os pedidos de recuperação ju-
dicial de 2016, quando o País te-
ve recorde com cerca de 1.800
casos. Sócio da ARM Gestão,
Marcus Vasconcellos estima
que, só neste ano, o Brasil deve
ter pelo menos 2.500 pedidos
de recuperação judicial.
“Vai causar o caos dentro do
sistema judicial, com essa ava-
lanche de demandas. É uma rea-
lidade bastante similar ao que
estamos vendo na saúde públi-
ca, guardada as proporções, lá
se lida com vidas. Mas aqui, em
certa medida, cada processo

contém também a vida das pes-
soas, é o patrimônio, é modo de
viver delas”, avalia Salomão.
Especialista na área, Vascon-
cellos se diz preocupado com a
alta demanda que o Judiciário
vai enfrentar. Ele aponta que ne-
nhuma medida concreta foi to-
mada até o momento para evi-
tar um colapso. Em sua avalia-
ção, a ideia de se estruturar es-

paços preventivos no Judiciá-
rio é “louvável” e deve ser feita.
Ele pondera, no entanto, que
essa solução sozinha não vai se-
gurar o volume de ações que
chegarão no Judiciário. Para
Vasconcellos, as mediações pré-
vias devem ser mais efetivas pa-
ra as empresas menores, que
normalmente não dispõem de
um aparato técnico para resol-

ver os problemas financeiros
extrajudicialmente.
Salomão também entende
que serão esses os negócios
mais beneficiados com a medi-
da, se implantada. O ministro
do STJ recorda que são justa-
mente essas empresas que es-
tão enfrentando dificuldades
para tomar empréstimos na
crise.

Relator tenta acordo sobre marco do saneamento. Pág. B4}


l Teto é o alvo
“O Tesouro está
concentrado em tomar
medidas para cumprir o
teto de gastos.”
José Franco de Morais
SUBSECRETÁRIO DA DÍVIDA PÚBLICA

DIDA SAMPAIO/ESTADÃO

“É uma situação de
emergência. São espécies de
‘hospitais de campanhas’
para enxugar essa taxa (
de
demanda do Judiciário
).”
Luis Felipe Salomão

MINISTRO DO STJ


Fabrício de Castro / BRASÍLIA

Os economistas do mercado fi-
nanceiro alteraram levemente
suas projeções para o Produto
Interno Bruto (PIB) em 2020.
Segundo o Relatório de Merca-
do Focus, a expectativa para a
economia este ano passou de re-
tração 6,51% para queda de
6,50%. Para 2021, foi mantida a
estimativa de alta de 3,50%.
Na semana passada, o BC in-
formou que seu Índice de Ativi-
dade (IBC-Br) recuou 9,73%
em abril ante março, na série
com ajustes sazonais. Foi o
maior recuo da história em um
único mês.
Os economistas também ajus-
taram a previsão para o IPCA, o
índice oficial de preços, deste
ano, passou de alta de 1,60% pa-
ra 1,61%. A projeção para o índi-
ce em 2021 seguiu em 3,00%.
Essa projeção está bem abai-
xo do centro da meta de 2020,
de 4,0%, sendo que a margem
de tolerância é de 1,5 ponto por-
centual para mais ou para me-
nos (índice de 2,50% a 5,50%).
No caso de 2021, a meta é de
3,75%, com margem de 1,5 pon-
to (de 2,25% a 5,25%). Há duas
semanas, o IBGE informou que
o IPCA recuou 0,38% em maio.
No acumulado do ano, a taxa es-
tá negativa em 0,16%.
Na esteira da última decisão
de política monetária do Banco
Central, os analistas mantive-
ram suas projeções para a Selic,
a taxa básica de juros, no fim de
2020 em 2,25% ao ano.

Crescimento acelerado


de despesas obrigatórias


é o verdadeiro problema


a ser combatido, afirma


subsecretário da dívida


Detalhes. Segundo o ministro Salomão, proposta será discutida na próxima segunda-feira

STJ quer achatar


‘curva’ de pedidos de


recuperação judicial


Ministro Luis Felipe Salomão defende que tribunais pelo País


criem centros de mediação específica para causas empresariais


TIAGO QUEIROZ/ESTADÃO - 9/10/2012
Free download pdf