O Estado de São Paulo (2020-06-24)

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A10 QUARTA-FEIRA, 24 DE JUNHO DE 2020 O ESTADO DE S. PAULO


Estudo indica 1,16 milhão de infectados


em SP; mortalidade é o triplo na periferia


José Maria Tomazela


Após três meses de veto por cau-
sa da pandemia, a Justiça libe-
rou o acesso de veranistas pelo


serviço de balsas a Ilhabela, um
dos principais destinos turísti-
cos do litoral norte paulista. A
decisão, em caráter liminar,
considerou decreto da prefeitu-
ra, que flexibilizou atividades
comerciais e permitiu acesso a
praias de até duas pessoas por
vez. A prefeitura diz acatar a li-
minar, mas vai recorrer.
A entrada de turistas estava
proibida desde 20 de março. O
município alegou falta de estru-

tura hospitalar e o risco de esca-
lada de casos. Nesse período,
Ilhabela teve menos casos de co-
vid que as outras cidades da re-
gião. No último dia 19, a prefei-
tura flexibilizou a entrada de do-
nos de casas de veraneio e pa-
rentes, condicionada à avalia-
ção do pedido pelo Município.
Grupos como o ‘Somos To-
dos Ilhabela’, que reúne mora-
dores e donos de casas de vera-
neio, recorreram à Justiça por

considerar que seus integran-
tes tinham a liberdade de ir e vir
cerceada. O juiz Vitor Hugo
Aquino de Oliveira invocou o
próprio decreto municipal de
reabertura do comércio.
Segundo a prefeitura, ainda
há risco de saturação dos hospi-
tais. Neste mês, os casos dupli-
caram, saltando de 56, no mes-
mo período de maio, para 147,
além de duas mortes. Em mar-
ço e abril, com forte restrição na

travessia por balsas, houve 10
casos. “Neste fim de semana
ocorreu outro fator preocupan-
te, o relaxamento no isolamen-
to social e crescimento da ocu-
pação das praias. Isso se verifi-
cou depois de atendido o pedi-
do de manifestantes para flexi-
bilizar ainda mais a travessia pa-
ra entrada e saída de residen-
tes”, disse a gestão municipal.
Conforme a prefeitura, fo-
ram registradas 1.686 entradas
de 9 a 14 de junho, e 2.082 de 15 a
21 de junho, quando houve a fle-
xibilização. Os casos cresceram
em proporção ainda maior.

PANDEMIA DO CORONAVÍRUS


● Pesquisa tem por base 5.416 exames sorológicos
nos 96 distritos

DISTRIBUIÇÃO

FONTE: SECRETARIA MUNICIPAL DA SAÚDE DE SÃO PAULO INFOGRÁFICO/ESTADÃO

Número de mortes para
cada 100 mil habitantes*

*PADRONIZADO POR FAIXA ETÁRIA

29.9 - 40.
40.1 - 60.
60.1 - 80.
80.1 - 100.
100.1 - 120.
120.1 - 140.
140.1 - 141.

Marsilac

Jardim
Ângela

Tremembé
Jaraguá

Pinheiros


Brás

Lapa

Santo Sacomã
Amaro

Raposo
Tavares

Tatuapé

Parque
do Carmo

Itaquera

Itaim
Paulista

Iguatemi

Cangaíba

Grajaú

Parelheiros

Perus

Inquérito de testagem feito pela Prefeitura estima que 9,5% da população paulistana teve contato com o vírus, índice superior ao visto


em pesquisas similares na Europa. Levantamento aponta 6 regiões afastadas do centro entre as 8 com maiores taxas relativas de óbitos


lRecurso

Sorocaba envia


pacientes para


UTIs da capital


Brasil negocia acordo para vacina de Oxford. Pág. A11 }


Bruno Ribeiro
Marina Aragão


Os primeiros resultados de in-
quérito sorológico feito pela
Prefeitura de São Paulo indi-
cou que 9,5% da população –
1,16 milhão de pessoas – fo-
ram expostos ao coronaví-
rus. Segundo o Município, a
taxa é maior que de estudos
similares de outros países, co-
mo França e Espanha. Oficial-
mente, a cidade têm 118 mil ca-
sos confirmados. O levanta-
mento também mostrou que
a mortalidade é três vezes
maior na periferia da cidade.
Com o estudo, segundo o se-
cretário municipal de Saúde,
Edson Aparecido, o índice de
mortalidade na capital é de cer-
ca de 0,5 morte a cada mil infec-
tados. “Sem a taxa de prevalên-
cia, a taxa de letalidade na cida-
de de São Paulo era de 26 para
mil infectados. O inquérito so-
rológico nos apresenta o real ce-
nário. A taxa de letalidade é de
0,5%: cinco pessoas a cada 1 mil
infectados”, afirmou ele.
O levantamento é uma pes-
quisa com 5.446 cidadãos, testa-
dos pela Prefeitura após terem
sido escolhidos por sorteio, de
forma a contemplar todas as re-
giões. Dividida por área, a taxa
de infecção varia. Na zona leste,
a doença já chegou a 12,5% dos
moradores. Na zona sul, a 7,5%.
A Prefeitura também apresen-
tou um mapa sobre a mortalida-
de de acordo com a população
de cada um dos 96 distritos. E a
letalidade da doença é o triplo
em bairros da periferia.
Há oito bairros onde a taxa é
acima de 120 mortes a cada 100
mil habitantes: Iguatemi, Guaia-


nases, Lajeado e Jardim Helena
(fronteira leste da cidade), Bra-
silândia e Cachoeirinha, zona
norte, e a Sé, no centro. Fechan-
do a lista, há o Brás, também da
região central, o líder de regis-
tros. Ali, a taxa de mortes a cada
100 mil habitantes supera 140.
Por outro lado, há cinco bair-
ros onde a taxa é de até 40 mor-
tes por 100 mil, todos com Índi-
ce de Desenvolvimento Huma-
no (IDH) muito alto: Perdizes e
Pinheiros, na zona oeste, Moe-
ma e Jardim Paulista, zona sul, e
Bela Vista, na região central.
“Tínhamos uma interpreta-
ção distorcida da realidade de
óbitos do município”, disse o se-
cretário, ao explicar que Sapo-
pemba (zona leste), Brasilân-
dia e Grajaú (sul) eram os bair-
ros com mais atenção da Prefei-
tura, pelo total de mortos, en-
quanto havia outros, proporcio-
nalmente, em situação pior.
Aparecido não fez análises so-
bre a diferença entre bairros ri-
cos e periferia. Disse que o in-
quérito vai “permitir identifi-
car em cada distrito quais fo-
ram as comorbidades que se as-
sociaram à covid, qual realida-
de específica de cada um desses
diretórios, em que a nossa aten-
ção básica de saúde vai ter de se
debruçar e fazer.” Ainda desta-
cou não haver registro de pa-
cientes que tenham morrido
sem auxílio médico.
O estudo integra o plano de
reabertura econômica, que
vem sendo feita pela gestão Bru-
no Covas (PSDB) junto do Esta-
do. No dia 29, mais 5.446 pes-
soas serão testadas para avaliar
a evolução da doença. O exame
foi o imunocronomatográfico
IgM/IgG – WONDFO, que de-

tecta se a pessoa já teve contato
com o vírus pela presença de an-
ticorpos no sangue.
Análise de 857 amostras de

sangue doado na Fundação
Pró-Sangue, do Hospital das
Clínicas de São Paulo, encon-
trou prevalência de anticorpos

para coronavírus em 12% dos
doadores em junho.

Morte e pobreza. O elo entre
condições sociais e mortalida-
de já havia sido apontado por
estudos independentes. O Ob-
servatório da Covid-19 BR, com
mais de 60 cientistas de univer-
sidades, divulgou este mês
análise com base em dados ofi-
ciais mostrando o peso de raça,
renda e densidade domiciliar.
Na população com 60 anos
ou mais, “pretos (risco de óbito
57% maior) e pardos (risco 37%
maior) apresentam maior mor-
talidade do que brancos”, diz o
documento. Ainda para idosos,
a mortalidade “é maior nos bair-
ros com maior número de mora-
dores por domicílio, sendo 62%
maior entre residentes em dis-
tritos com maior densidade do-
miciliar (Belém, Brasilândia,
Cachoeirinha, Cidade Dutra,
Grajaú, Iguatemi, Itaim Paulis-
ta, Itaquera, Jaçanã, Jaraguá,
Jardim Helena, Lajeado, Marsi-
lac, Parelheiros, Perus, São Mi-
guel, São Rafael e Tremembé),
comparado ao grupo de distri-
tos onde a média de pessoas por
domicílio é menor que 2,71”.
O médico Paulo Lotufo, pro-
fessor da USP, destaca que há
dois fatores que contribuem pa-
ra a mortalidade: incidência e
letalidade. “A incidência é mui-
to decorrente de questões am-
bientais: se a pessoa consegue
fazer isolamento.” Na periferia,
há mais moradores nas casas e
necessidade de passar mais tem-
po no transporte público. Já a
letalidade, diz, está ligada à qua-
lidade do atendimento médico
recebido por quem busca ajuda.
/COLABOROU GIOVANA GIRARDI

BRUNO ROCHA/FOTOARENA/FOTOARENA

Mapa. Projeção de contaminados é 10 vezes maior que nº de confirmados; Iguatemi, Guaianases, Brasilândia, Lajeado, Sé e Brás têm mais mortalidade


Justiça libera balsa para acesso de veranistas a Ilhabela


“A restrição (de acesso ao
serviço de balsas) foi a
principal responsável pelo
ainda pequeno número de
casos da doença no
arquipélago”
Maria das Graças Ferreira, a
Gracinha (PSD)
PREFEITA DE ILHABELA, QUE
PRETENDE RECORRER DA DECISÃO

Veto a serviço no litoral


norte vigora há 3 meses;


juiz menciona direito de ir


e vir, mas prefeitura


teme alta de contágio


SOROCABA

Com 100% dos leitos de UTI pa-
ra covid-19 ocupados, a prefeitu-
ra de Sorocaba já transferiu ao
menos cinco pacientes para hos-
pitais da capital. Conforme a se-
cretaria municipal da Saúde, is-
so acontece quando os leitos de
UTI estão lotados e o doente
aguarda vaga pelo sistema
Cross (Central de Regulação e
Oferta de Serviços de Saúde) do
Estado. Os pacientes são enca-
minhados quando surgem va-
gas em outros hospitais, incluin-
do da capital.
Ontem, a rede hospitalar pú-
blica de Sorocaba tinha 92% de
ocupação – cinco leitos vagos.
No fim de semana e anteontem,
quando houve as transferên-
cias, a taxa atingiu 100%. Já na
rede paulistana, que tem conse-
guido reduzir o ritmo de aumen-
to de infecções e óbitos, o índi-
ce era de 77% ontem.
Conforme a prefeitura de So-
rocaba, até o fim da semana en-
tram em operação dez novos lei-
tos na Santa Casa. Há previsão
de outros dez no Conjunto Hos-
pitalar de Sorocaba. A cidade
tem 3.406 casos e 96 mortes.
A falta de leitos e o aumento
no número de casos levaram a
prefeitura a fechar o comércio
não essencial esta semana. A
mesma decisão foi tomada pela
prefeitura de Campinas que, na
segunda-feira, registrou recor-
de de ocupação em leitos de
UTI para coronavírus. O siste-
ma municipal estava com 100%
dos leitos ocupados, enquanto
nas redes estadual e privada, a
ocupação era de 89%.
O interior, segundo o gover-
no paulista, é o novo epicentro
da pandemia no Estado. Outras
cidades limitaram atividades
econômicas na tentativa de
frear o vírus. Bauru publicou de-
creto restringindo o funciona-
mento do comércio a partir des-
ta hoje. Assim como Sorocaba,
a cidade está na fase laranja se-
gundo o plano estadual de flexi-
bilização da quarentena, o que
permite reabrir restaurantes, lo-
jas e shoppings. Agora, todo o
comércio deve fechar em fins
de semana e feriados. Outras 40
cidades da região que estão na
mesma fase acompanharam o
endurecimento de regras.
Em outra região, de Mogi Gua-
çu suspendeu por uma semana
o relaxamento da quarentena.
Decreto de ontem prevê liberar
só serviços essenciais. Rio Cla-
ro também vai fechar o comér-
cio a partir de amanhã. /J.M.T.

Metrópole

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