National Geographic - Portugal - Edição 230 (2020-05)

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78 NATIONAL GEOGRAPHIC


O regresso ao estado selvagem significa que há
mais pumas, huemules (um veado do Sul dos An-
des em risco de extinção) e até o nandu de Darwin,
a ave não-voadora de grande porte do Parque Na-
cional da Patagónia, entre outros animais que es-
tão a ser reintroduzidos noutros locais.
O regresso ao estado selvagem também é polé-
mico, sobretudo no que diz respeito ao retorno de
predadores como os pumas ou o jaguar em Iberá.
Isso só será possível com uma combinação de ou-
sadia e paciência... e muita dessa paciência é de
Kris Tompkins. “O Doug era o lançador de bom-
bas”, afirmou Gil Butler, outro filantropo da con-
servação. “A Kris põe as mãos à obra.”


DO LADO DA ARGENTINA, as iniciativas de recu-
peração da vida selvagem de Tompkins estão a
prosseguir em Esteros del Iberá, no canto nordeste
desse país. É um ecossistema vasto e alagadiço, um
mosaico com padrão de cornucópias de pântanos,
canais de águas escuras e lamaçais, lagoas, plata-
formas de vegetação flutuante, elevações suficien-
temente altas e secas para suportar minúsculas
secções de floresta e algumas zonas de savana
sólida. As aves aquáticas e os caimões abundam e,
com sorte, é possível avistar uma anaconda ama-
rela. A luz do Sol apresenta-se em todo o seu esplen-
dor e o próprio nome da região vem da palavra
guarani e berá, que significa “águas brilhantes”.
Localizada na província de Corrientes, região
predominantemente rural que faz fronteira com o
Paraguai, o Uruguai e o Brasil, Iberá conserva uma
forte presença da cultura e linguagem guarani
autóctone. Durante um século, a história de Iberá
resumiu-se a ranchos de criação de gado e depen-
deu da caça para fins alimentares e uso das peles.
As populações locais viajavam frequentemente de
barco ou a cavalo, atravessando zonas pantanosas,
mas não havia terra firme suficiente para sustentar
muitos seres humanos ou vacas. O futuro alterna-
tivo avançava no sentido do cultivo de arroz à esca-
la comercial e na plantação de pinheiros.
Em 1997, Doug Tompkins visitou Iberá. Ficou
interessado pelo local e certo dia pediu à mulher
que se juntasse a ele para uma visita de observa-
ção. “Saímos do avião e eu disse: ‘Vamos embora
daqui’”, conta Kris. “É quente, está cheio de mos-
quitos e é liso como uma panqueca.” Doug, po-
rém, vira algo que escapara a Kris: a biodiversida-
de e as potencialidades do local. Por isso, comprou
um rancho numa ilha no meio deste pântano sem
sequer discutir o assunto com ela. Esse rancho,
Estancia San Alonso, foi o primeiro bastião dos


Tompkins em Iberá e, devido ao seu isolamento,
tornou-se um sítio lógico para dar início ao acto
mais dramático do processo de regresso ao estado
selvagem: a reintrodução de jaguares.
Os recintos foram inteligentemente projecta-
dos: vedados com barros fortes e postes de aço,
com cinco metros de altura, em forma de T no
topo para impedir os animais de treparem para o
exterior, e fio electrificado no perímetro interior.
Os jaguares são animais atléticos e podem mos-
trar-se irrequietos, sobretudo quando enjaulados.
Em cada recinto, existe também uma plataforma
sobre árvores, arbustos baixos ou outras formas
de vegetação para eles se abrigarem. Havia oito
jaguares no local quando o visitei, entre adultos
em idade reprodutiva emprestados por jardins
zoológicos e um casal de crias com 1 ano nascidas
ali, aguardando pela libertação.
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