National Geographic - Portugal - Edição 230 (2020-05)

(Antfer) #1
PARA ONDE FORAM TODOS OS INSECTOS? 19

sugere que os declínios agora detec-
tados se afigurem mais sinistros.


TODOS OS OUTONOS, milhares de
investigadores juntam-se na reunião
anual da Sociedade Americana de
Entomologia. No Outono de 2019, a
reunião decorreu em Saint Louis e a
sessão com maior influência intitula-
va-se “Declínio dos Insectos no An-
tropocénico”. Um após outro, os sucessivos oradores
apresentaram as dolorosas provas. Martin Sorg dis-
cutiu o trabalho do grupo de Krefeld, Matt Forister
documentou a diminuição de borboletas nas Sierras.
Toke Thomas Høye, um investigador da Universi-
dade de Aarhus, na Dinamarca, relatou o declínio do
número de moscas que visitam as flores no Nordeste
da Gronelândia e a entomóloga May Berenbaum, da
Universidade de Illinois, referiu-se a uma “crise glo-
bal dos polinizadores”.
David Wagner, entomólogo da Universidade de
Connecticut, organizara a sessão. Chegada a sua
vez de falar, chamou a atenção para um “enigma”.
Os oradores tinham-se mostrado praticamente to-
dos de acordo quanto às dificuldades enfrentadas
pelos insectos, mas não havia consenso quanto à
causa. Alguns culpavam as alterações climáticas,
outros as práticas agrícolas ou outras agressões do
habitat dos insectos. “É fenomenal que tenhamos
tantos cientistas a estudar este problema, mas
ainda não existam certezas quanto aos factores de
stress”, comentou.
Algumas semanas após a sessão, encontrei-me
com David no Museu Americano de História Na-
tural, em Nova Iorque. O museu tem uma das co-
lecções de insectos mais abrangente do mundo.
De forma mais ou menos aleatória, ele abriu um
armário de Bombus, os abelhões. Numa gaveta,
havia Bombus dahlbomii, uma das maiores abe-
lhas do planeta, que costumava ser comum em
grande parte do Chile e da Argentina. Nos últimos
anos, as suas populações caíram a pique.
Outra gaveta estava cheia de Bombus affinis, que
se distinguem pela presença de uma marca aver-
melhada no dorso. Endémicos do Centro-Oeste e
Nordeste dos EUA, também costumavam ser co-
muns, mas o seu número é agora tão reduzido que
estão classificados como espécie ameaçada.


“Já não os encontramos”, disse
David Wagner. Ele explicou que
existe outra espécie, o Bombus bohe-
micus, cujo modo de vida é invadir
os ninhos de outros abelhões, in-
cluindo o Bombus affinis, comendo
as larvas deste e substituindo-as pe-
las suas. “Essa abelha também está
a desaparecer”, afirmou.
Perguntei qual a sua opinião sobre
a causa do declínio dos insectos. De certo modo,
disse ele, a resposta era óbvia: “Com sete mil mi-
lhões de pessoas no planeta, era de esperar que
houvesse organismos a entrar em declínio.” Para
se alimentarem, vestirem, alojarem e transporta-
rem, os seres humanos estão a alterar o planeta de
formas profundas – arrasando florestas, lavrando
pradarias, plantando monoculturas, despejando
poluentes na atmosfera. Cada uma destas acti-
vidades é um factor de stress para os insectos e
outros animais. As populações de quase todos os
grupos animais estão a diminuir.
“Sabemos que estamos a viver uma crise de bio-
diversidade”, resumiu David Wagner.
Mesmo assim, o ritmo de desaparecimento
dos insectos documentado por estudos recen-
tes é intrigante. Resultados como os de Krefeld
sugerem que os insectos estão a diminuir sig-
nificativamente mais depressa do que outros
grupos de animais. Porquê? Os pesticidas são
uma das possibilidades. Embora se destinem às
espécies consideradas “pragas”, os químicos não
fazem distinção entre os insectos que danificam
as culturas e aqueles que as polinizam. As pró-
prias áreas protegidas da Alemanha podem ser
afectadas por pesticidas, uma vez que muitas
são adjacentes a regiões agrícolas. No entanto,
em alguns locais onde têm sido relatados declí-
nios acentuados – como as montanhas White em
New Hampshire – o uso de pesticidas é mínimo.
Daí o enigma.
“Neste preciso momento, há que averiguar até
que ponto os insectos estão mais em perigo do
que outras espécies”, disse David Wagner. “É ur-
gente. Pela primeira vez, creio que os seres huma-
nos estão de facto preocupados com os serviços
ecossistémicos e com tudo o que os insectos fa-
zem para manter o planeta.”

Numa folha de La Selva,
vespas parasíticas na
fase de pupa
amontoam-se sobre a
lagarta moribunda que
as nutriu e cuja
população mantêm sob
controlo. “O declínio
das vespas parasíticas é
catastrófico para
qualquer ecossistema
terrestre”, diz Lee Dyer.
O local perdeu muitas
espécies de ambos os
tipos de organismos.
FOTOGRAFADO NO POSTO DE
INVESTIGAÇÃO DE LA SELVA
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