National Geographic - Portugal - Edição 230 (2020-05)

(Antfer) #1

28 NATIONAL GEOGRAPHIC


investigação científica. Equipas de todo o mundo
trabalham ininterruptamente para descobrir uma
vacina que proteja as pessoas de novos contágios e
fármacos para tratar os doentes. Há, pelo menos,
uma centena de vacinas em fase de desenvolvi-
mento, numa corrida global a esse desígnio. Cor-
rida, aliás, pode não ser o termo certo. Regista-se
uma cooperação sem precedentes neste domínio.
Algumas vozes, como a do epidemiologista Seth
Berkley, responsável pela Aliança Mundial para as
Vacinas e a Imunização, defendem uma união de
esforços naquilo que tem vindo a ser designado
como o “Projecto Manhattan em versão farmaco-
lógica”. Tal como o objectivo dos Aliados na Se-
gunda Guerra Mundial passava por desenvolver
uma arma nuclear antes dos nazis, agora a missão
prioritária da humanidade é encontrar, o mais ra-
pidamente possível, uma vacina eficaz e segura.
Enquanto isso, centenas de grupos de inves-
tigação procuram identificar os fármacos e as
terapêuticas que melhor funcionem no combate
à doença infecciosa provocada por este corona-
vírus, a COVID-19. Megaensaios clínicos como o
Solidarity, lançado pela Organização Mundial da
Saúde (OMS) para avaliar os tratamentos experi-
mentais desenvolvidos em colaboração por mais
de quarenta países, ou o Discovery, anunciado por
França, são alguns exemplos da guerra titânica e
milionária que a nossa espécie declarou a este
inimigo invisível e esquivo. Outro exemplo pode
ser encontrado no compromisso celebrado pelas
principais publicações científicas para partilhar,
em tempo real, os resultados que se vão obtendo.
Quando observados ao microscópio, os coro-
navírus descritos em 1968 – dos quais existem
39 estirpes conhecidas – exibem uma coroa solar
devido às proteínas que, sob a forma de agulhas,
rodeiam a sua membrana lipídica. Essas espículas
proteicas, mais especificamente as formadas pela
proteína S, são as “chaves” com que o novo vírus


“abre o fecho” existente na membrana das célu-
las humanas do aparelho respiratório, o receptor
ACE2 (a enzima que converte a angiotensina 2).
A descoberta deste “fecho”, descrito no passado
dia 4 de Março na revista “Science” por cientistas
chineses, é um passo muito importante para tra-
var a batalha contra este agente infeccioso.
O epicentro do foco epidémico do SARS-CoV-2
(coronavírus 2 da síndrome respiratória aguda
grave) ter-se-á registado num mercado de Wuhan,
capital da província chinesa de Hubei, quando o ví-
rus saltou de um mamífero (provavelmente o pan-
golim-malaio) para um ser humano. À data de fe-
cho da presente reportagem, o surto propagara-se a
uma velocidade impressionante: em menos de cin-
co meses, já havia mais de 2,4 milhões de casos em
210 países e 165 mil mortes. Portugal, com mais de
vinte mil contágios confirmados e 735 óbitos, tem
sido amplamente destacado pela gestão criteriosa
das medidas de contenção, mas que mundo tere-
mos quando cessar o maremoto sanitário, social e
económico que o vírus está a provocar no planeta?

O NOME DA DOENÇA foi anunciado pela OMS no
dia 11 de Fevereiro: COVID-19, acrónimo do termo
coronavirus disease, seguido do ano do seu apare-
cimento. “Queríamos um nome sem referências a
uma localização geográfica, a um animal, a um
indivíduo ou grupo de pessoas, que estivesse rela-
cionado com a doença”, explicou Tedros Adha-
nom, director da organização. Foi importante para
evitar estigmatizações porque a questão levantada
pelo aparecimento da nova doença está relaciona-
da com a maneira como a nossa espécie se relacio-
na com o planeta e não com um país concreto e
muito menos com um animal. Os maus exemplos
dos rótulos de “gripe das aves” de 2004-05 e “gripe
mexicana” ou “gripe suína” de 2009-10 serviram de
lembrete para uma constatação básica: um nome
tem elevada importância simbólica.

TEXTO DE EVA VAN DEN BERG


APESAR DA CATÁSTROFE, A PANDEMIA DESENCADEADA


PELO CORONAVÍRUS SARS-COV-2 ESTÁ A SURTIR PELO


MENOS UM EFEITO POSITIVO: O AVANÇO INÉDITO DA

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