OSADULTOSCOMAUTISMO 47
Sanders e profere algumas frases impublicáveis
com a voz de Bill Clinton. De seguida, ambos re-
velam as suas versões de Mr. T.
Tom D’Eri interrompe-os com gentileza: “Cava-
lheiros, isto não é um concurso.”
Quando lhes pergunto de que gostam mais na
lavagem de carros, Anthony responde sem he-
sitar: “A camaradagem. Ou seja, ver as mesmas
caras e ter alguém com quem conversar quando
estamos a trabalhar nos dias em que o trabalho se
torna aborrecido, não é, Jeff ?”
“Sim”, concorda Jeff. “Conversamos sobre o
que nos vem à cabeça. E falamos com o coração.”
Essa desinibição preocupara Tom D’Eri, mas
ele diz: “Temos muito mais problemas de com-
portamento com os empregados típicos.”
Basta conhecermos as pessoas que trabalham
para nós e os pequenos pormenores que podem
criar problemas. “Quando conversamos sobre este
assunto com outros empresários, dizemos-lhes
que os nossos empregados com autismo são indi-
víduos que carecem de maior orientação”, explica
Tom. “As necessidades deles são mais facilmente
identificáveis do que as de um empregado típico.
No entanto, aquilo de que precisam não é muito
diferente daquilo que qualquer pessoa precisa.
Mas é mais fácil de identificar.”
“ELES SÃO AMIGOS”, afirma Steven Nesenman,
com ênfase. Estamos a fingir que andamos apenas
a passear descontraidamente por esta feira de rua
em Lake Worth, na Florida, mas na verdade vamos
caminhando com alguma velocidade. Steven tem
um ar sério e determinado: não quer perder de vista
a sua filha, Leah, nem por um segundo. Não é com
medo de que se perca, mas porque ela está acom-
panhada pelo seu “amigo”, Brandon, e tudo pode
acontecer. Talvez algo possa ter acontecido uma ou
duas vezes, mas não sob o olhar atento do pai.
Leah é uma rapariga amável, de formas bem
torneadas e olhos verdes penetrantes. Pinta ob-
sessivamente símbolos da paz, colecciona figuri-
nhas de lagartos e de rãs e faz peças de joalharia
com vidro. Trabalha na Chocolate Spectrum, uma
loja de doces, outra empresa fundada pela proge-
nitora de uma criança autista. Brandon também
é artista: pinta tiras de banda desenhada colori-
das com minúsculos animais e flores e compõe
diagramas de palavras. Vende o seu trabalho na
Internet e na galeria dos Artistas com Autismo,
em Pompano Beach, criada pela sua mãe. Conhe-
ceram-se os dois há sete anos, numa aula de arte.
Têm agora cerca de 25 anos.
“Nasci com um talento”, afirma Leah, quando
os apanhamos. Não sabe como explicar, ao certo,
a forma como escolhe o vidro, mas pega no seu
colar e diz: “Gosto das cores. Faz-me sentir bem.
É bonito. Gosto da cor verde.” Têm grande admi-
ração pelo trabalho um do outro.
Nesse mesmo dia, algum tempo antes, eu fi-
zera uma visita a Brandon, no pequeno e areja-
do apartamento que partilha com a mãe, Cyn-
thia Drucker. Brandon é um rapaz corpulento e
atraente, com um remoinho no cabelo e um sorri-
so rasgado. Na adolescência, era impulsivo e, em-
bora nunca magoasse ninguém, batia com força
nos objectos quando se zangava. Cynthia man-
dou encadernar todos os relatórios escolares de
Brandon a partir do jardimdeinfância.Porvezes,
folheia-os para se lembrardosgrandesprogres-
sos que o filho fez. (Continua na pg. 52)