Adega - Edição 176 (2020-06)

(Antfer) #1

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O JOVEM LUIZ FILIPE SOUZA BEM HAVIA
assumido a cozinha do Evvai, hoje referência em alta
cozinha na capital paulista, e resolvemos dedicar a
ele um ensaio na Sabor.club, para revelar não só o
novo nome que aportava na nossa gastronomia, mas
os pratos com acabamentos impecáveis que ele faz.
De lá para cá, ele não só ganhou notoriedade,
assim como foi o representante do Brasil na final
mundial do Bocuse D’or, o concurso de gastronomia
mais famoso (e importante) do mundo. Para
participar dele, Luiz Filipe, que já era um craque,
foi treinado pelo grande mestre Laurent Suaudeau e
uma equipe de outros feras, convocados por ele.
Resultado: o cozinheiro acabou adquirindo um
nível técnico raro de ver e passou, definitivamente,
a integrar a seleta lista de chefs que realmente

fazem alta gastronomia no Brasil. Mais do que isso,
aprendeu com o francês que ensinou os brasileiros a
olharem para os produtos da própria terra, a valorizar
ainda mais os ingredientes locais – o que acabou
transformando a sua cozinha.
A proposta do menu do Evvai foi criada por Luiz
Filipe a partir das influências que os imigrantes
italianos plantaram por aqui, desde que chegaram,
no início do século 20. Com um, digamos,
brasilianismo, aplicado nelas, os pratos passaram a
ter um gosto tupiniquim apesar do sotaque italiano.
Algo como colocar coentro na lasagna. Com sucesso.
“Ao estudar a cozinha imigrada, das receitas perdidas
às adaptadas por aqui, vi mais paralelos do que
diferenças. A caixa é muito ampla.”
De dentro dela saem beterraba com queijo do
Marajó, carbonara com presunto de pato e queijo
tulha, mel das nossas abelhinhas nativas, moqueca

alla italiana. Tudo com uma tremenda criatividade
e respeito às origens, daqui e de lá – assim como à
mistura das duas culturas.
Numa chamada telefônica, o chef, para início
de conversa, quer saber se eu estou bem. Pergunta
duas vezes, num interesse genuíno pelo outro. Coisa
de quem carrega na essência a missão de servir com
a preocupação verdadeira de olhar para quem está
do lado lá – e não para o próprio umbigo, pecado
comum no cenário vaidoso da alta cozinha.
Não demora para o assunto chegar no desafio de
fazer a sua culinária sofisticada para viagem, com
a dúvida de saber como a comida vai chegar na de
quem a pediu. E tome investimento em física e
química para ter respostas menos óbvias do que saber
que crocantes e espumas não funcionam.

“Sabia que precisava servir comida mais
confortável. Afinal, não é hora de fazer ninguém
pensar na hora de comer. Mas, definitivamente,
nossa linha não é a da cozinha de tratoria.”
A relação de Luiz Filipe com a culinária da Bota
é por escolha e não por herança – a origem do
chef paulista é francesa. E se deu, principalmente,
quando foi trabalhar na Itália e se apaixonou pelo
modo apaixonado como os locais preparam a sua
comida. “Era fascinante, eu via aquilo e não entendia
o que realmente acontecia.”
Demorou para cair a ficha, mas o entendimento
veio com tudo, avassalador como o movimento
que fez o bem-sucedido profissional do mercado
financeiro usar o dinheiro que havia guardado para
investir na sua formação como cozinheiro.
A paixão pela cozinha brotou quando Luiz Filipe
dedicou-se ao pai, antes dele partir, devido a uma

“Ao estudar a cozinha imigrada, das receitas perdidas às adaptadas por aqui,
vi mais paralelos do que diferenças. A caixa é muito ampla”
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