Adega - Edição 176 (2020-06)

(Antfer) #1
Edição 176 >> ADEGA|Sabor.club 91

“Equilibrado, com intensas notas carameladas
no nariz. No palato, encontramos uma acidez
cítrica e bem frutada com as mesmas
notas de caramelo no final de boca”.
Embora a descrição sensorial pareça fruto
de uma degustação de vinhos, estamos
falando de café. Mas não de qualquer café.
Ela se refere ao microlote da Fazenda Ouro
Verde, em
São Sebastião do Paraíso, no
Sul de Minas.
Como sugere a denominação, os grãos
mais do que especiais saíram
de um pedacinho do cafezal a 1000 metros de
altitude, cuja colheita mal rendeu
cinco sacas.
A Ouro Verde planta e beneficia café desde
1948, numa condição ideal de terroir para
a maturação lenta dos frutos, o que confere
qualidade e os tais sabores notáveis ao café.
Vale dizer, a frutinha é tão ou mais complexa
que o vinho, citado acima, com mais de
900 componentes aromáticos e de sabor.
Mas o café precisa ser realmente bom,
para expressar tudo o que pode.
Por isso os microlotes são tão
celebrados e valorizados. E raros.
O que limita demais a produção
é a maturação perfeita que apenas
poucos grãos atingem. É ela quem
garante que os açúcares naturais
estejam formados por completo, coisa
rara. Por isso, só os tais grãos, depois de
um processo que inclui seleção rigorosa,
secagem em camas suspensas (em estufas)
e torra criteriosa, apresentam uma condição
excepcional, com sabor marcante e intenso. Sendo
menos genérico, os grãos de microlotes são consideravelmente
mais encorpados e doces do que os seus pares.


É curioso que, quando a gente bebe, percebe
o nível altíssimo de qualidade, mas que não
esconde o que ele tem de verdade. É como
se fizéssemos perguntas e ele respondesse
naturalmente.
É fascinante.
Não à toa, o café de microlotes é a
estrela da chamada 3ª Onda do Café, na
qual o produto é apreciado pelas suas ricas
características sensoriais. Ela é a evolução
do movimento que surgiu entre
os anos 1960 e 1990, quando o
café especial entrou em cena e grandes redes
de cafeterias, como a Starbucks, passaram a
oferecer um café com maior qualidade, porém
padronizado por uma
torra mais escura.
De novo comparando com o vinho, o café
torrado demais é como uma safra-mais-ou-
menos que precisa de grande interferência
doenólogo para atingir um padrão razoável.
E tome barrica nela. Em outras palavras,
o café perde a sutileza das suas
características legítimas, especialmente
o aspecto frutado, as notas de
especiarias e a vocação adocicada
(esta com um milhão de nuances).
É por isso que os grãos de
microlotes costumam ter torra
branda, feita por grandes mestres do
assunto (como os enólogos).
Para além de tudo isso, os cafés
especiais,
demicrolotes ou não, se caracterizam
também por terem rastreabilidade garantida e
preçojusto, que valoriza e repassa
o que ele vale para o produtor.
Pronto, o que fazer agora com aquele seu cafezinho
de todo dia?

Café


por inteiro
Mais do que especiais, os grãos de microlotes são únicos
e completos na sua essência. Por isso são tão celebrados
por Robert Halfoun

Como fazer um microlote?
Há vários métodos para fazer café. E a
escolha de cada um deles é algo realmente
muito pessoal. Na opinião deste autor, o
filtrado (melhor com Hario V60 ou Clever) é
onde garantimos o melhor café, da forma mais
simples possível. Basta moer o grão bem
fininho e acertar a proporção (que pode
variar sutilmente de acordo com o gosto do
freguês). E vale o ritual: com o
café no filtro, sinta o seu aroma,
pouco antes de começar a
derramar água (bem
filtradinha) nele.

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