Adega - Edição 177 (2020-07)

(Antfer) #1

Edição 177 >> ADEGA 53


Já o vinho proveniente do Liebfrauenstift-
-Kirchenstück, este sim, ficou restrito ao vinhedo
original, o que foi corroborado pela Lei do Vinho
Alemão de 1970. E continua a ser produzido, tan-
to pela P.J.Valckenberg, quanto por outros proprie-
tários de pequenas parcelas do total de apenas 17
hectares. São vinhos de alta qualidade – um dos
produtores, o Weingut Gutzler, faz um GG (Gros-
ses Gewächs, ou Grand Cru), 100% Riesling.
Gutzler é membro da VDP, prestigiosa associação
de produtores e garantia de alta qualidade. O cen-
tenário vinhedo, portanto, continua gerando óti-
mos vinhos – só que não são Liebfraumilch.


Permanência
Este continuou a ter uma portentosa história co-
mercial até os anos 1980. Nesta época, os vários
Liebfraumilch chegaram a alcançar perto de
60% de todos os vinhos exportados pela Alema-
nha. As determinações legais, frouxas, permitiam
(e permitem, neste caso), o uso de diversas castas.
Em grande maioria, os produtores usam Müller-
-Thurgau, Kerner, Sylvaner e quase nada, ou
nada, de Riesling. O estilo continua a ser de um
vinho com teor alcoólico baixo e açúcar residual
facilmente perceptível. O preço segue módico,
mas o enorme sucesso de vendas há muito foi
reduzido – mas de modo algum eliminado. A
própria Valckenberg persiste elaborando o vinho,
junto com outros produtores de altos volumes.
No Brasil, ainda se encontra o Liebfraumilch
Joseph Friederich, marca da Weinkellerei Einig-
-Zenzen, grande firma de “négociants” alemães.
O Brasil, curiosamente, também produziu e
produz um Liebfraumilch nacional, vendido em
grandes redes de supermercados. Seu fabricante
atual é a Cooperativa Vinícola Linha Jacinto, de
Farroupilha, que o produz para a Campari do
Brasil, a qual o comercializa. Ele é classificado
como vinho branco meio seco fino (ou seja, feito
com uvas viníferas). Riesling? Talvez Itálico, em
parte, mas nada da Riesling verdadeira, a Rena-
na, que no nosso país nunca conseguiu prosperar.


Há muitas restrições dos enófilos aos vinhos
adocicados que, em certo momento, foram mui-
to populares no nosso país. Muitos se lembrarão
dos “vinhos da garrafa azul”, de todo modo ain-
da presentes no mercado. Um fato, no entanto,
é inegável. Para tantos consumidores que, antes
de tais vinhos, eram adeptos dos vinhos de mesa,
produzidos de Isabel e outras uvas americanas ou
híbridas, o Liebfraumilch foi um degrau supe-
rior. Nele pisando, muitos de nós continuaram
escada acima, baseados em um nível de qualida-
de maior. Cumpriu, pois, um papel útil. Quiçá
possa ficar na memória como algo que se recorda
com uma simpatia, digamos, distanciada, mas
sorridente e positiva, como acontece quando
olhamos para um tempo e para uma idade que
não voltarão mais.

O centenário
vinhedo de
Liebfrauenstift-
Kirchenstück
continua
gerando ótimos
vinhos – só
que não são
Liebfraumilch
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