National Geographic - Portugal - Edição 233 (2020-08)

(Antfer) #1

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Os chimpanzés roubam
milho, mangas, papaias
e um dos seus frutos
preferidos, a jaca, na
imagem. Esta fêmea e
as suas crias pertencem
a um grupo de 22
chimpanzés que vivem
num fragmento de
floresta junto de um
corredor ribeirinho
nas proximidades
de Mparangasi.
Ela transporta uma cria
junto da barriga e um
juvenil com cerca de
2 anos sobre as costas.

segundo aniversário. Foi arrastado para longe
e mortalmente espancado. Swaliki preferiu que
fosse o seu irmão mais velho, Sebowa Baguma
Kesi, o chefe da aldeia, a contar-nos a história.
Sebowa mostrou-nos o relatório da polícia e as
fotografias post mortem: o braço direito do rapaz
fora praticamente arrancado; um corte na viri-
lha poderá ter-lhe cortado a artéria femoral; al-
guns dos seus dedos estavam partidos. Segundo
o relatório da autópsia, o pequeno Ali demorou
quase 12 horas a morrer.
Sebowa observou, secamente, que os aldeãos
foram ensinados a pensar nos chimpanzés
como “benéficos”, na medida em que o ecoturis-
mo com base nos chimpanzés traria visitantes
aos milheirais em redor de Muhororo. “Não ve-
mos qualquer benefício”, disse. “Eles andam a
matar as nossas crianças.”

Os chimpanzés são robustos e a maioria das
fêmeas adultas tem crias. Por vezes, contudo, os
chimpanzés de Bulindi apresentam níveis mais
elevados de hormonas relacionadas com o stress
do que a população de chimpanzés da Reserva de
Budongo, localizada a apenas 30 quilómetros de
distância. Significará isso que o seu estilo de vida
predatório, mantendo-se perto dos humanos
e consumindo os seus alimentos, desencadeia
stress? É difícil apurar se eles estão a prosperar
graças aos alimentos humanos ou se sofrem ten-
sões devido à proximidade das pessoas.
Entre os habitantes de Bulindi, as atitudes
variam. Lillian Tinkasiimire, uma amigável ma-
triarca cuja casa de tijolo tem uma mangueira
à frente e uma figueira atrás, duas árvores que
atraem chimpanzés, tem uma posição firme. “Os
chimpanzés são muito espertos”, disse. “Se não
os perseguirmos, eles são nossos amigos. Se os
perseguirmos, veremos fogo.” Lillian preservou
grande parte da sua floresta. Deixa que os chim-
panzés ali vão e que a “visitem”.
Matt McLennan espera conseguir incentivar
essa tolerância. Ele e a sua falecida noiva, Jackie
Rohen, criaram o Projecto Comunitário para
os Chimpanzés de Bulindi. Jackie Rohen mor-
reu devido a uma embolia pulmonar no início
de 2020 no Uganda, enquanto prosseguia o seu
trabalho com Matt. O projecto apoia famílias e
incentiva-as a mitigar os confrontos entre chim-
panzés e seres humanos: paga propinas escola-
res em troca de reflorestação, fornece sementes
para plantações de café sombreado, fogões que
consomem menos lenha, furos que permitem às
mulheres e às crianças ir buscar água evitando os
perigos existentes nas poças onde os chimpanzés
também bebem. A melhor forma de preservar a
paz, descobriram os investigadores, é ajudando
os chimpanzés e as pessoas de Bulindi a mante-
rem a distância.


E

M KYAMAJAKA e noutras aldeias em redor
de Muhororo, vive-se uma situação dife-
rente. Ninguém sabe quantos chimpanzés
vivem no que resta da floresta de Muhororo
nem adivinha onde poderá acontecer o
próximo encontro fatal entre eles e os seres
humanos.
Após meia hora de caminhada a partir de
Kyamajaka, eu e o fotógrafo Ronan Donovan
conversámos com Swaliki Kahwa, cujo filho
Twesigeomu (conhecido como Ali) foi captu-
rado por um chimpanzé em 2016, antes do seu

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