Elle - Portugal - Edição 382 (2020-08)

(Antfer) #1

FOTOS: INSTAGRAM (@BBB; @TERESAGUILHERME; @BIGBROTHERTVI)


ELLE PT 57

[os tópicos] não ficam apenas na televisão, nem ficam apenas
em streaming, mas acabam por ir para as redes sociais. De-
pois, com todo o burburinho que se gera nessas plataformas,
acabam por serem empolados», partilha a professora. O
Twitter é um bom exemplo disso mesmo: nunca existiram
tantos utilizadores na plataforma a falar de um programa
português, onde a tendência #BB2020Tvi está, com muita
frequência, nos tops dos assuntos mais falados da rede social.
O conteúdo partilhado é, na sua maioria, criado com o recurso
à visualização do canal TVI Reality e a todos os programas
extra, associados ao reality show.
Este conteúdo permite o diálogo
entre os utilizadores sobre o que se
passa dentro da casa, incluindo so-
bre temas socialmente importantes
como o body shaming, o veganismo
e a homofobia, referida no início
deste artigo. Até porque as situações
homofóbicas não se ficaram apenas
pela situação de Pedro Alves. Pas-
sadas umas semanas, durante uma
prova semanal, Hélder Teixeira, de
39 anos, teve uma atitude sexista
e preconceituosa para com Edmar,
um concorrente assumidamente
homossexual. Mais uma vez, os es-
petadores insurgiram-se nas redes
sociais e a produção do programa
respondeu com a nomeação direta
de Teixeira, deixando assim o poder
de decisão na mão do público... Que
o manteve no programa por 4%.
Ironia do destino, os resultados das
votações, favoráveis à permanência
de Hélder, foram partilhados no dia
internacional contra a homofobia,
transfobia e bifobia...
Dentro da casa, as reações ao caso
de homofobia de Hélder e Edmar
dividiram-se, tal como cá fora. Houve quem dissesse que era
uma brincadeira, que “ele é assim”, o que pode explicar o re-
sultado da votação: há muitos portugueses, que provavelmente
não são os que se insurgiram nas redes sociais, que não veem
nada de errado nas atitudes de Hélder, apesar da homofobia
ser crime perante a lei. «Não me parece que qualquer socie-
dade seja absolutamente consensual. A questão é que temos
visto, infelizmente, um pouco por todo o mundo e por toda
a Europa – e Portugal não é exceção – o ressurgir de algum
conservadorismo. Portanto, neste momento, obviamente,
acabamos por encontrar sempre pessoas que vão polarizar estas
discussões», constata Maria João Cunha. No caso específico

do nosso país, «a sociedade portuguesa evoluiu muito neste
tema da homofobia, até porque temos visto como a nossa
legislação é protetora e nem sempre acompanha a mentali-
dade das pessoas porque é muito difícil mudar estereótipos,
é muito difícil mudar mentalidades», afirma. A professora
universitária refere-se ao facto de Portugal ser um país que
saiu de um regime ditatorial há menos de 50 anos. «Portanto,
é um país em que todas estas questões têm tido um avanço, só
que não à mesma velocidade para todas as pessoas», observa
Cunha.Parapromoveresta mudança social e desconstruir
ideias feitas, «é importante que se
fale» sobre elas, destaca. O ato de
falar está garantido, no entanto, os
diálogos podem trazer alguns pro-
blemas associados, «se as conversas
não são bem informadas, correm o
risco de ficarem na banalidade e nos
extremismos. Portanto, voltamos à
polarização. Ou seja, embora falar
sobre os assuntos seja fundamental


  • e penso que é a falar que se ajuda
    precisamente a promover um dis-
    curso não homofóbico e um discurso
    de igualdade de género – tem que
    ser um discurso informado», aponta
    Maria João Cunha. Contudo, este
    discurso pode ser muito condiciona-
    do pela forma como o debate é feito:
    «o problema, quando debatido nas
    redes sociais, pode ser exacerbado.
    Depois, vamos buscar aquilo que
    está mais incrustado, que é o quê?
    Estereótipos», conclui.


HÁ, SEM DÚVIDA, AVANÇOS na
sociedade portuguesa. Prova disso
são as próprias conversas que os
espetadores estão dispostos a ter
após serem confrontados com as
situações do reality show. E isso só é possível porque a te-
levisão (tal como os media no geral, aliás) tem «um papel
fundamental enquanto agente de socialização. Estes temas
têm que ser trabalhados na família, na escola, mas têm que ser
trabalhos nestes agentes de socialização, que fazem cada vez
mais parte da nossa vida», destaca a investigadora. Para tal,
é importante ter espaços paralelos que façam a interpretação
destes discursos por «pessoas preparadas para fazerem esta
análise», acrescenta Maria João Cunha. Só assim é possível
«promover discursos corretos, discursos adequados que, por
sua vez, promovam a desconstrução destes estereótipos e a
construção de uma maior aceitação social.» n

De cima para
baixo: Manu
Gavassi,
protagonista de
uma votação de
1,5 mil milhões;
Zé Maria e Teresa
Guilherme no
primeiro BB;
O grupo dos
sensatos do BB20.
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