Clipping Banco Central (2020-08-07)

(Antfer) #1

Banco Central do Brasil


Folha de S. Paulo/Nacional - Opinião
sexta-feira, 7 de agosto de 2020
Cenário Político-Econômico - Colunistas

Na plateia, os convidados se dividiam entre os
patrocinadores, os políticos, os generais do i° e
do 2° Exército e o pessoal da classe artística
que torcia contra a peça. Foi um dos maiores
fracassos do teatro brasileiro.


No começo, Juca de Oliveira, aparecendo no
alto da escada, disse: "Que se abram de par
em par os portais de Ro...", quando foi
completar "Roma", a alça se rompeu e o
escudo caiu, para estrondo debochado da
platéia.


Depois entra em cena Raul Cortez, no papel de
Cássio, vestindo uma saia curta, plissada. Dos
camarotes, o anarquista diretor italiano Alberto
D Aversa gritou: "Maria Esther Bueno",
referindo-se à nossa mais famosa tenista. A
plateia veio abaixo.


Morto, Júlio César entra em cena numa
espécie de carroça romanizada. Deitado de
bruços, o saudoso ator Sadi Cabral entrava nu,
apenas coberto por uma manta. A carroça
posicionou-se de tal modo que o ator,
constrangido, percebeu que estava descoberto,
com a bunda virada para a platéia.


Alberto DAversa bradou: "Popô arte!" Outro
gargalheiro.


No intervalo, as autoridades foram embora e o
espetáculo ficou literalmente entregue à classe
teatral.

Os erros e as descontinuidades se sucediam.
No fundo, ouvia-se a voz do diretor: "Segue!",
gritava Anmnes.

Sadi aparece no alto, numa rampa, agora como
o fantasma de Júlio César: "Cuidado com os
idos de março", diz, e vai recuando. A rampa
se acaba, e Sadi não percebe. A garra-se ao
pano e o último "marçoooo..." é seguido de um
estrondo. No fundo, a voz do diretor: "Segue!"

Ouvem-se sirenes, ambulância. O espetáculo
continua e, quando o pano fecha, a plateia
aplaude de pé, rindo do fracasso desejado. O
elenco não volta para agradecer.

Sadi sofre uma fratura e no dia seguinte teve
que ser substituído. O ator que entra leu o texto
num pergaminho, porque não deu tempo de
decorar. Um pouco antes do espetáculo,
descobre que não poderia ler sem os óculos.
Naquela segunda noite, Júlio César tinha um
par de lentes grossas. O público foi
abandonando a peça, que saiu de cartaz.
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