Chomsky_Noam_-_lucro_ou_as_pessoas

(mariadeathaydes) #1

num avião civil, a Sexta Frota Americana no Mediterrâneo, “foram instados a se afastar
imediatamente, pois do contrário seriam derrubados”, o que “teria sido um ato legal desde o ponto
de vista da Lei Internacional que define o espaço aéreo militar”, Mas um pequeno país atacado por
uma superpotência é diferente.^22
Seria útil, uma vez mais, um olhar sobre a história. A política de desestabilização do governo
de Cuba não remonta ao governo Kennedy, conforme afirmou Eizenstat, mas ao seu antecessor: a
decisão formal de derrubar Fidel Castro em favor de um regime “mais devotado aos verdadeiros
interesses do povo cubano e mais aceitável aos Estados Unidos” foi tomada secretamente em 1960,
com o adendo de que a operação devia ser executada “de modo que não tivesse nenhuma aparência
de intervenção norte-americana”, devido às reações previsíveis na América Latina e à necessidade
de aliviar o ônus dos promotores de doutrina dentro do país. Nessa época, a “conexão soviética” e os
“problemas criados por Cuba no hemisfério” nada significavam, exceto na versão de Schlesinger. O
governo Kennedy também admitiu que seus esforços violavam as leis internacionais e as Cartas das
Nações Unidas e da OEA, mas esses temas foram descartados sem discussão, conforme revelam os
arquivos que agora vieram a público.^23
Uma vez que Washington é o árbitro dos “verdadeiros interesses do pj)vo cubano”, os
planejadores do governo norte-americano acharam desnecessário atentar para os estudos de
opinião pública que davam conta do apoio popular a Fidel Castro e do otimismo do povo em relação
ao futuro. Por razões similares, as informações atuais sobre essas questões também não merecem
atenção. O governo Clinton serve aos verdadeiros interesses do povo cubano, impondo-lhes fome e
miséria, independentemente do que possam indicar os estudos sobre a opinião pública cubana. Por
exemplo, pesquisas de opinião pública divulgadas, em dezembro de 1994, por uma empresa
associada ao grupo Gallup, revelaram que a metade da população considera que o embargo é “a
principal causa dos problemas de Cuba”, enquanto três por cento acha que a situação política é “o
mais sério problema com que Cuba se defronta na atualidade”; que 77 por cento considera os
Estados Unidos o “pior amigo” de Cuba (nenhum outro país atingiu três por cento); que, na
proporção de dois para um, a população acha que a revolução teve mais conquistas do que
fracassos, sendo que o “principal fracasso” foi a revolução “ter dependido de países socialistas que
nos traíram, como a Rússia”; e que a metade da população descreve a si mesma como
“revolucionária” e outros 20 por cento como “comunista” ou “socialista”.^24
Certas ou erradas, as conclusões sobre as atitudes públicas são irrelevantes; outra vez um
padrão conhecido, em casa também. Os aficionados da História talvez se lembrem de que essa
política remonta, na verdade, aos anos 1820, quando a intenção norte-americana de assumir o
controle de Cuba foi inibida pela dissuasão britânica. Cuba era vista pelo Secretário de Estado John
Quincy Adams como “um objeto de transcendental importância para os interesses políticos e
comerciais de nosso país”, mas recomendava paciência: com o tempo, previa, Cuba cairá nas mãos
dos Estados Unidos, “pela força da... gravidade política”, uma “fruta madura” para ser colhida. E
assim foi, quando as relações de poder mudaram o suficiente para permitir que os Estados Unidos
libertassem a ilha (do seu povo) no final do século 19, transformando-a numa colônia agrícola
norte-americana, paraíso dos sindicatos do crime e dos turistas.
A profundidade histórica do compromisso de dominar Cuba talvez explique o elemento de
histeria tão visível na execução do empreendimento, por exemplo, a atmosfera “quase selvagem” da
primeira reunião do gabinete depois da fracassada invasão da Baía dos Porcos, descrita por Chester

Free download pdf