36 I A loucura da razão econômica
mento, sáo os únicos elos da cadeia externos ao movimento que vai do dinheiro às
mercadorias, à produção, às mercadorias e novamente ao dinheiro. Marx considera
que o restante do processo geral de circulação opera de “modo normal”, e acredito
que isso quer dizer que ele opera sem percalços. A pressuposição de que todas as
mercadorias sejam trocadas por seu valor significa que não há problemas de rea
lização do valor como dinheiro no mercado. A pressuposição de que a separação
do mais-valor em quotas distribucionais não importe (a não ser a separação entre
salários e lucros em geral) evita complicações. Talvez a pressuposição mais impor
tante e de maior alcance de Marx seja a que diz respeito ao poder inconteste dos
direitos da propriedade privada tanto na produção quanto na troca. E nesse con
texto que ele pressupõe a concorrência perfeita no mercado1. Ele aceita a teoria da
“mão invisível” de Adam Smith, embora insista que a mão invisível é a do trabalho,
não a do capital. O poder monopólico não é considerado. Por que ele adotou tais
pressuposições é uma questão interessante. Meu palpite é que a principal intenção
de Marx em O capital era desconstruir a visão utópica do capitalismo de livre mer
cado que os economistas políticos da época defendiam. Ele tentou mostrar como
as liberdades do mercado não produzem um resultado que é benéfico para todos,
como Smith e outros pensavam, mas que produziria uma distopia de miséria para
as massas e uma enorme riqueza para a classe proprietária capitalista.
Tendo limpado o caminho com essas pressuposições, Marx pode examinar a
valorização em todos os seus detalhes e complexidades. Ele examina as formas
de exploração de trabalho vivo na produção sob condições de igualdade na troca
do livre mercado. Os capitalistas pagam aos trabalhadores o valor de sua força de
trabalho e os usam para produzir mais valor do que eles recebem pela venda
de sua força de trabalho por determinado período. Repare que a base da produção
e da apropriação de mais-valor está na exploração da força de trabalho vivo no
processo de produção, não no mercado. Em seguida, Marx elabora a distinção
entre mais-valor absoluto e mais-valor relativo: o primeiro depende da extensão
da jornada de trabalho além do necessário para reproduzir o valor equivalente da
força de trabalho; a teoria do mais-valor relativo explica o dinamismo tecnológico
e organizacional inerente a um modo de produção capitalista organizado com base
em uma concorrência intercapitalista. Elevação na produtividade reduz o valor das
mercadorias necessárias para a reprodução do trabalhador. Isso significa que o valor
da força de trabalho diminui (assumindo-se que o padrão de vida é constante),
deixando uma quantia maior de mais-valor para o capitalista.
A concorrência entre capitalistas por parcelas do mercado transforma o círculo
da reprodução simples na forma espiralada da acumulação perpétua como fim em
Karl Marx, O capital, Livro I, cit., cap. 2.