A loucura da razão econônica- David Harvey

(mariadeathaydes) #1
O dinheiro como representação do valor / 63

1857, é uma longa refutação das idéias monetárias de Alfred Darimon, um dis­
cípulo de Proudhon9. A controvérsia de Marx com Proudhon e seus discípulos
era a incapacidade que eles tinham de lidar com as relações sociais que definiam
o valor. Sob o regime capitalista, o que conta é o tempo de trabalho socialmente
necessário, e não o simples tempo de trabalho efetivo. Esse “socialmente neces­
sário” implica a existencia de uma “mão invisível” ou “lei de movimento” à qual
tanto o capitalista quanto o trabalhador são subservientes. Desde os M anuscritos
económico-filosóficos, de 1844, Marx já havia concluído que, sob o regime capi­
talista, o valor era trabalho alienado explorado pelo capital na produção, assegu­
rado pela propriedade privada e pela troca de mercadorias em mercados dotados
de mecanismos próprios de determinação de preços. Essas eram as condições que
produziam as degradações e desigualdades sociais a que os trabalhadores estavam
sujeitos, mesmo estando envolvidos no processo de valorização do capital. O
objetivo da revolução socialista era transformar radicalmente as relações sociais
sob as quais os trabalhadores operavam. Sem essa transformação seria impossível
criar um mundo em que trabalhadores associados tomassem as decisões e em que
os tempos reais de trabalho, e não os tempos socialmente necessários, pudessem
se tornar a medida do valor.
Trabalho alienado dominado por um poder externo de classe era o cerne do
problema. O dinheiro, na visão de Marx, representava valor de trabalho (alienado).
Seguia-se que “tentar eliminar a irracionalidade da formação de preços no mercado
mas manter intactas as relações de produção é uma estratégia inerentemente con­
traproducente, na medida em que ignora a própria irracionalidade da produção de
valor da qual a formação de preços é a expressão”10. Era isso o que estava errado
com a posição de Proudhon.
Buscar um modo melhor de representação do trabalho alienado (como o
bônus-horário) sem fazer uma crítica das relações sociais sobre as quais a lei capi­
talista do valor se assenta era duplicar a alienação. Era o que Marx acreditava que
involuntariamente estavam fazendo Proudhon e seus discípulos, além de muitos
socialistas ricardianos. E por isso que a imagem do fu tu r antérieur do comunismo
no Livro I d’O capital é tão importante. Ela descreve trabalhadores associados (um
conceito que Proudhon abominava) com meios de produção em comum, tomando
decisões conscientes, portanto não alienadas, de forma plenamente transparente,
sem necessidades sociais ditadas pelas relações de dominação capital-trabalho nem
intervenções de nenhum poder externo (como o Estado ou o mercado).


9 Idem, Grundrisse, cit., p. 67-181 ;A miséria da filosofia (trad. José Paulo Netto, São Paulo, Boitem-
po, 2017).


(^10) Peter Hudis, Marx Concept ofthe M temative to Capitalism (Chicago, Haymarket, 2012), p. 107.

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