A loucura da razão econônica- David Harvey

(mariadeathaydes) #1

5- Preços sem valores


A incongruência qualitativa entre valor e preço é preocupante e pode ser mais decisi­
va do que Marx supunha. A contradição entre os dois pode ter se intensificado com
o passar do tempo. Se os investidores procuram ganhos especulativos sobre ativos que
não possuem valor (como objetos de arte, câmbio futuro ou créditos de carbono),
através do manejo dos mecanismos de determinação de preços dos mercados, em
vez de investir na criação de valor e mais-valor, isso indica um caminho pelo qual o
valor pode ser retirado da circulação geral do capital para circular como dinheiro em
mercados fictícios, nos quais não ocorre produção direta de valor (embora haja sua
apropriação). Quando a indicação de preço trai os valores que deveria representar, os
investidores estão fadados a tomar decisões equivocadas. Se a taxa de lucro monetário
for mais rentável no mercado imobiliário ou em outras formas de especulação de
ativos, o capitalista racional aplicará o seu dinheiro nele, e não na esfera da atividade
produtiva. O capitalista racional se comporta de maneira irracional do ponto de vista
do processo de reprodução do capital enquanto totalidade em evolução. O resultado
pode ser uma tendência cada vez mais profunda de estagnação secular da economia.
Isso pode ser contrariado pelo fato de certos valores de uso entrarem na produ­
ção capitalista como “dádivas gratuitas”. Isso ocorre quando o “objeto de trabalho
[é] presenteado gratuitamente pela natureza. É o caso de minérios metálicos, mine­
rais, carvão mineral, pedras etc.”1. Embora o capital repouse materialmente em sua
relação metabólica com a natureza, isso não significa que a natureza em si possua
valor. Ela é um armazém de dádivas gratuitas que o capital pode usar sem preci­
sar pagar nada por elas. No entanto, tais valores de uso podem, eventualmente,


Karl Marx, O capital, Livro I, cit., p. 678.
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