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Folha de S. Paulo/Nacional - Opinião
terça-feira, 11 de agosto de 2020
Cenário Político-Econômico - Colunistas

Uva de caminhão


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Autor: Álvaro Costa e Silva

Andam sumidos o Homem da Rosca e seu
pregão malicioso ("Três reais para comer minha
rosca! Ela é larga e doce!"), aos quais dediquei
uma coluna em março, quando vivíamos o auge
do isolamento social. Espero que ele tenha
mudado o roteiro de ruas e não sucumbido à
falência, como grande parte dos
estabelecimentos comerciais - estima-se que
40% deles deixem de funcionar no Rio até o fim
do ano.

Hoje a concorrência de vendedores ambulantes

é tão intensa que a cidade assumiu um clima de
feira livre. Com eles, os pregões voltaram,
podendo ser ouvidos a qualquer momento. Ao
meio-dia, pontual, passa o Homem da
Quentinha: "Vamos almoçar!", grita ele,
cantando as palavras. O Homem da Vassoura
vem logo a seguir: "Vasouuuuurrrrrasssss!",
para desagravo da cachorrada presa nos
apartamentos, que passa a latir em sintonia.

O Homem do Caranguejo, de rosto curtido no
sal do mar, não desperta maior interesse. Ao
contrário do Homem do Camarão de Cabo Frio.
Vermelhão como o produto que anuncia,
garante: "Camarão fresquinho! Pescado há dez
minutos!" Onipresente, parece estar em toda
parte, de Copacabana a Madureira, da
Leopoldina a Nilópolis. Um assombro de
vitalidade e simpatia.

furo que, numa quarta-feira, parado na esquina,
estava um tripeiro português. Em sua
carrocinha, fígados cor de vinho, miolos
lustrosos, mocotós de marfim. Na pracinha, de
caminhões saíam uvas, lembrando o samba de
Assis Valente na voz de Carmen Miranda, e
abacaxis, perfumando o quarteirão inteiro.

O Homem da Pamonha, um clássico dos anos
80, já deve ter morrido. Assumiu seu lugar, na
perturbação do sossego, o Homem do Ferro
Velho, que roda numa kombi caindo aos
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