Clipping Banco Central (2020-08-11)

(Antfer) #1

Banco Central do Brasil


Valor Econômico/Nacional - Legislação & Tributos
terça-feira, 11 de agosto de 2020
Cenário Político-Econômico - Colunistas

“não sei, só sei que foi assim”, não consegue
convencer o auditório e encerra indiscutível
carência argumentativa.


A começar pela natureza da norma de
desempate, tenha-se claro que a determinação
da regra de desempate se aplica
posteriormente aos debates e aos votos
levados à apreciação do colegiado, encerrando
matéria restrita à proclamação de resultado do
julgamento. O empate em julgamento colegiado
paritário, como se sabe, é um dado objetivo,
posterior à superação da dúvida pelos
julgadores, consubstanciando encontro de
convicções opostas.


O legislador adotou a resolução favorável ao
contribuinte nos processos administrativos de
determinação e exigência do crédito tributário
(art. 19-E, da Lei nº 10.522/2020), mas poderia
ter escolhido, v.g., a técnica do voto médio, ou
o do voto de qualidade nas mãos de um
representante do contribuinte. Todas as
hipóteses de solução de desempate citadas
são inconfundíveis com normas tributárias de
direito material, de modo que não podem ser
qualificadas como normas “expressamente
interpretativas”.


Com efeito, os julgamentos dos processos de
determinação e exigência de crédito tributário
realizados antes de 14 de abril de 2020 são
imunes à aplicação do art. 19-E, da Lei nº
10.522, na medida em que caracterizam
situações jurídicas consolidadas sob a égide do
art. 25, § 9º, do Decreto nº 70.235, de 1972, ou
seja, configuram atos jurídicos perfeitos (art. 6º,
§ 1º, da Lei de Introdução às Normas do Direito
Brasileiro - LINDB).


Daí porque o art. 19-E, da Lei nº 10.522,
revela-se como autêntica regra de natureza
processual, que deve ser aplicado de imediato
aos atos processuais praticados após a sua


vigência, conforme determina o princípio
“tempus regit actum”, previsto no art. 14 do
Código de Processo Civil - CPC (Lei nº 13.105,
de 16 de março de 2015), e aplicável de forma
subsidiária ao processo administrativo fiscal, a
teor do disposto no art. 15 do CPC.

E nem se diga que a aplicação prospectiva da
norma violaria o princípio da isonomia.
Conforme já sedimentado pelo Superior
Tribunal de Justiça (Tema 696), a lei
processual atinge o processo no estágio em
que ele se encontra, onde a incidência da lei
nova não gera prejuízo algum às partes, desde
que respeitada a eficácia do ato processual já
praticado. Decerto, para que a nova técnica de
desempate se aplicasse aos casos pretéritos,
seria necessário a previsão expressa nesse
sentido, o que não ocorreu com a edição do art.
19-E, da Lei nº 10.522/2002.

Por fim, mas não menos importante, assumir o
caráter material do art. 19-E, da Lei nº 10.522,
implicaria o reconhecimento da sua
inconstitucionalidade, por violação a reserva de
lei complementar (art. 146, inciso III, da
Constituição Federal), uma vez que o legislador
ordinário foi muito além das normas gerais
definidas pelo CTN, ao possibilitar o
afastamento não apenas da infração ou
penalidade, como também do próprio tributo
devido, em caso de empate em julgamento no
Carf. No ponto, não custa rememorar que é
vedado o afastamento de tributo por equidade
conforme dispõe o art. 108, § 2º, do CTN.

Diante das colocações acima, subsiste o
questionamento se a crítica descontraída, a
qual se utiliza da obra de Ariano Suassuna, não
teria sentido face a tentativa de emplacar, de
forma evasiva e sem fundamento, um caráter
retroativo ao art. 19-E, da Lei nº 10.522/2002. A
resposta dependerá dos próximos julgados
sobre a matéria. A ver.
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