Aero Magazine - Edição 315 (2020-08)

(Antfer) #1
8 | MAGAZINE^315

CO M O L EI O U M A


FICHA TÉCNICA?


Fique atento, as especificações de uma aeronave têm
particularidades que podem levar a interpretações equivocadas

O

s dados apresentados nas
especificações técnicas
de uma aeronave podem
não corresponder à realidade de
um voo. É que eles variam confor-
me as circunstâncias, o que vale
sobretudo para as informações de
performance. Por isso é impor-
tante relativizar o que está lendo
antes de avaliar se um avião ou
helicóptero serve para sua missão,
seja antes de uma compra ou,
principalmente, de um voo.
Aqui vale uma comparação
com o que acontece com a me-
dicina. Em vez de consultar um
médico, muita gente recorre ao
“Doutor Google” ao apresentar al-
gum sintoma de doença e coloca a
saúde em risco, tirando conclusões
precipitadas ou lançando mão da
automedicação. Na aviação, há
quem busque nas fichas técnicas
genéricas respostas para a capaci-
dade real de uma aeronave, a fim

de avaliar se a máquina se encaixa
ou não em uma missão.
Existem até casos de operado-
res que calculam se é viável realizar
um voo – normalmente, de longa
distância – com base nos dados
crus disponíveis para o público em
geral. Imagine o que significa isso
para aeronaves como um Citation
Jet Longitude, um Dassault Falcon
8X ou um Gulfstream 650ER, por
exemplo. Outros usam as ferra-
mentas do Google Earth para cal-
cular a distância entre dois pontos,
e têm a falsa impressão de que um
voo pode ser realizado.

CONDIÇÕES ATMOSFÉRICAS
Logo de início, é preciso levar em
conta que existem os procedi-
mentos de decolagem, as regras
de voo em aerovias, os circuitos
de aproximação e o pouso. Isso
aumenta a distância percorrida,
pois impõe ao piloto trajetórias
de voo distintas de uma linha
reta do ponto A ao ponto B. Mas
há outro complicador: esse tipo
de cálculo não estaria totalmente
errado se vivêssemos sempre nas
condições atmosféricas conside-
radas “padrão” para a aviação, a
chamada ISA (International Stan-
dard Atmosphere): 1.013,2 hec-
topascais de pressão atmosférica,
15 graus Celsius de temperatura
do ar, ar seco, ao nível do mar e
na latitude 45 graus com a média
dos ventos em 80% do ano.
Na vida real, dificilmente temos
essas condições. É comum encon-
trarmos temperaturas mais quentes
do que a definida como padrão,
pressão atmosférica sempre variável
e operação em altitudes bem acima
do nível do mar, além da grande

variação da velocidade e direção dos
ventos. Há ainda as órbitas de espera
em aeroportos congestionados, os
desvios em rota por mau tempo e
assim por diante.
É de extrema importância que
se calcule a performance da aero-
nave levando sempre em conta as
condições reais, no local e na hora
da operação. Isso evita incidentes
desagradáveis e perigosos, como
ser surpreendido pela falta de
potência ou pela impossibilidade
de decolar (ou de pousar em segu-
rança) uma aeronave que já está
correndo pela pista. Em aviação
não existe “pagar para ver”. Graças
aos cálculos de engenharia, há
gráficos disponíveis em todos os
manuais de voo que permitem
calcular com precisão o desem-
penho da nossa aeronave em
qualquer condição e, assim, avaliar
se podemos ou não realizar o voo
na distância pretendida, com a
quantidade de passageiros, o peso
e o combustível que desejamos.
Não é porque um determi-
nado voo foi realizado em um
dia, que será possível realizá-lo
novamente em outro. Imagine-
-se decolando de São Paulo, com
o peso máximo de decolagem e
temperatura ambiente de 10 graus
Celsius. Agora, imagine a mesma
condição com 35 graus Celsius de
temperatura. Seja um helicóptero
ou um avião, a performance será
muito diferente.
Portanto, lembre-se sempre
de personalizar cada operação de
modo a considerar todas as vari-
áveis envolvidas nos cálculos de
performance para não ter surpre-
sas desagradáveis ou frustrações
evitáveis.

AERO RESPONDE

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