Adega - Edição 178 (2020-08)

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Manna, segundo alguns). Somente durante as
cruzadas é que o nome Commandaria passaria
adiante.
Em suas batalhas na Terra Santa, Ricardo,
Coração de Leão, rei da Inglaterra, capturou
Chipre em 1191. Diz-se que ele só tomou a ilha
para poder resgatar Berengaria, sua futura esposa
(que havia sido despachada por sua mãe Eleanor
de Aquitânia ao seu encontro em Jerusalém e
acabou capturada pelo rei cipriota). A vitória e
o casamento, realizado em Limassol (a segunda
maior cidade do país, depois da capital Nicosia)
foram celebrados com o vinho local.
Após a tomada de Ricardo, a Ordem de Mal-
ta e a Ordem dos Templários compraram a ilha,
estabelecendo sede em Kolossi, perto de Limas-
sol, onde edificaram um castelo (logo em seguida
eles venderam a ilha a Guy de Lusignan, que se
aclamou rei de Chipre). O local onde os tem-
plários fizeram sua base ficou conhecida como
“La Grande Commanderie” e, como o vinho era
produzido na região, acabou sendo chamado de
Commandaria. Diz-se que a bebida, na época,
era tão espessa quanto o mel e poderia ser preser-
vada por muitos anos dentro de potes de barro.

Uma denominação
A história de Chipre teve indas e vindas, assim
como a de seu vinho. Seu auge ocorreu na época
dos Cavaleiros Templários e de São João (Ordem
de Malta), sendo exportado para inúmeros reinos
com os quais essas ordens militares católicas se
relacionavam; e também sendo fornecido aos
peregrinos que rumavam à Terra Santa. Mesmo
após o debacle dessas poderosas congregações, o
Commandaria conseguiu sobreviver aos séculos,
chegando aos dias atuais.
Lendas dizem que os vinhos de Chipre eram
tão apreciados na Idade Média que, no século
XV, vinhas cipriotas foram plantadas na ilha da
Madeira e os vinhos lá produzidos teriam o intui-
to de imitar o estilo do Commandaria. O mesmo
teria ocorrido com o famoso Marsala, da Sicília.
O vinho hoje é protegido por uma denomina-
ção de origem criada em 1990. Ele é produzido
nos arredores das montanhas Troodos, uma for-
mação rochosa que surgiu há 2 milhões de anos
quando as placas tectônicas da Eurásia e da Áfri-
ca se afastaram. A denominação compreende os
limites de 14 aldeias: Agios Georgios, Doros, La-
neia, Agios Mamas, Kapileio, Zoopigi, Kalo Cho-
rio, Agios Pavlos, Agios Konstantinos, Louvaras,
Gerasa, Apsiou, Monagri e Silikou. O solo é vul-
cânico, o clima, obviamente, oceânico, e Com-
mandaria é feito com as uvas indígenas Xynisteri
(branca) e Mavro (tinta), que são desidratadas ao
sol para que a concentração de açúcar alcance
entre 390 e 450 gramas por litro. Muitas vezes
adiciona-se ainda aguardente vínica, o que eleva
o grau alcoólico para acima dos 15%.
Com produção diminuta (devido aos rendi-
mentos muito baixos), Commandaria ainda hoje
segue sendo um mito. No século XIX, a poetisa
inglesa (os ingleses foram os maiores compradores
durante muitos séculos) Elizabeth Barrett Brow-
ning resumiu Commandaria assim: “é tão doce
quanto a lira das musas. Tem a cor de um leão ou
Rhea e brilha muito melhor do que os olhos da
deusa. É tão leve quanto seu passo, e o mel produ-
zido pelas abelhas negras de Hymettus não pode
exceder a doçura dos vinhos de Chipre”.

Commandaria é feito
com as uvas indígenas
Xynisteri (branca) e
Mavro (tinta), que são
desidratadas ao sol

Resquícios dos castelos dos
Templários em Limassol

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