Crusoé - Edição 123 02020-09-05)

(Antfer) #1
04/09/ 20

país. Três semanas antes, o Fisco
havia cobrado explicações de
empresas que contrataram os
serviços do escritório de advocacia
da mulher do ministro, Roberta
Rangel.


A decisão que atendeu os anseios
do filho 01 do presidente Bolsonaro
pegou mal, inclusive entre os colegas
de toga. No fim de novembro, o caso
do compartilhamento de dados do
Coaf foi levado ao plenário, e Toffoli
sofreu uma fragorosa derrota.
Quando oito ministros já haviam se
manifestado contra a liminar de
Toffoli, o próprio presidente da corte
decidiu mudar seu voto. Na ocasião,
alguns ministros que costumam ser
mais comedidos não conseguiram se
conter. “Tem uma pergunta mais
fácil?”, disse Edson Fachin ao ser
indagado por jornalistas sobre o
confuso voto de Toffoli. Luís
Roberto Barroso foi ainda mais
irônico, dizendo que era preciso
“chamar um professor de javanês”
para interpretar a mudança de
entendimento do colega.


“Nesses dois anos como
presidente, o ministro Toffoli tomou
várias medidas graves sem
comunicar o plenário. Esse tipo de
expediente só deveria ser usado para
casos urgentes, com danos
irreparáveis. O caso do Coaf, no qual
ele mudou o voto de forma
envergonhada, foi de uma gravidade
que em qualquer país sério daria o
impeachment dele”, afirma
Maierovitch.


Embora o chefe do Supremo
tenha a prerrogativa de decidir


quando e quais processos serão
levados a julgamento no plenário, é
por meio das decisões monocráticas,
como foi a do Coaf, que ele exibe
seu poder de forma mais direta. Nos
últimos 15 anos, o rol de
procedimentos que podem ser
analisados e decididos
individualmente pelo presidente do
STF só cresceu, incluindo recursos
que suspendem processos e habeas
corpus que libertam presos. Isso
ocorre com maior frequência durante
o período de plantão judiciário, em
janeiro e julho, quando todas os
casos vão para análise da
presidência. Um levantamento feito
pelo Supremo em Números, projeto
da Escola de Direito da FGV do Rio
de Janeiro, mostra que entre os
últimos oito presidentes, Toffoli foi o
segundo que mais proferiu decisões
monocráticas – ele fica atrás apenas
da sua antecessora, Cármen Lúcia.
Foram 102 despachos diários, na
média. Só nos meses de plantão
judiciário o ministro proferiu 1,1 mil
decisões.

Para o jurista Joaquim Falcão,
professor titular de Direito
Constitucional da FGV do Rio, há
uma “concentração de poder”
demasiada na figura do presidente do
Supremo. Além disso, ele enxerga
excessos no que chama de
“plantonismo” para definir a profusão
de decisões monocráticas durante os
plantões judiciários. As
consequências desses problemas,
por óbvio, variam de acordo com o
perfil de quem está com a caneta.
Para Falcão, o STF se divide em
duas alas: a dos ministros
institucionais, mais técnicos e imunes
aos vírus da política, e a dos ministros
de conjuntura, que rompem a
neutralidade e atuam de forma
estratégica conforme as
circunstâncias. “Esse modelo de
conjuntura foi a prioridade do
presidente Toffoli, que colocou em
jogo a impessoalidade e a
neutralidade, extrapolando os limites
dos Três Poderes. A função do
ministro é dizer se aquilo é
constitucional ou não e não fazer
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