Crusoé - Edição 123 02020-09-05)

(Antfer) #1
04/09/ 20 REPORTAGEM

Eles conseguiram


Os inimigos da Lava Jato agora
têm o troféu que buscavam há
tempos: Deltan Dallagnol deixa a
força-tarefa no momento mais
delicado da operação, com ataques
de todos os lados


Fabio Serapião

Que a Lava Jato não seria mais
como antes, quando se consagrou
como a maior operação de combate
à corrupção da história recente do
país, já se sabia desde que o ex-
ministro da Justiça Sergio Moro foi
empurrado para fora do governo –
como atestaram as trocas de
mensagens entre ele e o presidente
Jair Bolsonaro que vieram a público
nesta semana. Com Augusto Aras no


comando da Procuradoria-Geral da
República fazendo de tudo para
boicotar a operação, em sintonia fina
com Jair Bolsonaro, um presidente
cada vez mais obstinado pela
reeleição, abraçado com o que de
há de pior na política e preocupado
em evitar que as investigações
alcancem a primeira família,
dificilmente as investigações
prosperariam da mesma maneira e
sob os mesmos valores e princípios.

Ao longo desta semana, no
entanto, a Lava Jato sofreu mais um
golpe. Na terça-feira, o coordenador
da força-tarefa de Curitiba, Deltan
Dallagnol, anunciou seu desligamento
da operação. “Sonhamos junto o
sonho de um país menos corrupto.
Serei eternamente grato a vocês por
isso”, afirmou em sua despedida.

Dallagnol era a alma da Lava Jato.
Foi ele o responsável por montar o
grupo de procuradores que reuniu a
maior coleção de delações e provas
documentais de corrupção, e gerou
o maior número de condenações da
história do país. Graças a esse
trabalho, centenas de empresários,
políticos, operadores financeiros e
criminosos do colarinho branco
foram para a cadeia.

A equipe montada por Dallagnol
em 2014, quando ele foi escolhido
pelo Ministério Público Federal do
Paraná para ser o coordenador da
Lava Jato, uniu profissionais
tarimbados para lidar com casos
escabrosos de corrupção e jovens
técnicos dedicados, capazes de tocar
adiante apurações envolvendo
empresários de altíssimo calibre,
considerados intocáveis até então, e
políticos poderosos, protegidos pela
blindagem judicial de sempre. Os
desentendimentos no grupo eram
raros. Ao primeiro sinal de
divergência, Dallagnol agia para
garantir a unidade. “Ele era um líder
natural”, diz um de seus colegas.

Apesar de alguns percalços
naturais como em toda cruzada dessa
magnitude, o êxito da força-tarefa,
constituída vinte dias depois de o
doleiro Alberto Youssef ser preso
pela Polícia Federal, foi consistente
e duradouro. Os últimos meses, no
entanto, haviam sido especialmente
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