Revista de Vinhos - Edição 370 (2020-10)

(Antfer) #1
MADEIRA

Desfiar a história da Henriques & Henriques (H&H) implica
recuarmos até 1850, quando João Joaquim Henriques fundou
a empresa. A família começou nessa altura a fornecer uvas a
comerciantes britânicos, os maiores impulsionadores da inter-
nacionalização do Vinho Madeira. Deram-se as crises de oídio,
surgiu a filoxera, registou-se a abertura do canal do Suez... Aos
poucos, o xadrez do comércio começou a alterar-se. Foi, por
isso, uma quase inevitabilidade que de fornecedores de uva os
Henriques passassem, a partir de 1913, a produzir, vinificar e
comercializar com marca própria.
A arte do blend, tão associada aos vinhos fortificados, tem
sido uma pedra de toque no historial da H&H. Durante os anos
seguintes à filoxera (finais do séc. XIX), os vinhos novos da
casa foram sendo enriquecidos com toques de vinhos velhos
Solera. “Esse processo continua a fazer parte de nós”, admite
Humberto Jardim, o administrador e guardião do legado.
Se o sal entra diretamente nas vinhas ou através das janelas
dos armazéns, a pimenta conferida pelos lotes de vinhos velhos
adormecidos em cascos ajuda a instituir uma espécie de lin-
guagem própria à generalidade dos vinhos da casa. O perfil
H&H também se deve bastante à estabilidade da enologia,
sendo importante recordar o trabalho desenvolvido durante 52
anos por Peter Cossart (a Cossart Gordon foi parceira da H&H
durante vários anos) e Luis Pereira (41 vindimas).
No pódio dos maiores produtores de Vinho Madeira, a H&H
(que atualmente integra o grupo francês La Martiniquaise) tem
igualmente apostado na videira. Na Quinta Grande, Câmara
de Lobos, possui a maior mancha de vinha da ilha da Madeira,
pouco mais de 10 hectares de Verdelho em terraços de vinhas
conduzidas em espaldeira, a altitudes entre os 350 e os 700
metros. Na Ribeira do Escrivão, igualmente em Câmara de
Lobos, entre os 600 e os 750 metros, outra mancha em espal-
deira é dominada pelo Verdelho e o Sercial. A empresa pode
ainda puxar dos galões a pretexto do Terrantez, uma vez que
detém mais de metade de toda a área plantada da variedade
da ilha, uns estonteantes 1,4ha que, em média anual, originam
cerca de 11 toneladas de uva (“uma produtividade bastante boa
para a casta”, garante-nos Humberto). Essa pequena área de
vinha está plantada numa zona protegida dos ventos, num vale,
o que facilita uma maturação delicada, como a variedade requer,
sendo habitualmente vindimada no final da terceira semana de
agosto. “Os solos vulcânicos da Madeira conferem-lhe uma dis-
tinção única”, defende Humberto Jardim, que gostava que mais
viticultores da ilha apostassem no Terrantez, preservando-o do
risco de uma eventual extinção. Mas é uma casta que obriga
a cuidados, de rendimentos habitualmente baixos, que rapida-
mente pode sobrematurar...
Um Sercial 1928 é hoje o vinho mais antigo que podemos
encontrar ainda em casco nos armazéns da H&H. A tanoaria
está permanentemente ativa, a exemplo da evaporação que, no
mundo do vinho, é metafórica e carinhosamente considerada
“the angels ́ share”. “Gostava de falar com os anjos para lhes
dizer ́não levem tanto ́”, confidencia Humberto Jardim.

A arte do blend, tão associada aos vinhos


fortificados, tem sido uma pedra de toque


no historial da H&H. A empresa pode ainda


puxar dos galões a pretexto do Terrantez,


uma vez que detém mais de metade de toda


a área plantada da variedade da ilha, uns


estonteantes 1,4 hectares.


HENRIQUES & HENRIQUES
Avenida da Autonomia, 10, Câmara de Lobos
T. 291941551 / [email protected] / http://www.henriquesehenriques.pt

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