Revista de Vinhos - Edição 370 (2020-10)

(Antfer) #1

RV_ Os campos experimentais de castas são
atualmente suficientes para garantir um


futuro promissor?
PJ_ Sim. Recentemente substituímos um


campo de ensaios que tínhamos a sul, na
Calheta, e passamos para um investimento


que é propriedade do instituto, em São
Vicente. Estamos a fazer ensaios de adapta-


bilidade de várias castas, incluindo algumas
castas minoritárias e de grande importância


económica para o setor. Os campos, efeti-
vamente, são suficientes mas sinto que era


necessária uma ajuda da União Europeia para
que as entidades públicas pudessem benefi-


ciar de medidas de apoio I&D, que houve no
passado mas que neste quadro comunitário


não existiu. É muito importante dar continui-
dade a estes ensaios.



RV_ Agora, os DOP Madeirenses.


Genericamente, é um projeto que cresceu
bastante a partir do impulso dado pelo


IVBAM, através da Adega de São Vicente,
que presta apoio técnico nas diferentes


fases de elaboração de um vinho. Graças
a isso, pequenos produtores madeirenses


lançaram DOP no mercado, mas as prin-
cipais casas encararam-no como uma


espécie de concorrência desleal. Ora, entre-
tanto, essas mesmas casas estão também a


apostar nesse segmento. É um processo sem
retorno?


PJ_ O Vinho Madeira e o DOP Madeirense


são produtos totalmente diferentes. A mesma
cultura é a vinha, há castas com dupla
aptidão, mas cada vinho tem o seu papel. O
vinho tranquilo está muito bem desenvolvido
na região, permitiu a alguns viticultores, com
áreas de vinha mais significativas, a escoar
produção. Temos que ter vinho tranquilo na
região, pelo fator turístico e com boa pre-
sença no canal Horeca, temos que ter um
produto diferenciado, que não se confunde
com o fortificado. O tranquilo é quase exclu-
sivamente consumido no mercado regional e
o Vinho Madeira tem um mercado global.

“É ainda necessário que as pessoas
conheçam o Vinho Madeira”

RV_ Pelas características muito próprias
que possui, o Vinho Madeira estará sempre
restrito a um nicho de consumidores?
PJ_ Não diria isso. É ainda necessário que as
pessoas conheçam o Vinho Madeira, que per-
cebam que tem que ser apreciado, tem que se
saber bebê-lo. No entanto, o Vinho Madeira
pode ter vários consumos, pode até ser har-
monizado com várias comidas. Mas, noto que
o consumidor não conhece ainda o Vinho
Madeira. O instituto tem feito várias forma-
ções, criamos a rota dos vinhos e demos for-
mação a todo o canal Horeca. Temos ainda
feito ações junto do consumidor final, que lhe
despertem a vontade de apreciar e procurar o
vinho no mercado.

RV_ Uma das ideias recentes que defendeu
foi a criação de uma rede internacional de
educadores de Vinho Madeira. Como está a
aplicar essa estratégia?
PJ_ Está a ser um sucesso, tem sido muito
positivo. Criamos em 2019 o primeiro
“Madeira Wine Educators Course”. O
número de participantes é muito restrito, de
10 a 12 pessoas, e tivemos mais solicitações
do que as que aceitamos. Este ano, devido à
pandemia, tivemos que o adiar e voltamos a
ter mais procura que o número de lugares
disponíveis. Alguns dos wine educators têm
entretanto promovido cursos, debates e
provas de Vinho Madeira online.

RV_ A situação de incerteza que hoje
vivemos devido à pandemia obriga o Vinho
Madeira a procurar novos mercados?
PJ_ A política do instituto é a de conquistar
sempre novos mercados e fazermos aborda-
gens em diferentes países. É importante con-
quistar cada vez mais mercados para termos
mais hipóteses de comercialização.

RV_ Como sabe, nos anos mais recentes,
os vinhos fortificados de todo o mundo
têm estado numa espécie de lista negra
de alguns consumidores, atendendo ao
facto de serem vinhos com graus alcoó-
licos e açúcares mais elevados. Os dife-
rentes estudos internacionais que têm
sido publicados ao longo da pandemia
indicam que os fortificados têm tido as
maiores quebras de procura e de consumo.
Doravante, como será possível desmisti-
ficar estas ideias que têm sido insistentes
nalguns mercados?
PJ_ Em primeiro lugar, o vinho não é para
se beber, é para se degustar. Em grandes
quantidades não se bebe vinho, bebe-se
água. Temos que começar a desmistificar por
aí, até porque o Vinho Madeira e os vinhos
fortificados em geral podem ser consu-
midos, em pequenas quantidades e em várias
momentos, como em refeições ou mesmo
em cocktails. Os vinhos envelhecidos, sobre-
tudo, permitem uma conservação invulgar. O
Vinho Madeira é, como gosto de lhe chamar,
um super vinho, um vinho indestrutível. As
pessoas, com uma garrafa de Vinho Madeira,
podem abrir e ir apreciando o vinho, é um
vinho de longa conservação sem que haja
alterações de qualidade.

RV_ O que mais gostaria de ver concreti-
zado no pós-pandemia?
PJ_ Aos operadores económicos, que tenham
esperança numa recuperação rápida. O
IVBAM e o Governo Regional tudo farão
para ajudar o setor a ultrapassar estas con-
tingências, para que consigamos recuperar a
nossa vida normal.

A GRANDE ENTREVISTA

O Vinho Madeira e o


DOP Madeirense são


produtos totalmente


diferentes. A mesma


cultura é a vinha,


há castas com dupla


aptidão, mas cada vinho


tem o seu papel.


84 · Revista de Vinhos ⁄ 370 · setembro 2020 @revistadevinhos

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