Clipping Banco Central (2020-09-15)

(Antfer) #1

Etiqueta sexual na infância


Banco Central do Brasil

Folha de S. Paulo/Nacional - Saúde
terça-feira, 15 de setembro de 2020
Cenário Político-Econômico - Colunistas

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Autor: Vera Iaconelli


A difícil tarefa de introduzir o assunto sexo


Imaginemos dois tipos depois. De um lado, os herdeiros
da revolução sexual dos anos 1960, de outro, os que
pularam esse capítulo da história e aterrissaram em
2020 sem escalas.


Dividi-los assim é injusto e caricatural mas espero que
me perdoem o artifício para falar sobre etiqueta sexual
com crianças pequenas. Os pais que foram abduzidos
direto dos anos 1950 seguem a cartilha adotada pelo
governo: "O que eu não falo não existe". Eles tendem
afazer ameaças, dizendo que se mexer no pipi elevai
cair ou será cortado clássico freudiano- , vão nascer
pelos nas mãos, espinhas nos braços. Meninas ouvem
que é feio se tocarem, que as pessoas vão parar de
gostar delas, temas que na adolescência criam o
terreno para o tabu da virgindade e outras sandices.
Isso para ficarmos apenas nas ameaças verbais,
abstraindo outras violências.


Os pais menos aterrorizados com a sexualidade, por


sua vez, vivem o dilema de como falar para os filhos
tirarem a mão das partes pudendas em público sem se
sentirem a tia Lydia de "O Conto da Ai a" ou a ministra
Damares.

Voltemos à etiqueta. No Brasil, usamos garfo e faca, no
Japão, usa-se hashi. Não há mérito nessas escolhas,
apenas hábitos e convenções. Entre os ianomâmis,
estar nu é habitual e transar na maloca próximo aos
filhos não é grande coisa. Entre nós, o hábito é o pudor
na vestimenta e no sexo. Aprendi com uma mulher
boliviana que o parto em sua comunidade tradicional é
doméstico, mas não sem roupa. Por outro lado, mostrar
os seios para amamentar o filho em público é habitual.
Ao chegar no Brasil a confusão estava/eita: aqui,
durante o parto a mulher fica nua, enquanto que mostrar
o seio ao amamentar causa comoção. Acreditar que
nosso jeito de lidar com o assunto seja "o" jeito é de um
bairrismo fenomenal.

Não se assuste com a precocidade dos filhos. É desde
bebês que eles descobrem o prazer de tocar aspartes
sensíveis -Freud levou muitas bordoadas ao revelar
isso. Cabe aos adultos o ingrato papel de dizer o que
pode e o que não pode, e isso leva o singelo nome de
educar. Preparar o filho para o mundo significa informar,
infindáveis vezes, que não tocamos certas partes do
corpo em público. Não significa que haja algo de errado
com o corpo ou com o prazer que obtemos dele, mas
que temos costumes.

Sem grande drama, basta dizer que não se enfia a mão
no nariz nem nas calças em público, pois se trata de um
combinado. Na fase em que ficam muito fissurados com
os prazeres sexuais do corpo, vale insistir nas
alternativas como brincar, ler, conversar.

Para quem busca garantias de que colocar limites na
exposição e manipulação do corpo na criança não será
traumático para a sexualidade dela, sinto ter que dizer
que o buraco é bem mais embaixo.

A criança pode não saber o porquê, mas percebe
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