Entre pobres e paupérrimos
Banco Central do BrasilFolha de S. Paulo/Nacional - Opinião
quarta-feira, 16 de setembro de 2020
Cenário Político-Econômico - ColunistasClique aqui para abrir a imagemAutor: Bruno Boghossian
Brasília Jair Bolsonaro tinha gostado da ideia de turbinar
o Bolsa Família e pegar carona no auxílio emergencial
do coronavírus. A decisão de abater o Renda Brasil
mostra que, embora seduzido pelo plano de cimentar
sua popularidade entre famílias de baixa renda, ele não
está disposto a perder apoio em outros grupos.
O slogan involuntário do presidente resume essa lógica.
Nas últimas semanas, ele disse duas vezes que não
pretendia "tirar dinheiro dos pobres para dar para os
paupérrimos". A frase tem peso político, mas falha na
matemática, já que o governo nunca demonstrou
interesse em cobrar a conta dos mais ricos.
Atrás de recursos para o Renda Brasil, a equipe de
Paulo Guedes quis cortar o abono salarial, endurecer
regras de benefícios para idosos e congelar
aposentadorias. Bolsonaro enxergou o risco de se
tornar vilão para 50 milhões de pessoas que são
atendidas por esses programas.
O presidente se mostra indisposto a comprar abriga
enquanto ainda tenta consolidar sua curva de
popularidade. Embora a avaliação do governo tenha
disparado entre trabalhadores informais e
desempregados, coma ajuda do auxílio de R$600,
houve uma queda de cinco pontos entre os
aposentados desde o fim do ano passado - de 39% para
34%.Bolsonaro sabe que é politicamente lucrativo dar um
benefício a quem não tem nada, como provou a
experiência do auxílio. Tirar de quem tem pouco e
recebe alguma coisa, por outro lado, pode ser
desastroso.Ao desistir do programa, o presidente reconhece que
seu projeto político é incompatível com parte da agenda
de Guedes. Ao dar uma bronca no ministro, o chefe
tentou se distanciar de suas propostas e as descreveu
como idéias de "gente que não tem o mínimo de
coração".Se estiver mesmo incomodado, Bolsonaro continuará
com problemas. Guedes gosta de oferecer soluções
desse tipo e ainda não explicou como vai amortecer o
fim do auxílio emergencial. O presidente quis enterrar a
crise do Renda Brasil, mas os conflitos repousam em
cova rasa.Assuntos e Palavras-Chave: Cenário Político-
Econômico - Colunistas, Banco Central - Perfil 1 - Paulo
Guedes