Época - Edição 1158 (2020-09-21)

(Antfer) #1
57

homens, a“paixão de professor comaluno”,
segunda ela,natural da hierarquizaçãoda
relação erecorrente em váriosambientes.
Adiferençaque Vidornão deixou clara é
que,no ambiente da ginástica,muitasdas
vezes,são menoresde idadeque estãona
mirade possíveis assediadoreseabusadores.
No Brasil, oex-técnico da seleção masculina
FernandodeCarvalhoLopespodesercon-
denadoaaté 150 anosde prisão por molestar
quatro ginastas. Um dos denunciantes éPe-
trix Barbosa, medalhistadeouro na compe-
tiçãopor equipes dos Jogos Pan-Americanos
de Guadalajara,em 2011.Lopesfoi seu pri-
meirotécnico, no Movimento de Expansão
SocialCatólica (Mesc).Eles trabalharamjun-
tos por seisanos. Aos13, oatletanão aguen-
tou eresolveusair.Otreinador negaas acu-
sações. “Jáacordei comele, não sei quantas
vezes,com amão dentro da minha calça. Ele
sempre perguntava comoestava nossode-
senvolvimento.Eutinha10, 11 anos,eele
(alegava que)precisava acompanhar nosso
crescimento,então diziaque agente precisa-
va mostraropênis”,contou oginastaem

2018 aoFantástico,da TV Globo.Aação
contra Lopesestásuspensadesdeoiníciodo
anopor umaliminarconcedida peloTribu-
nal de JustiçadeSão Paulo.
Casoscomoesseschocameaomesmo
tempo levantam oquestionamento sobreco-
mo as entidadesresponsáveis lidamcomou-
tras formasde abusonesseesporte.Após a
denúnciacontra oex-treinadorda seleção
brasileira,um dos maioresatletasda moda-
lidadeno país, DiegoHypólito,relatou abu-
sos ocorridosno Flamengodurante agestão
de GeorgetteVidor.Omedalhistaolímpico,
mundialepan-americanodenunciou,em
2018,umaformade puniçãonos treinos.Os
meninosque chegassematrasados,cometes-
semerrosnas sériesoudesobedecessema
alguémeramobrigadosadeitar-se numdes-
ses caixotesde madeirafechadoscomtam-
pa. Após arevelaçãode Hypólito,Vidor afir-
mouque nunca “tinhavistoalgo assim”.
Oque as atletaschamamde “cultura do
abusona ginástica” éolimiteentre otrei-
namentorigorosoeoassédio, que em um
esporte que buscaaperfeiçãopode virar
umalinhatênue. Para NatáliaGaudio,atleta
da seleçãofemininadeginásticarítmica, o
ambiente assediadorpodeser umabarreira
intransponível.Para ela, osegredoda lon-
gevidadeno esporteéafelicidade.Há21
anosna modalidade,ela acreditaque opa-
pel do treinadornão éapenascorrigir,mas
tambémelogiar eparabenizarpelosavan-
ços. “Se eu tivessepassadopor um proble-
ma desses(abuso),talvez eu não estivesse
aquiaté hojefazendooque amo.Todasas
críticas que recebi foramcom oobjetivo de
alcançarminhaevolução”, disseaginasta
de 27 anos,bronze nos Pan-Americanos de
Lima,no ano passado.
Um dosmaioressímbolosda ginástica
nacional,Daianedos Santos dissenunca ter
sofridoabuso,mas já ouviurelatos de condu-
tas abusivasno esporte,apesar de não querer
falarsobreeles. Primeirabrasileiramedalhis-
ta de ouroem mundiais,Daianefoi omotivo
de tantas criançascomoRaquelse apaixona-
rem pelaginástica.Ela acreditaque,mesmo
no maisalto nível do esporte,épossívelcriar
um ambiente saudável. “A ginástica mudou
muito de anosparacá. Se vocêvai falarcom
um ginasta,não precisaser ríspidaou gros-
seira.Antigamente era esse ométodousado,
sim, mas achoque vemevoluindo”,disse.

ASDORESDOOURO

FRIEDEMANNVOGEL/GETTYIMAGES

Free download pdf