Claude Lévi-Strauss - As estruturas elementares do parentesco (1982, Editora Vozes) - libgen.lc

(Flamarion) #1

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I.


ponderia a ulterior distinção em castas (jati) e uma divisão mais reduzida
em classes (varna). Não é fácil perceber se estas classes fundavam uma
hierarquia de situações sociais, coextentiva ao conjunto do grupo social,
ou se correspondiam a grupos diferentes, porém gozando de situações de·
siguais. Somente no segundo caso é que encontraríamos a possíbilidade -
aliás vaga - de comparação com a organização Mandchu. Em favor da
primeira interpretação, deve-se invocar a estrutura social, originada "de
um esquema idê~tico", dos antigos povos do Iram, divididos em quatro
pishtra, e onde os Athrava correspondiam aos Brâhmane, os Rathaestha
aos Xátria, os Vastria aos Vaisia, e os Ruiti, de aparecimento tardio, aos
Sudra. Têm-se a impressão de que nos encontramos em presença de um
tipo de estrutura mais do que em face da subdivisão de um grupo social
determinado." Contudo, nossa análise das sociedades Katchin e Naga mos-
trou~nos quanto é fácil a transição. em regime harmônico com troca gene-
ralizada, de uma distribuição concreta, explicável em termos de geografia
e de história, para um modelo formal e generalizável, ou o contrário. Lem-
bramo-nos que é hipergamia que permite operar-se esta transformação."
Ora, os documentos que atestam a existência antiga da exogamia de
casta ligam, de maneira muito nítida, exogamia e hipergamia. O texto de
Manu, ao qual devemos nos referir a este respeito, diz expressamente:
"Uma mulher Sudra só pode casar-se com um Sudra; ela e uma mulher
Vaisia, com um Vaisia; estas duas últimas e uma mulher Xátria, com um
Xátria. E todas as três e uma mulher Brãhmane, com um Brâhmane". '"
É preciso ,!proximar estas indicações de dois grupos de fatos, a saber,
de um lado os sistemas matrimoniais dos "velhos Kuki", onde a bela
simetria do, sistema Katchin (já alterado, contudo, pelo privilégio das fa-
mílias nobres de poder pretender duas alianças) desaparece em favor da
acumulação, por certos grupos, de alianças múltiplas; '" de outro lado, a
tendência dos grupos do norte da Asia, Mandchu, Koriake, Gilyake, à mul-
tiplicação dos laços de aliança." Deve ter sido certamente observado que
entre os Gonde e entre os grupos das fronteiras ocidentais da índia o
casamento por compra permite escapar à regra da troca generalizada, como
acontece também entre os Gilyak e , em certa extensão, nas culturas do
Assam e da Birmânia. A acumulação das alianças torna-se assim possível
para os grupos econõmica e socialmente mais poderosos. Granet desenhou,
com uma eloqüência muito convincente, um desenvolvimento do mesmo
tipo na China feudal." Isso permite-nos chamar a atenção sobre outra
analogia, ligada às considerações precedentes, entre Os sistemas matrimo-
niais da índia antiga e do Extremo Oriente.
Lembramo-nos que a tendência à multiplicação das alianças na China
feudal traduz-se principalmente no privilégio do senhor Chou de receber
três lotes de esposas. "É uma regra que um senhor não deve se casar


  1. E. Benveniste, Les Classes sociales dans la tradition avestique. Journal asiatique,
    1932; Traditions indo-iraniennes sur les classes sociales, ibid., 1938. - Ver também
    D. D. P. Sunjana, Next of Kin Marriages in Old Iran, Londres 1888. G. J. Held,
    The Mahabhãrata, An Ethnological Study, Amsterdam 1935, p. 40.

  2. Cf. capo XVI.

  3. The Laws of Manu, em Sacred Books of the East, vol. 25, Orford 1886, IV,
    12-13. - Cf. H. H. Risley, Tribes and Castes of Bengal, 4 vols., Calcutta 1891, voI.
    1, p. XCI. - Hutton, Caste in India, p. 46-47.

  4. Cf. capo XVII.

  5. Cf. capo XXIII.

  6. Granet, Catégories, capo IH.


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