Claude Lévi-Strauss - As estruturas elementares do parentesco (1982, Editora Vozes) - libgen.lc

(Flamarion) #1

I


senão uma unzca vez, não se aliando assim senão com um unlCO sing. É
um lato que as esposas de um mesmo senhor feudal freqüentemente têm
"nomes" diferentes e às vezes muito diferentes".'" E mesmo quando, con-
forme a regra exige, os três lotes de mulheres podem invocar o mesmo
sing, nem por isso deixam de estar obrigadas a pertencer a casas dife-
rentes."' Ora, nesses casamentos senhoriais que permitem, de fato, e tam-
bém, em certa medida, de direito, a acumulação das alianças, a contri-
buição das senhorias secundárias devia ser inteiramente voluntária não
podendo ser solicitada. oc. Encontramos na índia antiga um paralelo signi-
ficativo. Manu só autoriza quatro formas de casamento: arsha é um casa-
mento por troca pelo gado (lembremo-nos aqui das prestações de búfalos
nas trocas matrimoniais do Assam e da Birmânia). As três outras formas
são casamentos por donativo. Mas uma distinção importante aparece entre
os casamentos Brahma e Daiva, de um lado, e o casamento Prajapatya.
Os dois primeiros repousam sobre o dom voluntário, enquanto no terceiro
o pretendente solicita a mão da moça. '" Este último tipo, por essa razão,
é considerado inferior. "De acordo com as idéias hindus, o casamento é
um dom, e perde uma parte de seu valor se o dom não for voluntário
mas deva ser solicitado"." Este comentário, confirmado pelas análises de
Lanman,'M obriga-nos a nos determos por duas razões. Primeiramente, lan·
ça algumas suspeitas sobre o caráter primitivo da interpretação, feita
pelos comentadores chineses, da necessidade do dom voluntário para os
casamentos yin, que parece uma racionalização. Em segundo lugar - e
se admitirmos que o casamento arsha, como é provável, era mais ou
menos do ;tipo Katchin-Lakher, isto é, não um casamento por troca, di-
ferente do <.casamento por dom, mas um casamento por dom acompanhado
de uma tràc.a -, é surpreendente que todas as formas de casamento auto-
rizadas por Manu se incluam na categoria do "casamento por dom". Esta
categoria é, com efeito, desconhecida pelos sociólogos, e Lowie, por exem-
plo, não faz menção dela em sua análise dos "meios de obter um côn-
juge". '" No sentido literal do termo, o casamento por dom seria um
casamento sem reciprocidade, não se percebendo como uma sociedade
humana poderia funcionar nas condições que supõe.
Somente em um sistema de troca generalizada o casamento pode
tomar, para um espírito não advertido, as aparências superficiais do dom.
Em um sistema de troca restrita, o aspecto imediatamente perceptivel é o
da troca de filha contra filha, ou de irmã de irmão contra mulher do filho.
Num sistema de troca generalizada, ao contrário, a transferência nunca
é diretamente reciproca. Parece que o grupo dos "sogros" dá uma mulher,
e dá sem nada receber em troca, ao menos por parte do grupo dos
"genros". A operação oferece portanto todas as aparências do dom, e
do dom não solicitado, porque este último funda-se numa ordem pre-
estabelecida. Seria possível aproximar, a este respeito, da teoria hindu
a prática Katchín. Os mayu nis sondados reagem com mau humor, fingem


  1. Granet, Catégories, p. 131.

  2. H. Y. Fêng, The Chinese Kinship System, op. cit., p. 187-188.

  3. Cf. capo XXI.

  4. Manu, lII, 21-41.

  5. Gooroodas Banerjee, The Hindu Law 01 Marriage and Stridhana, Calcutta,
    2~ ed., 1896, p. 78.

  6. Ch. R. Larunan, Hindu Law and Custom as to Gilts. em Anniversary Papers
    by Colleagues and Pupils 01 G. L. Kittredge, Boston 1913.

  7. R. H. Lowie, Traité de sociologie primitive, op. cit., p. 29·37.


444

Free download pdf