Claude Lévi-Strauss - As estruturas elementares do parentesco (1982, Editora Vozes) - libgen.lc

(Flamarion) #1
Qual é então o fator deste rápido desenvolvimento da exogamia basta
considerar os muI proibidos para ver que estamos diante de um esforço
difícil, e freqUentemente inábil, para traduzir a exogamía das sapinda em
termos de ínstituições anteriores. É o que se depreende claramente de
um comentário de Risley. "A regra que define os graus proibidos é ha-
bitualmente calculada até a quarta geração"." Que esta adaptação nem
sempre tenha sido fácil, é o que podemos prever. "Cada casta modificou
as regras para torná-las aplicáveis a seu caso particular"." Banerjee re-
fere-se à luta persistente contra a tendência das famílias, ou das linhagens,
em estabelecer sua lei particular." Ainda mesmo no século XV, no norte
da índia, assistia-se ao conflito entre o sistema de gotra e o sistema sa-
pinda. Raghunandana defende uma teoria segundo a qual bastaria que a
moça fosse distante três gotTa para que o casamento se tornasse possivel,
embora estivesse ainda no quinto e no sétimo grau sapinda (Figura 79)."

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Referindo:nps aos quadros de Risley e Russel, observaremos, aliás, que
em geral' as secções da mulher do pai do pai do pai e da mulher do
pai do pai da mãe não estão incluídas nas proibições, deixando assim
aberta esta forma de acordo. Um outro indicio do mesmo conflito é a
curiosa racionalização pela qual algumas tribos, ainda ligadas ao casa·
mento matrilateral, justificam-no tratando a linha materna como dema·
siado insignificante para merecer uma especial proibição. Assim, os Sano
tale, inclinados às alianças matrilaterais, têm o provérbiO: "Não se presta
mais atenção às pegadas deixadas por uma vaca do que ao clã da mãe" .•.•

Será posslvel então fazer idéia das relações que unem as três insti-
tuições exogâmicas arcaicas, casta, gotra, grupo sapinda, e de seu respec·
tivo lugar no grande sistema estrutural que tenlamos definir para a so·
ciedade indo-asiática? Se supusermos. conforme tantas analogias sugerem,
que a índia antiga conheceu uma sociedade de clãs, unidos em um ou
-', vários sistemas de troca generalizada, talvez a tarefa não pareça impos-
sível. O estudo da sociedade Katchin mostrou-nos como podem coexistir,
de um lado, no campo e nos meios populares, clãs que perpetuam um
modelo antigo e, de outro lado, numa aristocracia feudal, grupos mais
vastos, e melhor articulados, que permitem o jogo das hierarquias e das
rivalidades. Estes grupos são antigos clãs, ulteriormente diferenciados e
especializados? É possivel, e mesmo provável. Se a Índia tivesse tido um
desenvolvimento análogo, seria possível dizer que em certa época castas



  1. Risley, voI. I, p. 286. 56. Karandikar, p. 221. 57. Banerjee, capo VI.
    58. Karandikar, p. 204-205. 59. Risley. voI. I, p. 49-50.


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