Claude Lévi-Strauss - As estruturas elementares do parentesco (1982, Editora Vozes) - libgen.lc

(Flamarion) #1

dos quais nasceram primos cruzados (e, mais geralmente, cônjuges po-
tenciais em uma organização dualista>. O quarteto do casamento com
a prima matrilateral representa a aplicação sistemática, a todos os graus
de parentesco, da relação formal de alternância dos sexos, de que depende
a existência dos primos cruzados
A estrutura do segundo quarteto, embora tenha, em fim de contas, o
valor global, é menos satisfatória
Ao interpretá-la, como fizemos, por meio
da estrutura procedente, só encontramos nela dois pares assimétricos, ir-
mão e irmã, marido e mulher, e dois pares simétricos, pai e filha, mãe
e filha Por conseguinte esta estrutura, se assim é possivel dizer-se, só
está de acordo com o arquétipo pela metade. E também pela metade
conserva a relação fundamental de simetria dos pares, de que depende
a existência dos primos paralelos.
Sem dúvida, esta análise funda-se sobre caracteres exteriores, sendo
portanto desprovida de valor explicativo. Mas o mesmo não acontece com
a diferença no funcionamento dos dois sistemas, que é uma conseqüência
dessas particularidades, aparentemente insignificantes, das estruturas. Cada
quarteto implica, com efeito, a existência de três casamentos, dois na
geração ascendente e um na geração descendente. Se nossa teoria do ca-
samento dos primos cruzados é exata, este último casamento é função
dos que se realizaram na geração anterior. Ora, precisamente por causa
da diferença de estrutura, para a qual chamamos a atenção no parágrafO
precedente, os três casamentos do quarteto n'! I são, todos os três, orien-
tados no' mesmo sentido, enquanto os do quarteto n'! II apresentam
inversão cie· sentido, quando se passa da geração mais velha à mais nova.
Que signifiéa isso? Significa que o quarteto n'! I é o que poderíamos
chamar estrutura aberta, que se insere, natural e necessariamente, no
meio das estruturas do mesmo tipo (conforme decorre do princípio da
troca generalizada>. As cessões e aquisições de esposas, em virtude das
quais constitui-se o quarteto, supõem toda uma cadeia de cessões e aqui-
sições, em virtude das quais, em última análise, poderá edificar-se uma
estrutura mais vasta do mesmo tipo, mas bastando-se a si mesma. Ao
contrário, o quarteto n'! II é uma estrutura fechada, no interior da qual
inicia-se e termina um ciclo de troca, a saber, uma mulher é cedida à
geração ascendente, uma mulher é adquirida na geração descendente, e
o sistema recai num ponto inerte. Expressemos esta diferença essencial
de outra maneira. Seja Ego o homem da geração descendente. No esquema
n'! I o casamento do Ego é somente o elo de uma cadeia, sendo o elo
precedente o casamento da irmã do Ego e o elo seguinte devendo ser o
casamento do irmão de sua mulher. Todos os casamentos do grupo são
portanto dados em conexão. No esquema n" II o casamento do Ego é
somente a contrapartida da cessão que seu pai fez à geração ascendente,
dando-lhe sua própria irmã. Com o casamento do Ego, que é uma espécie
de restituição, o negócio, por assim dizer, está terminado. O casamento
da irmã do Ego é parte integrante de outro negócio, sem relação com
o anterior. Figura, desta vez, na rubrica: casamento do pai do Ego
O
casamento do irmão do Ego refere-se a um terceiro negóciO, tão com·
pletamente independente do primeiro quanto do segundo, que é a cessão
da irmã pelo pai da mulher. Está claro que estas expressões têm apenas
valor metafórico, mas permitem-nos perceber imediatamente a diferença


487

Free download pdf