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troca restrita, assim como também não é a regra do casamento com a
filha do irmão da mãe. A lei de troca restrita constitui, com efeito, a
integração dessas duas regras, mas confundindo·as em uma só, a regra
do casamento bilateral, por troca de irmãs ou por troca de filhas. Mas
não existe nesse caso ajuste entre o sistema das classes e as regras do
casamento, uma vez que estas sempre acrescentam, conforme vimos, um
princípio de discriminação, que o sistema das classes, por si só, não
permitiria deduzir. Resolvemos esta dificuldade no que se refere ao casa·
mento com a prima matrilateral, formulando o princípio da troca gene·
ralizada, o que permitiu definir um sistema de classes rigorosamente
adequado a esta forma particular de casamento.
Nada de semelhante é possível quanto ao casamento com a filha da
irmã do pai. A noção de descontinuidade exprime o caráter que lhe é
próprio, mas não constitui a lei dele. É aí - mas somente aí - que a
afirmação de Radcliffe·Brown, segundo a qual é apenas a relação de
parentesco que determina o casamento, poderia encontrar campo de apli-
cação. Mesmo assim, a afirmação continuaria sempre inexata. O que de-
termina o casamento, aí como em qualquer outro lugar, não é a relação
de parentesco em si mesma, mas o fato dessa relação de parentesco,
transformando-se em aliança, permitir a construção de uma estrutura de
reciprocidade. Das três formas do casamento entre primos cruzados, uni-
camente o casamento com a filha da irmã do pai oferece o método mais
grosseiramente empírico para chegar a este resultado.
É fáÇÜ compreender a razão disso. Observamos, em outro capítulo,
que a relação - pelo menos virtual - de uma estrutura de recipro-
cidade preCede o nascimento dos primos cruzados. Basta que um homem
que cedeu sua irmã a outro homem formule, mesmo antes do nascimento
do filho, a reivindicação sobre a filha que virá a nascer desse casamento.
Uma mulher foi cedida, outra mulher (a que ocupa o primeiro lugar na
constelação da aliança) é, ou será, restituída. Tal é a expressão, teori·
camente mais simples possível, da reciprocidade, que pode, segundO os
casos, justapor-se à troca direta das irmãs, precedê·la ou substituir·se a
ela. Agora, está claro que este privilégio avuncular não leva em conta
um dado suplementar do problema, o casamento do filho do tio materno,
já nascido, ou a nascer. Este dado pode ser integrado de diversas ma-
neiras, ou pela negação do direito puro e simples, conforme se vê nas
sociedades australianas e sUl·amerícanas, nas quais os anciãos açambar-
cam sistematicamente as mulheres jovens do grupo, ou então pela cessão,
feita pelo pai, de seu direito sobre a sobrinha em proveito do filho, con·
forme acontece em alguns grupos do sul da índia, ou ainda, finalmente,
pela admissão de que o ritmo desigual de crescimento da população (fre·
qüentemente modificado por intervenção voluntária) permite igualmente
ao pai e ao filho fazerem as contas, casando-se com duas irmãs, so-
brinha de um e prima do outro. Mostramos como a regra dos Korava,
de acordo com a qual só se pode esposar a filha da irmã mais velha,
explica-se pela tentativa de igualdade na distribuição, entre duas gerações
sucessivas, de esposas pertencentes à mesma geração. '"
- E não pelo levirato, como acreditou Chattopadhyay com relação a um traço
análogo da índia do Norte· (K. P. Chattopadhyay, Levirate and Kinship in India.
Man, voi. 22, n. 25).
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