Claude Lévi-Strauss - As estruturas elementares do parentesco (1982, Editora Vozes) - libgen.lc

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a Africa nem a América oferecem nada comparável em precIsa0 e nitidez
aos resultados do estudo das sociedades australianas. Sobretudo, não é
indispensável considerar as primeiras, salvo em caráter excepcional, e
para ilustrar este ou aquele detalbe de um costume ou de uma instituição.
A superfície a que a marcha de nossa análise espontaneamente nos limi'
tou apresenta excepcional densidade de sistemas de parentesco que cor.
respondem à definição das estruturas elementares, permitindo examinar
todos os tipos, e fornecendo, para cada um destes, vários exemplos, que
são também os mais ricos, os mais claros, os que mais se aproximam das
exigências de uma demonstração teórica. Achamo·nos, pois, diante de
uma área privilegiada, cujo aspecto geral não podemos nos dispensar de
examinar.
Consideramo·la primeiramente em função da troca generalizada. Nossa
segunda parte levou·nos a definir um eixo da troca generalizada, orien·
tado na direção sudoeste-nordeste, cujas extremidades são ocupadas res·
pectivamente pelas duas formas simples encontradas em nossa pesquisa,
os sistemas Katchin e Gilyak, da Birmânia ocidental à Sibéria oriental.
Na vizinhança das pontas, encontramos sistemas híbridos, notavelmente
análogos até no detalhe de sua estrutura, os diversos sistemas Naga
no sul, os sistemas Toungou e Mandchu no norte. Entre estes últimos,
a região média do eixo é inteiramente ocupada pelo sistema chinês,
a respeito do qual tentamos mostrar que, depois de uma evolução muito
complexa, permite ainda perceber - às vezes de forma espantosamente
viva - uma estrutura arcaica de troca generalizada, a qual explica pelo
menos alguns de seus aspectos atuais. Vários sistemas intermediários
que vêm se "colocar no eixo ou na sua imediata vizinhança, exatamente no
lugar exigido 'pela análise teórica, confirmam a exatidão deste esquema.
Que acontece de um lado e de outro do eixo? A oeste encontramos,
até na Asia central, traços característicos da estrutura dos sistemas seten·
trionais, como por exemplo a periódica extinção da regra da exogamia,
que também pusemos em relação com o ritmo de reprodução dos clãs e
dos subclãs na sociedade Naga. Uma observação de Constantino Porphy·
rogeneta, que devemos à amável atenção de Roman Jakobson, permite·
nos, talvez, deslocar para mais longe a fronteira. Os Petchenegue eram
divididos em oito temas, cada qual comandado por um chefe, que tinha
por sucessor um primo ou um filho de primo, "para evitar que as fun-
ções de chefe se perpetuassem em uma única família de um clã, e para
assegurar a herança e a transmissão das honras aos colaterais" (Capí·
tulo 37). Esta singular regra seria facilmente explicada se o ritmo de
extinção exogâmica, que acompanhamos até os Kazake,' já existisse entre
", os Petchenegue, sem comprometer a autoridade política do clã primitivo.
Enquanto este perderia o caráter exogâmico em proveito dos subclãs
descendentes dele, o comando permaneceria sendo apanágio da unidade
principal, exercido, sucessivamente, por cada um dos subclãs, primos entre
si. A falta de informação sobre a antiga organização da família e das re-
gras do casamento na Asia central e ocidental, só permitem, neste ponto
como em outros, fazer hipóteses. Finalmente, e sempre na região situada
a oeste do eixo, a !ndia ofereceu-nos exemplos de sistemas nos quais a
troca generalizada aborta, se assim é possível dizer, na patrllateralidade.



  1. Cf. capo XXIII.


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