Luiz Henrique Mandeta - Um Paciente Chamado Brasil

(Antfer) #1

cumprimentou as pessoas, apertou as mãos dos manifestantes mais próximos,
justamente num momento de enfrentamento com o Congresso Nacional.
Aquilo foi transmitido para o Brasil inteiro. Muitas pessoas se sentiram
incomodadas, porque já estávamos falando para a população não criar
aglomerações. O governador de Goiás, Ronaldo Caiado, teve uma discussão
áspera com manifestantes na rua e fez um discurso dizendo que já fora
apoiador do Bolsonaro, mas que agora vivíamos um caso de saúde pública.
Mandou as pessoas irem para suas casas, dizendo que não queria aquele tipo
de manifestação em Goiás. Caiado é médico de formação, e sabia dos riscos
que elas estavam correndo.
Foi a partir daquele domingo, dia 15, que duas mensagens começaram a
circular juntas, uma se contrapondo à outra. O Ministério da Saúde indicava
um caminho, e o presidente enviava uma mensagem no sentido oposto, a de
não respeitar as orientações do seu próprio ministério. Antes já havia essa
resistência, mas não era pública. Para se ter uma ideia do clima de tensão
entre o Bolsonaro e o meu ministério, o presidente não deixou que
publicássemos recomendações sobre sepultamentos no caso de transmissão
sustentada do novo coronavírus numa cidade. Segundo ele, o tema era
mórbido demais. Insisti que isso iria causar o colapso funerário. Os estados
precisavam saber com antecedência o que fazer nesses casos. Expliquei que
não poderia mais haver velório, que teriam que ser usados dois sacos pretos
para envolver o corpo, e que a recomendação seria conceder apenas duas
horas para a família dar adeus com caixão lacrado. Disse a ele que essas
diretrizes precisavam ser determinadas com clareza, porque era um momento
muito duro para as famílias. Mais tarde, transformei essas diretrizes em uma
recomendação, que os estados prontamente adotaram em suas respectivas
ordens do sistema funerário.

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